Jornal Correio Braziliense

Carreira

Mulheres compartilham os desafios para conquistar espaço dentro da engenharia

As dificuldades ao escolher uma profissão dominada por homens começam nas universidades, mas as mulheres reconhecem que levam ao trabalho maior diversidade de pensamentos para resolver problemas e capacidade de expandir projetos

Embora as capacidades técnicas e intelectuais de alguém não devessem ser medidas a partir do gênero, algumas carreiras têm desequilíbrios significativos entre a quantidade de homens e mulheres presentes na profissão. Nas instituições de ensino superior, as discrepâncias podem ser observadas em diferentes áreas do conhecimento. Nas engenharias, por exemplo, os homens dominam. Segundo dados fornecidos pela Universidade de Brasília (UnB), dos 7.031 estudantes dos cursos de engenharia, que são ofertados nos campi da Asa Norte e do Gama, apenas 1.741 são mulheres, cerca de 24% do total.

Eduarda Cavalcante Maia, 23, é uma das poucas mulheres no corpo discente de engenharia mecânica da UnB. "No meu departamento, não temos muitas professoras como referência e poucas colegas também. Cada turma, geralmente, começa com uma ou duas alunas. Eu tive a 'sorte' de entrar com outras quatro meninas. Hoje, restou apenas uma além de mim", lamenta Eduarda. Na engenharia mecânica, apenas 16% dos estudantes são mulheres, na instituição.

Estudar em um ambiente onde a grande maioria é homem é desafiador. "Quando eu entrei, senti que não era um ambiente confortável para reclamar ou compartilhar sentimentos. Sinto-me testada por várias vezes. Perguntas idiotas que são feitas para nós, mulheres, não seriam dirigidas a eles", sustenta a estudante.

Eduarda decidiu fazer engenharia mecânica ainda na adolescência. Ela já havia feito um curso de eletrotécnica e passou a pesquisar as áreas em que poderia atuar. "Uma das professoras do curso me deu dicas que me ajudaram na hora da escolha também", recorda. Maia revela que participa de um grupo de um aplicativo de mensagens formado só por alunas do curso. "Serve para a gente se dar força e compartilhar dicas das disciplinas do curso, além de alertas de segurança, principalmente após os episódios de violência contra mulheres que ocorreram nos últimos tempos no campus", diz Eduarda, que evita frequentar aulas à noite na universidade.

No nono semestre da graduação, a formatura da estudante se aproxima. Ela tem o desejo de aplicar os conhecimentos que adquiriu ao longo do curso em duas áreas distintas: aviação e mineração.

Kelly Teixeira, 24, está no oitavo semestre de engenharia de produção, também na UnB. Embora haja um equilíbrio maior entre os gêneros no corpo discente, ela reconhece que as mulheres ainda são poucas entre os professores. "Querendo ou não, nós nos sentimos mais abraçadas quando encontramos representatividade no ambiente. Me dá a ideia de que é possível atingir patamares mais elevados na academia", analisa Kelly.

Arquivo pessoal - Nos cursos de engenharia da UnB, 24% são mulheres

A estudante reconhece a importância da presença feminina nos espaços acadêmicos. "Fazer networking com professoras é mais confortável, porque elas sabem pelo que passamos dentro da academia", explica. "Mais mulheres dentro das engenharias trazem maior diversidade de pensamento na resolução de problemas, além de inspirar outras meninas que não têm referências. Muitas vezes, falta essa representatividade, porque, geralmente, as mulheres acabam pensando muito no cuidado do outro se esquecendo delas mesmas. Dessa forma, é difícil a mulher se visualizar nesses lugares", observa.

No curso de graduação de Kelly, as mulheres representam cerca de 30% do total de alunos matriculados.

Criatividade

Aos 19 anos, Ana Alice Alves Martins faz o terceiro semestre de engenharia de software na Universidade Católica de Brasília (UCB). A escolha é devido ao desejo de atuar no universo dos games. "No começo, entrei na minha sala e vi apenas oito meninas em uma turma de 70 alunos. Fazer parte dessa minoria não me incomoda muito. O que é difícil é arranjar emprego como mulher. Tenho vários colegas que já conseguiram um trabalho, mesmo antes de se formar", diz Ana Alice.

"Já é um curso 'egoísta', porque as pessoas não costumam compartilhar os códigos de programação. Para as mulheres, isso se agrava, dificulta socializar e fazer networking, principalmente para quem é mais tímida", avalia. "A importância de ter mais mulheres para a tecnologia, que é uma área muito ampla, é que temos uma criatividade a mais, com visões que muitas vezes os homens não têm. Temos a capacidade de aprimorar e expandir projetos", sustenta.

Segundo dados repassados pela UCB, as mulheres representam 34% do total de alunos matriculados nas graduações de engenharia, presencial ou à distância.


Arquivo pessoal - Nos cursos de engenharia da UnB, 24% são mulheres
Arquivo pessoal - Para Kelly Teixeira, mais mulheres na engenharia traz a diversidade de pensamento para a solução dos problemas

Tags