O ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello concedeu entrevista ao Correio, publicada neste domingo (11/6) na coluna Eixo Capital, e falou sobre a importância do Fundo Constitucional do Distrito Federal.
Por que, na sua visão, o Fundo Constitucional do DF volta ao debate agora?
Ante a falta de percepção maior. Brasília, sediando o Poder Central, é e sempre será um cartão de visita. Não há como desprezar esse fato.
O relator do arcabouço fiscal na Câmara dos deputados disse que estabeleceu um teto de correção do Fundo Constitucional porque precisava adotar um critério. Mas Brasília não seria única por ser a capital?
Estabelecer teto é diminuir a importância, nacional e internacional, da capital do país. É preciso enxugar a máquina administrativa? Sim. Mas sem o desprezo de valores maiores, da organicidade do Distrito Federal. Foi um ato impensado do parlamento.
Por que políticos de várias unidades da Federação têm interesse em diminuir os repasses para o DF?
Porque deixam de perceber, em visão míope, o que se faz em jogo. O Fundo tem uma razão de ser, perceptível aos bens intencionados — custeia serviços do interesse, não do Distrito Federal enquanto equiparado aos Estados, mas sim da União. É ela a primeira interessada na intangibilidade, na preservação do Fundo. Logo, afastados interesses paroquiais todos os estados devem buscar preservá-lo.
Mexer no Fundo Constitucional causa instabilidade na gestão e o risco de novas mudanças?
Mitigar, seja de que forma for, o Fundo é desconhecer por completo a razão da existência, viabilizando a Babel, a derrocada da gestão e serviços.
Brasília é muito mais do que a sede dos Três Poderes, das embaixadas e dos organismo internacionais. Acredita que houve discriminação ou desconhecimento em relação a cidade por parte dos congressistas?
Acredito na ocorrência de um ato falho, impensado, em termos de consequências. Em primeiro lugar há de estar o bem maior. O Distrito Federal, em termos de organização, o é, presente o fato de sediar o Poder Central, os tribunais superiores, o Supremo e as embaixadas dos países irmãos.
O senhor acha necessário a existência do FCDF?
É indispensável, inafastável em sua grandeza, não cabendo, a partir de óptica invejosa, amesquinhá-lo. Que se tenham em conta os objetivos maiores do Fundo.
Por que Brasília ainda não conseguiu desenvolver uma vocação fora do serviço público ou comércio e serviços, para aos poucos conquistar a autonomia financeira? Como o senhor vê o futuro de Brasília?
Brasília acabou sendo vista como um palco de sucesso, ocorrendo grande migração. De braços abertos recebe pessoas e famílias de todos os estados da Federação. Impossível é exigir estrutura própria a dispensar o Fundo de Assistência. A Administração de Brasília faz o possível na conciliação de receitas e despesas.
Brasília sofre um ataque orçamentário pela falta de compreensão de parte dos políticos a respeito de prerrogativas da cidade como capital do país?
Sim, falta a percepção desapaixonada, a percepção com pureza d'alma.
O 8 de janeiro criou no país um sentimento de que Brasília faz pouco pela segurança dos poderes da República e recebe uma quantia elevada dos cofres públicos federais?
Em 8 de janeiro ocorreu o impensável, à conta de um grupo de baderneiros, não podendo os cidadãos como um todo serem responsabilizados. A segurança investigativa e repressiva- retratada na Polícia Civil, Militar e no Corpo de Bombeiros, é exemplo para os demais Estados da Federação. Correção de rumo pressupõe sensatez.
Até hoje, 63 anos depois de sua inauguração, Brasília ainda sofre questionamentos por ser a capital. Foi um erro ou acerto instalar a capital no centro do país?
Decididamente foi um acerto. O implemento da transferência, de há muito prevista, pelo Governo Juscelino Kubitscheck, foi um avanço memorável, e olha que sou carioca.
O senhor mora aqui há quatro décadas fez essa escolha por que? Como explica Esse sentimento de pertencimento em relação a Brasília?
Tenho mais tempo de Brasília do que estive na Cidade Maravilhosa. Aqui cheguei, com a mulher Sandra, desembargadora, com as filhas Letícia, Renata e Cristiana, procuradora do Distrito Federal, em 1981, deslocado do Tribunal Regional do Trabalho para o Tribunal Superior do Trabalho. Aqui nasceu Eduardo Affonso- Advogado. Meu domicílio é Brasília, com muita honra, tendo residência, sem ânimo definitivo, portanto, no Rio de Janeiro e, como bom carioca, " praiano ", na Barra da Tijuca. Como julgador divergir muito. Aquiesço: pertenço de corpo e alma a Brasília.
O que diferencia, na Constituição, o Distrito Federal para receber recursos do FCDF?
Aqui está o coração da República.
Há possibilidade de o GDF recorrer à Justiça para preservar o fundo?
Sabença geral: a última trincheira da cidadania é o Judiciário. Que jamais falte à nacionalidade.
"Deixemos entregues ao esquecimento e ao juízo da história os que não compreenderam e não amaram esta obra." O que pensa dessa frase de JK, nesses tempos de ataque à capital cuja missão-síntese é mudar o destino político e econômico do país?
Frase que estamos vivenciando na realidade. A história não perdoa os desavisados. Mais uma vez, parabéns a JK.
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