Jornal Correio Braziliense

Entrevista

Investigações têm foco nos financiadores e nos organizadores, diz Chico Vigilante

Presidente da CPI dos Atos Antidemocráticos, Chico Vigilante (PT) falou sobre o diálogo entre a CLDF e o GSI para ter acesso a novas imagens dos ataques. Ele também comentou sobre a atuação de Alexandre de Moraes à frente das apurações

O deputado Chico Vigilante (PT), presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Atos Antidemocráticos, foi o convidado do CB.Poder — parceria entre Correio e TV Brasília. À jornalista Ana Maria Campos, ele falou sobre as conversações entre a Câmara Legislativa (CLDF) e o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) para ter acesso a novas imagens do Palácio do Planalto nos ataques ocorridos em 8 de janeiro. Entre outros temas, o distrital também analisou a investigação relacionada aos financiadores do atos golpistas, um dos principais objetivos da CPI. "Se não chegarmos aos financiadores e aos organizadores, teremos fracassado. Aí eles poderão se animar a fazer novamente", advertiu.

Ao que parece teremos uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) instaurada a partir de amanhã no Congresso. O que muda nos trabalhos da CPI da Câmara Legislativa, tendo uma outra investigação em curso no país?

Na verdade, temos a Polícia Federal (PF) e o Ministério Público (MP) investigando, com coordenação do ministro Alexandre de Moraes (do STF). Também temos a CPI dos Atos Antidemocráticos aqui, no Distrito Federal, e, agora, essa proposta de CPMI. Para mim, quanto mais investigação, melhor. É importante pontuarmos que essa questão começou quando da ocupação do pátio dos quartéis do Exército e se agravou com aqueles atos de 12 de dezembro de 2022, quando houve praticamente um assalto sobre a cidade, com depredação da 5ª Delegacia de Polícia (Asa Norte) e tentativa de invasão do prédio da PF. Conversando com um delegado da PF, ele me dizia que, naquele dia, por pouco, não morreu bastante gente, porque eles foram pegos de surpresa. Mas quando eles chamaram o Comando de Operações Especiais para proteger o prédio, poderia ter morrido gente ali.

O senhor acredita que essas investigações da CPI da CLDF, Polícia Federal, Ministério Público e CPMI vão chegar num mentor intelectual ou financiador de todo esse movimento?

Se não chegarmos aos financiadores e aos organizadores, teremos fracassado. Aí eles poderão se animar a fazer novamente. É por isso que o ministro Alexandre de Moraes (STF) tem agido com tanto rigor. Ele tem mais informação do que todos nós. Portanto, é preciso ir a fundo nas investigações e punir quem deve ser punido. Quanto aos financiadores, é muito importante pegar os que estão no agronegócio sujo. Há o agronegócio de pessoas trabalhadoras, corretas, e tem o agronegócio dos desmatadores, dos madeireiros, dos que querem o mal dessa nação. Por isso, é preciso ir fundo, efetivamente, para que essas pessoas não se animem a voltar a dar um golpe. Temos uma série de golpes que já aconteceram neste país. Os golpistas têm integrantes do Exército Brasileiro, que estavam numa vida luxuosa e não queriam perder privilégios; na Polícia Militar; e tem essa parte do agronegócio sujo.

 

"Se não chegarmos aos financiadores e aos organizadores, teremos fracassado. Aí eles poderão se animar a fazer novamente. É por isso que o ministro Alexandre de Moraes (STF) tem agido com tanto rigor."

 

O senhor chegou a pedir acesso aos vídeos do circuito interno do Palácio do Planalto. Os recebeu? Se não, tem expectativa de receber em breve?

Nós havíamos pedido antes. A resposta foi de que era um material muito grande (160 horas) e eles teriam dificuldade em compilar tudo isso. Nos dispusemos a mandar uma equipe da CPI com quantos discos rígidos (HDs) fossem necessários para copiar tudo. Estamos aguardando a resposta deles (Gabinete de Segurança Institucional), pois queremos copiar na íntegra, direto da fonte. Não quero me contentar só com essas imagens que foram divulgadas, especialmente as que foram editadas.

Nesta semana tem um depoimento da coronel da Polícia Militar (PMDF) Cintia Queiroz de Castro. Qual é a expectativa da contribuição dela?

