Afogamentos

Motorista do carro que caiu em lagoa será autuado por homicídio

Pela morte de três crianças, o homem também foi enquadrado por embriaguez e por fugir do local da tragédia. Em prisão preventiva, ele seguirá para a Papuda

Investigado pela 30ª Delegacia de Polícia (São Sebastião), o trágico caso de afogamentos, que vitimou três crianças no Rio Samambaia, às margens da DF-295, na tarde de sábado, avança na responsabilização do motorista Raimundo Francisco da Silva, condutor do Gol envolvido na ocorrência. Segundo a Polícia Civil do Distrito Federal, ele realizou o teste de etilômetro, feito pela Polícia Militar (PMDF), o qual apontou o resultado de 0,63 mg/L — quase o dobro do índice considerado crime: 0,34. O motorista foi enquadrado por homicídio com dolo eventual, por ter fugido do local e por embriaguez. 

Na audiência de custódia, ontem, a Justiça considerou que há indícios de dolo eventual, quando o autor do crime mesmo sem definida a intenção assume o risco que ele ocorra. Da forma como está se encaminhando o caso, a tendência é que seja julgado pelo Tribunal do Júri do DF.

Raimundo foi preso no sábado horas após o ocorrido e conduzido para a carceragem do Departamento de Polícia Especializada (DPE), onde permanece à disposição da Justiça. A prisão em flagrante passou para prisão preventiva.O motorista deverá ser encaminhado para a Papuda, ainda nesta semana.

A avó das crianças, Maria Adva, 56 anos, que estava  no carro na hora da tragédia, contou que Raimundo era amigo da família há 30 anos. Segundo ela, tinham saído ontem para fazer um passeio, beberam cerveja e, na hora de ir embora, Raimundo teria errado a marcha do carro. Isso teria levado o veículo a cair na água com todos dentro. A mãe dos menores, todos irmãos, também estava com eles.

Ricardo Dahen/CB -

Após ajudar a retirar da lagoa uma dos corpos, o da criança de 4 anos, o motorista fugiu. Somente uma hora depois do início das buscas pelos mergulhadores do Corpo de Bombeiros, foi encontrada a terceira criança, a menina de apenas 1 ano, sem vida. O outro menor localizado antes tinha 3 anos.

A ocorrência policial foi registrada como embriaguez ao volante, homicídio doloso na direção de veículo e evasão do local. O inquérito está adiantado, sendo que a Polícia Civil tem até 10 dias para enviar a conclusão ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios. O motorista foi autuado no artigo 121 do Código Penal, com a definição de agravamento, diante de os homicídios serem contra menores de 14 anos.

O afastamento da responsabilidade (uma vez que fugiu) e a a direção alterada pela embriaguez devem aumentar a punição ao condutor. Pesa na situação a condição de homicídio com dolo eventual. Por se tratarem de três vítimas, a projeção é de uma pena entre 36 e 90 anos de prisão. No caso de as três mortes estarem vinculadas a apenas um ato (concurso formal), há possibilidade de pena única, entre 14 e 45 anos.

Foi a Polícia Militar de Goiás que prendeu Raimundo.Até o início da noite da ontem, ele estava foragido. Morador de Cristalina (GO), era conhecido dos familiares das vítimas e morava perto, numa fazenda no distrito de Campos Lindos, onde trabalhava.

Raimundo deixou o local do acidente ao pegar uma carona até a sua casa, que é na região. Após trocar de roupa, seguiu para uma fazenda próxima, onde trabalha. Estava escondido em um galpão, quando foi descoberto pelos policiais. Da mesma região, a avó conhecia Raimundo, seu vizinho, no bairro Marajó. Já Silvania Antônia Barbosa, mãe dos meninos, morava em São Sebastião.

Velório

O pai das crianças (de quem Silvania está separada) está preso por roubo, mas sua presença é esperada no velório dos filhos. A previsão é de que o enterro ocorra em Cristalina, nesta segunda-feira. A mãe das crianças esteve no IML, na tarde de ontem, com o intuito dos reconhecimento dos corpos.

A avó dos meninos Maria Adva contou ao Correio que todos permaneceram, por menos de uma hora no local da tragédia, isso depois de tentarem ingressar num clube, que não conseguiram localizar. Ela admitiu que todos os adultos beberam. Pouco depois do acidente, Maria Adva recorreu à carona em um ônibus, a fim de buscar por socorro.

 "Eles eram meninos exemplares: a Sarah (de 1 ano) estava começando a andar; o Miguel, 3, era muito custoso e muito levado e o Henrique (5), estava sempre do meu lado — ele falava tudo de uma maneira errada, trocada", lembrou a avó que esteve na delegacia ontem."Perder três filhos, no caso da minha filha, numa pancada só, é muito duro",desabafou com tristeza.

Local de lazer

O Correio voltou ontem ao local, conhecido como Lagoa do Japonês, uma área rural de difícil acesso. Bastante vazio no momento em que a reportagem chegou, apenas três casais aproveitavam a tarde ensolarada para tomar banho ou pescar.

O garçom Vilson Goncalves de Almeida, 46 anos, era um deles. O morador da região do Café Sem Troco disse que não presenciou o fato, mas criticou a conduta de Raimundo pela tragédia. "Em todo acidente, a pessoa tem que, pelo menos, prestar o socorro. Quando ela foge, corre o risco de responder pela morte", apontou.

Vilson ressaltou que o local costuma receber muitas famílias durante o fim de semana. "Geralmente, as pessoas vêm para se divertir — tomar sua cervejinha e assar sua carne. Com certeza, o cara não estava em plena consciência", observou. "Aqui é lotado no fim de semana, principalmente aos sábados, dia em que aconteceu a tragédia. Hoje (ontem) está mais vazio por causa do que aconteceu", ponderou. "Moro aqui há 15 anos e venho para cá quase todo o fim de semana. É a primeira vez que acontece algo tão grave", contou.

A pista à qual os veículos têm acesso ao Rio Samambaia é bastante estreita. É preciso bastante habilidade para manobrar, na hora de ir embora. Mas, segundo o garçom, quem visita o local não tem prudência. "Quem vem para cá, bebe e dirige sem medo. Deveria ter mais segurança. A polícia mesmo não vem aqui. Inclusive, as pessoas costumam beber, pois sabem que não vai ter blitz", reclamou. "É uma área perigosa. Por ser estreita (a pista), a pessoa tem que estar consciente para manobrar o carro. Deve ter sido por isso (a embriaguez) que aconteceu essa tragédia", lamentou Vilson.

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