O Brasil é o país com maior prevalência de depressão na América Latina e é também o mais ansioso do mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Esse quadro alarmante de saúde mental do país se deve a diversos fatores, entre eles a desigualdade de acesso aos serviços básicos, luto recente em decorrência da pandemia e até mesmo sequelas da chamada covid longa. Segundo a psicóloga Fernanda Magano, conselheira nacional de saúde e integrante da mesa diretora do Conselho Nacional de Saúde, é fundamental ter um olhar mais amplo para a área de saúde mental e fortalecer os serviços psicossociais. "Cuidado em liberdade é a melhor forma de reinserção. É necessário investimento para a retomada dos princípios da Reforma Psiquiátrica e da Luta Antimanicomial", pontua a especialista ao programa CB.Saúde desta quinta-feira (6/7) — parceria entre o Correio e a TV Brasília.
Na segunda-feira (4/7), o governo federal anunciou o investimento de R$ 200 milhões para a ampliação da rede de assistência em saúde mental no Sistema Único de Saúde (SUS). A psicóloga Fernanda celebrou o anúncio e detalhou que os recursos serão destinados para a abertura de mais Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) no país, o fomento da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) e para o aumento da capilaridade das residências terapêuticas — que são locais de moradia destinados a pessoas com transtornos mentais. Esses mecanismos do SUS existem para tentar assegurar o atendimento humanizado e integral aos indivíduos que necessitam de atenção psicossocial.
Em entrevista a jornalista Carmem Souza, a conselheira nacional de saúde lembrou que a gestão do presidente Jair Bolsonaro (PL) foi marcada pelo esvaziamento do corpo funcional de serviços psicológicos e do distanciamento dos ideias da reforma psiquiátrica, sancionada em abril de 2001. A política prevê atendimento humanizado e pautado na individualidade e no exercício da cidadania das pessoas em sofrimento mental. De acordo com Fernanda Magano, a última gestão gerou um "efeito cascata" nos serviços psicossociais em todo o país.
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A especialista chama a atenção para a importância de ampliar o número de profissionais especializados, focando em áreas diversas, como psicólogos, psiquiatras, terapeutas ocupacionais e enfermeiros. Apenas com essa ampliação é que o Estado será capaz de assegurar o "devido acolhimento". "As questões de saúde perpassam por qualidade de vida, igualdade de acesso. Temos sofrimentos pautados pela lógica capitalista que nos permeia", ressalta Fernanda.
A especialista também citou a necessidade de exercitar um olhar individualizado às pessoas que buscam atendimento psicossocial. Segundo levantamento desse ano, do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP), cerca de 35% das crianças e adolescentes brasileiros sofrem de ansiedade ou depressão devido a pandemia. Outros agravantes à saúde mental dessa faixa etária são o uso excessivo de telas, violência nas escolas e afastamento dos pais. "Um emaranhado de coisas que devem ser atendidos", define Fernanda.
Outro público que nem sempre é visibilizado são os idosos. Para Fernanda, aspectos como preconceito, estigmas, violência e falta de assistência social contribuem para o adoecimento mental das pessoas da terceira idade. A especialista argumenta que é necessário que a sociedade desenvolva um olhar diferenciado para o ato de buscar ajuda especializada, pois os cuidados em saúde mental possibilitam o autoconhecimento e desenvolvimento de habilidades socioemocionais. "Pensar a saúde em um espectro mais amplo e romper com a ideia de que o cuidado com a saúde mental anuncia que você é uma pessoa fora da curva", orienta.
Outro ponto levantado na conversa com a psicóloga foi a permanência da ministra Nísia Trindade no comando do Ministério da Saúde. A médica foi alvo de fritura após o Centrão manifestar interesse na pasta. Na quarta-feira (5/7), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) garantiu a presença da ministra. Para Fernanda, a atitude do Chefe do Executivo é em reconhecimento ao "ótimo trabalho" que ela tem desenvolvido no ministério e pela trajetória de Nísia na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).