Para celebrar todas as formas de amor e fechar o mês do Orgulho LGBTQIAPN , comemorado em junho, Brasília recebeu, ontem, a 24° Parada do Orgulho no gramado em frente ao Congresso Nacional. Reunindo milhares de pessoas, o clima era de festa e alegria, mas também de luta pelos direitos e por mais respeito. Com trios elétricos, muita música boa, cores e glitter, o público teve a diversão garantida e pôde aproveitar o momento de união.
Segurando uma bandeira com as cores que representam a bissexualidade, o securitário Rafael Oliveira, 23 anos, destaca que todos os meses são para se orgulhar. "A parada é mais um ato para concretizar essa luta, reunir todo mundo e fazer valer a visibilidade", afirma. O morador de Taguatinga Norte estava acompanhado do amigo Guilherme Cavalcante, 32 anos. O tradutor de jogos acrescenta que o evento demonstra a força e a união. "Quanto mais a gente se unir, mais longe iremos. Tem que vir, tem que fazer barulho e tem que se mostrar presente", pontua o morador de Águas Claras.
Os amigos revelam ainda como foi contar para os pais sobre a própria sexualidade. Os pais de Rafael são religiosos e ele, por um tempo, se relacionou apenas com mulheres. "Comecei a me descobrir e fui falar com a minha mãe. Apesar de ela ser uma pessoa rígida, ela sempre me acolheu para conversar", destaca o securitário. "Para eles, foi um pouco confuso porque faltava informação sobre a bissexualidade em si. É visto mais como promiscuidade do que você ser gay ou lésbica mas, com o tempo, eles viram que eu não ia sair por aí enlouquecendo e começaram a entender", recorda. "A gente também tem que entender a limitação das pessoas mais velhas, não que isso seja desculpa", pondera.
Já para Guilherme contar para a mãe foi um momento de alívio e desabafo. "Quando eu saí do armário, foi a única vez que a minha mãe desligou a novela. Ela nunca faz isso. Um dia eu estava muito triste e realmente precisando de alguém para me abraçar e me ouvir chorar", relembra. Ele conta que chamou a matriarca da família para conversar e falar que era gay. "Eu dei muita sorte. Tanto que quando eu estava abraçado com ela, ela ainda falou: 'Você achou que eu ia reagir mal? Não me conhece não?'", detalha o tradutor de jogos.
Para o morador de Águas Claras, o momento foi maravilhoso. "O que tinha tudo para ser uma experiência traumática, eu sinto que foi um privilégio", pontua. "No fim das contas, a gente precisa ter muita compreensão tanto de um lado quanto de outro. Temos que ver muito mais no que somos semelhantes do que nossas diferenças para que possamos nos unirmos", conclui Guilherme.
Nascida em 1998, a Parada do Orgulho LGBT de Brasília é a terceira parada do orgulho LGBT mais antiga do Brasil. O advogado Anderson Alves, 25 anos, enfatiza que o intuito da parada gay é realmente a política. "A gente precisa de mais representatividade no poder. Muitas pessoas precisaram levar tapa na cara e morrer para a gente estar aqui hoje e é por isso que acho tão importante essa união dos LGBT", destaca.
Acompanhado do amigo e psicólogo, Rodrigo Portilo, 28 anos, os dois estavam no evento pela segunda vez.
Anderson pontua ainda que cada vez que um político que não é a favor do ser humano e dos direitos humanos é eleito, há um retrocesso enorme para a sociedade. "Enquanto ainda colocarmos pessoas dentro do Congresso Nacional que tem esse comportamento, a gente nunca vai chegar onde realmente queremos que é a igualdade", opina o morador de Águas Claras.
Amor e resistência
A técnica de laboratório Anna Carolina Baccochina, 33, e a representante comercial Letícia Baccochina, 30, estão juntas há sete anos e casadas há quatro anos e meio. Elas contam que o casamento foi às pressas após o ex-presidente Jair Bolsonaro ser eleito em 2018. "O mais interessante é que nos casamos no ano que ele ganhou as eleições. Casamos por medo e foi um ato de resistência talvez", destaca Letícia.
A representante comercial explica o receio de perder direitos conquistados com tanta luta pelos LGBTQIAPN . "Foi por medo de acontecer alguma coisa e outra não poder entrar no hospital ou de não ter direito nenhum sobre os bens que nós construímos juntas", ressalta. Entre o resultado da eleição e o dia do casamento, foram apenas 24 dias para resolver toda a papelada e fazer a cerimônia. "Por conta da rapidez, tirou um pouco do nosso sonho do pedido, do noivado e da festa. Nosso casamento está dando certo, apesar da correria para oficializar", celebra o amor.
Elas aproveitaram o domingo na parada também para levar os filhos caninos Eevee, Zé e Logan para passear. Além dos cães, as moradoras de Sobradinho são também mães de pets de sete gatos e 10 calopsitas. "O evento é mais do que os trios e as apresentações. É o espaço de estar todo mundo junto e ter essa convivência", comenta a técnica em laboratório. "É sempre um movimento pacífico e muito divertido, alegre e família", completa a representante comercial.
Respeitar é preciso
Participante do movimento Mães pela Diversidade, a dona de casa Adelaide Miranda, 51 anos, tem uma filha trans e faz questão de ir ao evento para mostrar que as pessoas LGBTQIAPN também têm uma família, são amadas. "Nós lutamos pelo respeito. As pessoas precisam ter liberdade para serem elas mesmas e nós não vamos abrir mão dos nossos direitos", destaca. "Minha filha sempre sofreu muito preconceito e muita violência, por isso estou aqui", pontua a moradora da Asa Sul.
Coordenadora do movimento no DF e produtora cultural, Mônica Monteiro, 65 anos, ressalta que o Mães pela Diversidade reúne os pais e faz um trabalho de acolhimento com eles e os filhos, além de ações de militância junto ao Governo Federal e Distrital. A moradora do Jardim Botânico conta que tem duas filhas gêmeas de 35 anos que são lésbicas e um nete que é não-binário, de 13 anos. "Mais importante do que aceitar, é respeitar. Precisamos que essas pessoas LGBTQIA sejam respeitadas como cidadãos que são. É por isso que a gente batalha e que a gente briga ao lado dos nossos filhos", enfatiza.
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