Um dos hábitos do pedófilo Daniel Moraes Bittar, 42 anos, preso por sequestrar uma menina de 12, no Jardim Ingá, e estuprá-la na Asa Norte, era o de trocar mensagens pela internet com jovens para saber o endereço, gostos pessoais e até enviar presentes em forma de mimos. Foi o que ocorreu em 2001, quando Mônica Tavares* trocou mensagens com o homem em um site de bate-papo. Com 14 anos na época, ela criou uma amizade de três meses com ele, que mentiu a idade ao dizer que tinha 16 anos, mas que, na verdade, tinha 20.
A primeira pergunta à adolescente foi a cidade onde ela morava. "Nunca tive orientação da minha mãe do que não falar na internet e falei a verdade onde moro. Ele falou que morava na Asa Norte com os pais e com uma irmã, que se chama Carolina", conta. Com uma semana de conversa, Daniel dizia que queria ter um relacionamento sério com a adolescente, o que a assustou por se considerar muito nova para isso. "Eu queria tê-lo somente como amigo, mas ele disse que queria ser mais que um amigo, dizendo 'quero me casar com você'. Em seguida, colocou a irmã dele para conversar comigo, mas nunca dava para saber se era ela mesmo", detalha. Nesse período, o pedófilo a chamou, em duas oportunidades, para visitá-lo em casa, mas Mônica disse que nunca chegou a ir.
Em outro momento das conversas, segundo a jovem, Daniel dizia que a irmã dele estava andando com "gente errada", se envolveu com drogas e depois engravidou. As mensagens em tom duvidoso e insistência para sair assustaram a menina. Daniel percebeu que ela era fã dos desenhos da série de curta-metragem Looney Tunes, perguntou qual era o endereço dela para enviar presentes. "Como eu era ingênua, mandei o endereço e ele me mandou um bichinho de pelúcia do Taz Mania, e um chocolate. Ele pediu para eu vestir uma saia e fazer pose para tirar uma foto dos presentes e mandar para ele. E mandei", recorda a mulher.
Crise de ansiedade
Quando soube que Daniel foi preso por estuprar uma criança de 12 anos, a mulher teve uma crise de ansiedade quando soube dos detalhes. "Quando vi, fiquei muito chocada, passei mal e fiquei com vontade de vomitar. Apesar de não ser uma pessoa próxima, eu tinha uma amizade com ele. Mas sinto vergonha de ter conhecido uma pessoa assim", desabafa.
Perguntada sobre como avalia a conduta do pedófilo, ela o define como um monstro e acredita que Daniel, de fato, é um psicopata, por agir de forma fria, fazendo de tudo para atrair a criança para perto dele. "É uma pessoa que estava sempre fazendo voluntariado. Eu via fotos dele nas redes sociais vestido de palhaço, indo nos hospitais para alegrar crianças. Eu tive muita sorte de não ir encontrar com ele, senão eu poderia ter sido uma vítima", desabafa.
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Exposição
A rapidez na denúncia colaborou para que a adolescente raptada por Daniel Bittar fosse resgatada com vida, algo que é enfatizado pela especialista em proteção infantil em escolas e CEO do projeto Educação Protegida, Katia Dantas, que ressalta a importância de denunciar a pedofilia e o sequestro infantil imediatamente. "No Brasil, temos a Lei da Busca Imediata (11.259/2005), que obriga as autoridades policiais a registrar o sumiço no primeiro momento da desaparição, sem precisar esperar 24h ou 48h. Isso pois cada minuto que a criança está desaparecida é essencial", alerta. "A adolescente, nesse caso, ficou quase 12h em posse do criminoso e sofreu muito. Não é algo irreversível, mas muda completamente a forma dela de ver o mundo. Então, quanto mais pudermos evitar esse tipo de crime, melhor", aponta Katia.
Em relação à prevenção do abuso e sequestro infantil, a especialista traz dicas (confira Fique atento!) e faz um alerta aos pais. "Uma coisa muito importante, é a exposição desnecessária da criança nas redes sociais, isso pode ter um custo muito alto. Os abusadores, muitas vezes, criam perfis em que eles fazem quase que um 'buffet' de opções, com as fotos dos menores", ressalta.
Em contato com o Correio, a mãe da criança sequestrada e abusada por Daniel Bittar disse que a adolescente deve ser ouvida nesta semana pela polícia. Em relação ao depoimento da criança, Katia Dantas afirma que é importante entender que, durante o estado de choque, ela pode não ser produtiva na hora de falar. "Isto porque o trauma pode gerar memória fragmentada, respostas emotivas e 'respostas testes' — em que ela fala e depois volta atrás —, prejudicando o relato à polícia", comenta. "Exatamente por essa razão, o depoimento deve ser feito em um ambiente acolhedor, com pessoas altamente capacitadas e treinadas, visando minimizar a exposição da vítima a constantes lembretes desse abuso", avalia.
Combate
Ao falar sobre como combater esse tipo de crime, a especialista faz críticas à legislação brasileira. "Toda forma de abuso exige uma resposta muito mais complexa e ampla. Temos uma lei muito frágil, para o que é a defesa dos direitos das crianças. Esse tipo de crime cometido contra a adolescente é hediondo, mas deveria ter penas muito mais altas", opina. "A punição prevista no Art. 245 — que trata sobre a produção, armazenamento e disseminação de pornografia infantil — é extremamente baixa. Uma pessoa que é pega somente por isso, nem vai para a cadeia, pois a pena é de quatro anos de prisão", lamenta.
Além de sugerir leis mais rigorosas, a CEO afirma ser necessário fortalecer o judiciário, "para realmente conseguir lidar com a demanda". "É preciso trabalhar de forma que, uma vez denunciado o crime, ele siga no inquérito, no judiciário, etc., de maneira firme", conclui.
*Nome fictício para preservar a identidade da entrevistada
Colaborou Mila Ferreira
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