ATOS ANTIDEMOCRÀTICOS

Torres repete introdução de CPMI e nega ter sido informado sobre 8/1

Ex-ministro realizou pequenas modificações do texto utilizado na CPMI e reiterou que a minuta golpista encontrada na residência dele é uma "verdadeira aberração jurídica"

Pablo Giovanni
postado em 10/08/2023 12:37 / atualizado em 10/08/2023 12:38
Anderson Torres presta depoimento em CPI do 8 de janeiro na CLDF -  (crédito: Ed Alves/CB/D.A.Press)
Anderson Torres presta depoimento em CPI do 8 de janeiro na CLDF - (crédito: Ed Alves/CB/D.A.Press)

O ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública, Anderson Torres, realizou pequenas modificações no texto de abertura do depoimento à CPMI e se defendeu sobre a minuta golpista, reiterando que não recebeu o relatório de inteligência da pasta nas vésperas do 8 de janeiro. Torres presta depoimento na manhã desta quinta-feira (10/8) na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Atos Antidemocráticos, da Câmara Legislativa (CLDF).

Assim como na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de janeiro, do Congresso Nacional, Torres abriu a sessão se defendendo. O ex-ministro chamou a minuta golpista, que pretendia mudar o resultado das urnas de 2022, como um documento “apócrifo”. Ele relatou que, como havia uma sobrecarga no trabalho, costumava levar documentos do trabalho para casa. É a segunda vez que o ex-secretário aparece publicamente após ter sido solto, em maio (leia na íntegra o pronunciamento abaixo).

“Dentre os documentos veio o chamado de 'minuta do golpe'. Basta uma breve leitura para que se perceba ser imprestável para qualquer fim, uma verdadeira aberração jurídica. Este papel não foi para o lixo por mero descuido. Não sei quem entregou este documento apócrifo e desconheço as circunstâncias em que foi produzido. Sequer cogitei encaminhar ou mostrar para alguém. Soube pela imprensa que outras pessoas haviam recebido documentos com teor semelhante e que estes circulavam pela internet. Esta é a verdade. Nada mais posso dizer sobre isso”, disse Torres.

Leia a íntegra da fala de abertura de Torres à CPI do 8 de janeiro

“Senhor presidente, parlamentares membros desta CPI, senhoras e senhores.

Mesmo com o direito ao silêncio garantido pelo STF e sendo facultado minha presença nessa Casa, fiz questão de aqui estar, para esclarecer as dúvidas com a verdade, em respeito a este parlamento e ao povo que este representa.

Cumprimento também todos que estão nos assistindo e agradeço as orações e o carinho. Meu nome é Anderson Gustavo Torres, sou delegado da Polícia Federal desde 2003. Fui secretário de Segurança Pública do Distrito Federal na gestão do Governador Ibaneis Rocha e Ministro da Justiça e Segurança Pública do governo do presidente Jair Bolsonaro. Sou nascido e criado em Brasília, terra que amo, formado em Direito pelo CEUB, me especializei em Inteligência Estratégica pela Escola Superior de Guerra. Lecionei na Academia de Polícia Civil de Roraima, na Academia da Polícia Militar do Distrito Federal e na Academia Nacional da Polícia Federal. Sempre atuei de forma técnica e legalista.

Quero dizer aos senhores e senhoras membros desta CPI que estou aqui com espírito cooperativo, porque, tanto quanto os senhores, tenho todo o interesse em esclarecer os lamentáveis fatos do dia 8 de janeiro. Sempre me pautei na verdade e sempre me coloquei à disposição das autoridades naquilo que estivesse ao meu alcance para a elucidação dos fatos.

Quero reforçar que sempre tive atuação estritamente técnica e profissional nos cargos que ocupei. Entre 2019 e 2020 fui secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, nomeado pelo governador Ibaneis Rocha, o qual me proporcionou as melhores condições de trabalho. Desta forma, conseguimos oferecer à sociedade resultados extremamente positivos, sendo o principal deles uma queda continua da criminalidade, que começou a ser sentida pela população especialmente em relação aos crimes contra a vida e violência contra as mulheres, crianças e pessoas vulneráveis.

