Inaugurado em 1978, o Parque da Cidade Sarah Kubitschek é um dos principais cartões-postais de Brasília e um dos mais movimentados. O espaço recebe cerca de 19 mil pessoas por semana, e até 45 mil aos sábados e domingos, números que dobram quando há festivais, segundo dados da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF). Bruna Kronenberger, 33 anos, arquiteta e urbanista, define o local como "um espaço democrático por excelência", que foi objeto de sua tese de doutorado Se encontraram então no Parque da Cidade, defendida na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da Universidade de Brasília (UnB), em 2023.
Kronenberger constatou, em sua pesquisa, que o parque é o principal espaço aberto de encontros da capital federal, acolhendo e reunindo as populações de Brasília e do seu entorno, visto que distintos públicos o frequentam e participam de várias atividades. "A manutenção desse local representa a preservação de um ambiente de lazer para a comunidade", ressalta.
O psicólogo Tom Madeira, 38, que veio de Fortaleza a passeio com a família, lembrou que em muitas cidades os parques não são apropriados pela população e, aqui, a percepção soou diferente. "Em Brasília, as pessoas parecem realmente aproveitar esse espaço. Porém, me questiono se essa apropriação também ocorre pelos moradores das satélites ou apenas por quem vive nas proximidades", analisou.
Rafaela Rocha, 42, nutricionista e mulher de Tom, notou que, pela vegetação do ambiente, foi possível ter uma noção de como se constituiu o cerrado brasiliense, "um pouco semelhante à caatinga do nordeste", comparou. Sofia, 6, filha do casal, estava empolgada: "É um dos parques mais legais que já conheci". Dona Gilcélia Medeiros, 70, mãe de Tom, encantou-se pelos gansos do lago, "a parte mais bonita do Parque", avaliou.
Integração
Nesse contexto, a urbanista explica que o espaço permite a integração entre as diferenças, fator que tende a tornar as pessoas mais tolerantes. "Com toda a sua diversidade, o Parque mostra como é possível a diferença viver em harmonia — o ciclista, que chega pelo pedalinho com sua bicicleta speed de fibra de carbono, circula pela mesma pista que a criança que permaneceu mais de uma hora no ônibus para girar na roda gigante do Nicolândia", exemplifica.
Há mais de dez anos, Raquel Pedrosa, 50, frequenta o espaço duas vezes por semana, pela manhã, para correr. Natural da Paraíba, ela admira o contato com a natureza e a segurança que o cartão postal oferece. "Amo o Parque, melhora o meu bem-estar. Se eu pudesse defini-lo em uma palavra, seria alegria", diz. O único ponto que tem deixado a desejar, segundo a médica, é a grande quantidade de pessoas em situação de rua no ambiente.
Em concordância, os comerciantes Josenilton da Silva, 45, e Cleonice Inácio, 56, afirmam que, apesar de a segurança estar boa, a grande quantidade de pessoas em situação de rua incomoda, por conta da desorganização em que deixam o ambiente. Donos do Pastel do Parque, no estacionamento 12, a dupla está há dez anos no local. "Gostamos da tranquilidade de trabalhar ao ar livre, além de termos clientes fiéis", comenta Cleonice.
João Pedro Mendes, 22, mora na Asa Sul e passeia pelo parque ao menos uma vez por semana com sua cachorra Kaia. Aos risos, comentou que a amiga de quatro patas tem como passatempo correr atrás dos pombos e ele gosta de caminhar próximo aos pedalinhos, "a parte mais bonita daqui". Além disso, o auxiliar administrativo lembrou que o parque é o maior da América Latina, particularidade que certamente contaria a um amigo turista que estivesse visitando a cidade.
Melhorias
Procurada pelo Correio, a Secretaria de Esporte e Lazer afirmou que, assim como nas regiões administrativas, o espaço também tem a presença de pessoas em situação de vulnerabilidade social. "A Administração do Parque da Cidade está em contato com órgãos responsáveis para traçar um plano de trabalho para solucionar a situação da melhor forma possível", complementou a pasta.
A pesquisadora Bruna Kronenberger assinala que há a necessidade de uma maior ocupação do parque, de forma a haver a disponibilização de meios para a população se locomover mais facilmente pelos seus 420 hectares, além da implementação de mais iluminação nessas regiões afastadas.
"A revitalização de espaços e atrações que fizeram parte da história de Brasília, tais como a Piscina com Ondas e a Praça das Fontes, e a criação de equipamentos nas regiões menos ocupadas poderiam contribuir para atrair mais público para essa parte do Parque da Cidade, aumentando a sua segurança e reforçando seu caráter integrador e democrático", acrescenta a especialista.
Segundo a Secretaria de Esporte e Lazer, entre as melhorias já realizadas no Parque da Cidade estão: a recuperação dos brinquedos e a iluminação do corredor do Parque Ana Lídia; a remoção de brinquedos quebrados; a construção de rampas de acessibilidade nos estacionamentos; a reforma do castelinho; a implementação da Operação Vagalume; a recuperação da Ponte dos Cadeados; e o reforço na segurança com a operação "Sorria você está sendo filmado", em parceria com a PMDF. As revitalizações previstas incluem a operação de limpeza no lago do parque e a construção de um playground inclusivo.
Quem está atento a tudo que acontece no espaço é o grupo Amigos do Parque da Cidade, criado em 1988, que preza pela manutenção e preservação do local. Para Carlos Valls, 65, fundador e coordenador geral da associação, "o parque é um monumento mágico, um patrimônio de todos nós". Entre as reivindicações da entidade, está a defesa pela instalação de luz solar, acessível economicamente, em algumas áreas de cobertura vegetal típica do cerrado e naquelas mais isoladas.
O Parque desempenha também um papel ambiental, que, conforme apontou Kronenberger, vai além da arborização. Inclui a drenagem urbana, o sombreamento, a criação de microclimas urbanos e a composição da paisagem, entre outros. "Somado a isso, o Parque da Cidade e a sua história fazem parte da preservação da história de Brasília — quem não tem uma foto de criança no foguetinho do Parque Ana Lídia? Quem não cantou com a Legião Urbana o tema de amor de Eduardo e Mônica?", finaliza a urbanista.
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