COTIDIANO

Crônica da Cidade: A aquarela dos dias úteis

"Amanhã, agosto começa. Plena terça-feira. Dia estranho para qualquer início. O terceiro dia da semana"

Deveria ser proibido que a semana começasse em um dia 31. Não acham que hoje seria um domingo muito melhor do que jamais poderá ser uma segunda-feira? O ar de feriado, a tranquilidade do trânsito, a paz que cruza as esquinas… Na chuva, o filme debaixo da coberta; nos dias ensolarados, o passeio no Eixão; nas férias, dia de ir à praia ou visitar um museu; nos plantões, o espaço para compartilhar histórias divertidas nos intervalos com os colegas de trabalho.

O calendário, porém, não se curva aos nossos desejos mortais e, hoje, é uma segunda-feira, 31 de julho. Amanhã, agosto começa. Plena terça-feira. Dia estranho para qualquer início. O terceiro dia da semana. Os domingos ainda disfarçam, logo levantando sua credencial de dia considerado fora da agenda dos "úteis". O sábado fica naquele meio termo, mas também seria razoável terminar ou começar um mês por ali.

E de toda essa divagação surge outro questionamento importante. Quem foi que disse que não trabalhar ou ficar sem fazer nada é inútil? Muito pelo contrário. O ócio, além de ser importante para o merecido descanso ao fim de uma semana de estudos ou de trabalho, é essencial para desenvolver a criatividade e, portanto, momento crucial na formação das crianças. O domingo, por analogia, deveria ser considerado um dia utilíssimo.

Deixando de lado o sarcasmo e as piadas sem graça, é importante frisar a seriedade da questão. Num mundo que exige respostas rápidas e hiperconectado, nada mais relevante para a criação dos pequenos do que deixá-los livres para encontrar as próprias brincadeiras e despertar a criatividade.

Uma boneca pode virar uma filha, uma irmã, uma aluna, uma paciente ou uma cliente. O quarto pode ser um escritório, um parque de diversões, o cenário de uma peça de teatro ou um autódromo. A bicicleta vira carro; o sofá, a oficina mecânica; e a mesa de jantar, uma caverna para se esconder dos perigos da floresta. O chão é lava — brincadeira mais popular entre as crianças de todas as idades e em diferentes países, prova disso é que virou até mesmo tema de reality show —, a banheira é piscina, a caixa de papelão é barco…

Quem diria que Aquarela — a bela canção eternizada na voz de Toquinho, que é também um dos compositores — traduziria tão bem esse fazer criativo que resume a essência do que é ser criança e, em última e poética análise, o que é ser humano. "Vamos todos / Numa linda passarela / De uma aquarela que, um dia, enfim / Descolorirá"

 

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