No Ministério da Justiça também atuei de modo estritamente técnico. Não sou político, nunca tive pretensão de ser candidato.

Sempre agi dentro da lei, respeitando a hierarquia e a disciplina que são os pilares da Polícia Federal. Procurei dar o exemplo como secretário ou ministro, respeitando a autonomia das Polícias sob minha vinculação, nunca interferi em investigação ou assuntos internos dessas corporações. Nunca permiti que a polícia fosse usada para perseguir quem quer que fosse.

Sei que pairam muitas dúvidas e muitas perguntas. Por isso, aproveito o tempo desta breve introdução para adiantar esclarecimentos sobre fatos importantes.

No dia 10 de janeiro, durante uma busca e apreensão na minha casa, a polícia encontrou um texto apócrifo, sem data, uma fantasiosa minuta, que vai para coleção de absurdos que constantemente chegam aos detentores de cargos públicos.

Adotei como rotina, que todos os documentos que chegassem endereçados a mim, que me fossem entregues.

Vários documentos vinham de diversas fontes para que fossem submetidos ao meu crivo. A assessoria os colocava numa pasta. Eu levava esta pasta para casa, contendo os documentos, para analisar o conteúdo. Os que eram importantes eu despachava e os que não eram importantes eu descartava. Dentre os documentos veio o chamado de “minuta do golpe”. Basta uma breve leitura para que se perceba ser imprestável para qualquer fim, uma verdadeira aberração jurídica. Este papel não foi para o lixo, por mero descuido. Não sei quem entregou este documento apócrifo e desconheço as circunstâncias em que foi produzido. Sequer cogitei encaminhar ou mostrar para alguém. Soube pela imprensa que outras pessoas haviam recebido documentos com teor semelhante e que estes circulavam pela internet. Esta é a verdade. Nada mais posso dizer sobre isso.

Questiona que a PF identificou apenas as digitais minhas, de um advogado e do delegado, mas esquecem de citar que haviam vários fragmentos de digitais que infelizmente não foram identificados.

Também fui questionado sobre uma suposta operação da Polícia Rodoviária Federal cujo objetivo seria cercear o direito ou atrapalhar o exercício do voto, especialmente no Nordeste. Gostaria de esclarecer que nunca determinei, ou sugeri, ao diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal, ou ainda a qualquer pessoa, que interferisse no processo eleitoral de modo a beneficiar qualquer um dos candidatos.

Eu não tinha atribuição de vetar ou impor o planejamento operacional de qualquer instituição. Todas as informações que recebi no dia 30 de outubro indicavam que tudo estava transcorrendo normalmente.

No dia 25 de outubro fomos a Salvador, a convite do Diretor Geral da PF, Márcio Nunes. Vou repetir: fui convidado pelo diretor-geral da Polícia Federal, delegado Márcio Nunes, para ir à Salvador inspecionar as obras da Superintendência da Polícia Federal. Aliás, o convite foi confirmado por ele em depoimento à Polícia Federal, divulgado pela imprensa.

Fomos recebidos pelo superintendente. Nós nos reunimos, conversamos sobre vários assuntos, inclusive as eleições. Tratei também dos vídeos divulgados na internet nos quais um grupo criminoso dizia ter controle sobre eleitores.

O superintendente, delegado Leandro Almada, disse ter conhecimento dos vídeos, e esclareceu ainda que a notícia não havia sido confirmada na checagem. No período da tarde visitamos as obras da superintendência, percorremos todos os andares, foram tiradas fotos e há registros da visita.

A Polícia Rodoviária Federal e a Polícia Federal sempre tiveram respeitada a sua autonomia no período em que ocupei o Ministério da Justiça. Como ministro eu nunca interferi no planejamento e no operacional destas duas instituições.

Nossa determinação, em relação a eleição sempre foi a de reprimir a compra de votos e os demais crimes eleitorais.

A Diretoria de Inteligência do Ministério da Justiça, produziu uma planilha, onde constavam os locais onde os candidatos Lula e Bolsonaro obtiveram mais de 75% dos votos no primeiro turno, com o intuito de fazer um cruzamento e tentar identificar possíveis crimes eleitorais nestes redutos. Não compartilhei com ninguém este documento e, até onde sei, também não foi difundido nos canais de inteligência.