Espero que ela também possa contribuir falando a verdade, dizendo como foi esse programa que tinham elaborado e que não cumpriram nada. No dia da nossa audiência com o ministro Alexandre de Moraes, ele que foi secretário de Segurança Pública de São Paulo, disse: "Aquilo que fizeram foi o maior desleixo. Nunca tinha visto algo tão tenebroso". Mentiram, quando elaboraram o programa de segurança daquele dia. Disseram que tinha 600 homens treinados e não tinha. Só havia naquele dia, na Esplanada dos Ministérios, 200 cadetes, pessoas que não estavam preparadas ainda para operações de rua. Lembrei até de outra imagem para a qual o próprio Alexandre de Moraes chamou atenção: "Como vão numa operação desastrada daquelas e levam aquele pobre cavalo para apanhar na rampa do Congresso? Não tiveram respeito nem pelo animal".

Mas quem foi responsável por essa omissão?

Existe uma cadeia de responsabilidades. Há o coronel Fábio (Augusto Vieira), da PMDF, que não estava comandando nada, foi lá apanhar também, quando deveria ter levado a tropa de choque. Tem o secretário de Segurança (Pública) Anderson Torres, que não assumiu a secretaria, nem passou o cargo ao secretário-executivo, Fernando de Sousa; foi para os Estados Unidos e deixou o baderna estabelecida aqui. Hoje, chego a conclusão de que eles fizeram tudo isso, achando que o golpe prosperaria. Então, voltariam todos eles nos braços dos apoiadores, com uma ditadura estabelecida no Brasil. Por isso, Bolsonaro e Torres viajaram antes, e não tomaram providência nenhuma com relação a tudo que aconteceu. Dentro da cadeia de responsabilidade, também há a questão do governador Ibaneis Rocha. Quando a ministra (Rosa Weber), autoridade máxima do Judiciário brasileiro, ligou, ele passou mensagem como se ela fosse uma qualquer, dizendo: "Se dirija ao meu secretário". Como ela falaria com o secretário, se não tinha secretário aqui? Aquilo era caso de ele ter pegado o carro dele, com um ajudante de ordem, ter ido aonde a ministra estivesse e, de lá, comandando a situação.

 

"Hoje, chego a conclusão de que eles fizeram tudo isso, achando que o golpe prosperaria. Então, voltariam todos eles nos braços dos apoiadores, com uma ditadura estabelecida no Brasil."

 

Na sua opinião, se o doutor Julio Danilo tivesse permanecido no cargo teria sido diferente?

Eu não tenho dúvida que teria sido diferente. Tanto é que, ele estava entrosado com o governo federal e tinha montado um grande plano de segurança para a posse (presidencial), que foi um sucesso absoluto. Portanto, isso não teria acontecido se ele tivesse permanecido na Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal.

Anderson Torres completou 100 dias de prisão. Mesmo com um parecer favorável do Ministério Público para revogação da prisão, o ministro Alexandre de Moraes manteve a custódia. Na sua avaliação, tem algo mais em relação ao ex-secretário de Segurança que ainda pode aparecer?

Eu tenho falado muito que o ministro Alexandre de Moraes sabe mais do que todos nós juntos. Ele tem muita informação, uma equipe fantástica de assessores, juízes federais, delegados federais. Enfim, a estrutura de investigação dele é muito bem aparelhado, e ele sabe mais do que nós, por isso está mantendo o Anderson Torres preso.

Ele foi convocado para prestar depoimento na CPI, mas conseguiu um habeas corpus para não falar. Na sua opinião, isso complica ainda mais a situação dele na avaliação política que a comissão fará?

O coronel Jorge Eduardo Naime (da PMDF) estava preso também e não procurou habeas corpus para não comparecer. Compareceu e falou tudo que a gente perguntou. Acho até que ele tem mais coisa a falar. Depois vamos verificar se o convoca novamente. Anderson Torres, inicialmente, concordou em ir, somente pediu que não houvesse imagens, para não constranger a filhinha dele, que tem 13 anos. Nós concordamos de que essa menina não podia ser exposta, portanto a gente ia pegar o depoimento dele sem imagens. O que nos interessa é o resultado das falas e não as imagens.

*Estagiário sob a supervisão de José Carlos Vieira