Eu nunca questionei o resultado das eleições. Fui o primeiro ministro a receber uma equipe de transição, no caso a do atual Ministro da Justiça Flávio Dino, que seria meu sucessor. Entreguei relatórios, agi de forma transparente e sempre no sentido de facilitar. Durante a transição não foi registrado qualquer contratempo e tudo correu dentro da normalidade em relação ao Ministério da Justiça.

Outro ponto que julgo importante trazer aqui é a minha participação na live ocorrida no dia 29 de julho de 2021, na qual o então presidente discorreu sobre a segurança das urnas eletrônicas. Quero registrar que fui convocado pelo ex-presidente para participar da live, que durou cerca de duas horas. Minha participação se deu nos minutos finais, quando apenas li um documento público produzido pela Polícia Federal no âmbito de uma comissão convocada pelo próprio TSE, via chamamento público anual, para que membros da sociedade civil e instituições se manifestassem sobre o processo eleitoral brasileiro, sem fazer qualquer juízo de valor.

Sobre os fatos ocorridos no dia 12 de dezembro em Brasília, quando houve baderna, depredação e queima de ônibus no centro da cidade, a responsabilidade para reprimir tais atos era exclusiva da Secretaria de Segurança Pública do DF. Isso não é atribuição do Ministério da Justiça. Entretanto, quando fui informado da tentativa de invasão da sede da Polícia Federal, imediatamente entrei em contato com o diretor geral que me informou ter acionado o grupo especial da PF para conter a crise e defender o prédio. Nós agimos como todo rigor em relação a este episódio e em poucos dias os responsáveis foram presos.

Em relação à tentativa de atentado no aeroporto de Brasília com um caminhão tanque com explosivos, no dia 24 de dezembro, coloquei a Polícia Federal à disposição da Secretaria de Segurança do DF para prestar todo apoio necessário.

Sobre os acampamentos em frente aos quartéis, esclareço que enquanto eu estive no Ministério da Justiça, a Polícia Federal teve total liberdade para monitorar estes acampamentos e, inclusive, foi noticiado que agentes federais identificados por manifestantes foram expulsos do local. Nunca houve omissão ou leniência da minha parte, enquanto ministro da Justiça, sobre estes acampamentos. Nunca houve qualquer impedimento para que fossem monitorados e investigados.

Quando reassumi a Secretaria de Segurança do DF minha primeira ação foi tratar do desmonte do acampamento em frente ao Quartel General do Exército. No dia 6 de janeiro foi realizada reunião com o comandante militar do Planalto, general Dutra, e a secretária de Ação Social do DF Ana Paula Marra. Também estava presente a coronel Cintia, que ocupava o cargo de subsecretária de Operações Integradas da Secretaria de Segurança. Nesta reunião, tratamos da retirada total do acampamento, que ocorreria a partir do dia 10 de janeiro.

Agora, quero falar sobre o papel da Secretaria de Segurança Pública na formulação do Protocolo de Ações Integradas (PAI). A Subsecretaria de Operações Integradas se reuniu com os seguintes órgãos: PM-DF, Polícia Civil, Corpo de Bombeiros, Detran, DF Legal, Senado Federal, Câmara dos Deputados, Supremo Tribunal Federal, Ministério das Relações Exteriores, Polícia Rodoviária Federal e DER para traçar as medidas de segurança. Conforme a legislação distrital prevê, a Secretaria de Segurança tem a missão de funcionar como órgão central e integrador da segurança pública no DF, levando em consideração as atribuições e competências de cada força previstas em legislação federal e na própria Constituição. A Secretaria de Segurança não tem atribuição operacional. Nesta reunião todos os presentes assinaram o Protocolo se comprometendo a cumprir suas diretrizes.

Até o dia 6 à noite eu não tive qualquer informação oficial indicando que haveria vultuosas ações radicais no dia 8 de janeiro. Mesmo assim, o PAI seria colocado em ação nos seus mínimos detalhes. Esta era a determinação. Cabe ressaltar: se o Protocolo fosse seguido à risca, seriamos poupados dos lamentáveis atos do dia 8 de janeiro.

O Protocolo de Ações Integradas, o qual os senhores podem ter acesso, previa ainda a vedação de utilização por manifestantes de instrumentos capazes de produzir lesões corporais e danos ao patrimônio, como mastros de bandeiras e material de PVC, material metálico, madeiras ou assemelhados, garrafas, utensílios de vidros, facas, canivetes, objetos pontiagudos, mesmo para uso de alimentação. Também diz que as informações e orientações nele prestadas não impedem ou desobrigam que as instituições, órgãos e agências envolvidos adotem medidas de segurança de suas competências durante o curso do evento.

Importante ainda relembrar que o Protocolo de Ações Integradas previa o fechamento da Esplanada em alguns casos. O que posso afirmar com toda segurança é que houve falha na execução do PAI. Se tivessem cumprido à risca o Plano os atos de vandalismo do dia 8 de janeiro não teriam sido consumados.

Viajei de férias para os Estados Unidos com minha família no dia 6 de janeiro à noite, após aprovar o Protocolo de Ações integradas e enviar para todos os envolvidos para seu cumprimento. Não recebi qualquer informação sobre a possibilidade de atos violentos no dia 8 de janeiro.

Esta viagem foi programada com antecedência e as passagens compradas em 21 de novembro. Comuniquei ao governador sobre minha viagem e informei que o secretário-executivo Fernando de Souza Oliveira ficaria responsável pela Secretaria na minha ausência.

Se eu tivesse recebido qualquer alerta ou informe de inteligência indicando o risco eminente de violência e vandalismo eu não teria viajado.

No dia 8 de janeiro acompanhei a distancia os tumultos em Brasília. Fiquei muito preocupado quando vi os atos de vandalismo sendo praticados e o Protocolo sendo descumprido.

Cheguei a passar mensagens pelo WhatsApp para o secretário em exercício Fernando apelando para que impedisse os manifestantes de se aproximarem do Supremo, uma vez que o Planalto e o Congresso já estavam invadidos.

Retornei ao Brasil o mais breve possível. Desde que fui preso nunca me neguei a cooperar com a Justiça. Entreguei as senhas do meu celular, da nuvem e do e-mail. Tomei a iniciativa de autorizar a quebra do meu sigilo telemático, fiscal, bancário e telefônico. Continuo sob investigação e cumprindo fielmente as medidas cautelares determinadas.

Reforço meu respeito e confiança na Justiça no Ministério Público e na Policia Federal e sigo disposto a cooperar para que os fatos repugnantes do 8 de janeiro sejam esclarecidos.

Finalizo reafirmando meu amor ao Distrito Federal, meu respeito aos Deputados e Deputadas, agradecendo a oportunidade de ser ouvido. Que a verdade prevaleça. Que Deus nos abençoe.

Era o que eu tinha a dizer senhor presidente"

 

  • O ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres presta depoimento na CPI dos Atos Antidemocráticos, da Câmara Legislativa
    O ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres presta depoimento na CPI dos Atos Antidemocráticos, da Câmara Legislativa Foto: Ed Alves/CB/D.A.Press
  • O ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres presta depoimento na CPI dos Atos Antidemocráticos, da Câmara Legislativa
    O ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres presta depoimento na CPI dos Atos Antidemocráticos, da Câmara Legislativa Foto: Ed Alves/CB/D.A.Press
  • O ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres presta depoimento na CPI dos Atos Antidemocráticos, da Câmara Legislativa
    O ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres presta depoimento na CPI dos Atos Antidemocráticos, da Câmara Legislativa Foto: Ed Alves/CB/D.A.Press
  • O ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres presta depoimento na CPI dos Atos Antidemocráticos, da Câmara Legislativa
    O ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres presta depoimento na CPI dos Atos Antidemocráticos, da Câmara Legislativa Foto: Ed Alves/CB/D.A.Press
  • O ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres presta depoimento na CPI dos Atos Antidemocráticos, da Câmara Legislativa
    O ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres presta depoimento na CPI dos Atos Antidemocráticos, da Câmara Legislativa Foto: Ed Alves/CB/D.A.Press
Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Ícone do whatsapp
Ícone do telegram

Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores.

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação