O secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, Sandro Avelar, passou por várias funções na carreira. Formado em direito pela Universidade de Brasília (UnB), ingressou na Polícia Federal (PF) em 1999. Na corporação, foi delegado regional de Combate ao Crime Organizado, membro do Comitê Nacional de Refugiados e chefe da Divisão de Estudos Legislação e Pareceres.
Ocupou a diretoria executiva da PF, segundo cargo mais importante da corporação, em duas oportunidades. Na Secretaria de Segurança do DF, exerceu o comando entre 2011 e 2014. Em 2023, Avelar volta a assumir a função em meio a um dos momentos mais delicados na segurança pública do DF. Escolhido em comum acordo pelos governos local e federal, ele tem o desafio de reconquistar a confiança da população nas forças de segurança. Próximo de completar 90 dias à frente da SSP, o secretário concedeu entrevista exclusiva ao Correio, em que comentou sobre esse e outros assuntos, como as ameaças de ataques às escolas, os atos antidemocráticos e o combate à criminalidade.
Na sua opinião, o que está por trás desses ataques e ameaças a escolas? O serviço de inteligência identifica um padrão? Há grupos organizados?
Acho que 20 de abril (massacre de Columbine, EUA) se tornou, dentro da deep web, uma espécie de inspiração para quem pretende cometer esse tipo de crime no mundo e, infelizmente, parece que isso também está acontecendo aqui, no Brasil. O que posso dizer é que estamos trabalhando muito para impedir que algo de maior gravidade aconteça no DF. Essa preocupação não se limita somente aqui, mas a todos os estados, principalmente depois do que aconteceu pelo país. Na nossa cidade, estamos intensificando as ações, contando com a participação de todos os órgãos vinculados à Segurança Pública, assim como outras secretarias, como a de Educação. Ela é uma grande parceira na hora de identificar eventuais ameaças, para que a gente possa coibir e impedir que algo de mais grave aconteça. O governador fez um gesto de extrema importância, que foi baixar o decreto (nº 44.427/2023). Com a medida, a gente consegue demonstrar seriedade na questão das falsas denúncias. Passamos a receber milhares de denúncias, por meio dos canais oficiais, só que a maioria são falsas — muitas praticadas por crianças. As denúncias que são de boa-fé são desejáveis e necessárias. Estimulamos a população a fazer qualquer tipo de denúncia, desde que ela seja justificada. Agora (com o decreto), se a pessoa pratica o trote, ela pode levar uma multa de R$ 4 mil.
As forças de segurança têm efetivo suficiente para patrulhar todas as escolas?
Estamos fortalecendo o Batalhão Escolar, tanto com a utilização de componentes de outros batalhões, mas também com a utilização do serviço voluntário e do policial designado. Não temos medido esforços para dar condições para que o Batalhão Escolar possa fazer um excelente trabalho. A manifestação da Câmara Legislativa (sobre a designação de policiais para as escolas) é extremamente bem-vinda. Essa preocupação de todos em construir soluções que sejam viáveis, é fundamental. Com participação dos poderes Executivo e Legislativo, vamos debater com transparência e buscar o fortalecimento das nossas instituições e das ferramentas que precisamos utilizar para trabalhar.
O monitoramento com câmeras nas imediações das unidades de ensino pode ser uma ferramenta contra possíveis ataques?
Temos procurado investir nessa área. Estamos com um projeto, que queremos executar com a maior rapidez possível, que engloba a ampliação do número de câmeras de vigilância e, com certeza, a aplicação desse tipo de tecnologia é importante, tanto no trabalho preventivo quanto no repressivo, em relação às escolas.
O senhor assumiu a pasta num momento delicado para a vida da cidade. Terroristas destruíram a Praça dos Três Poderes e começaram a pagar na Justiça pelos crimes. As investigações continuam? Os financiadores serão punidos?
Confio absolutamente no trabalho que está sendo feito pela Polícia Militar, no âmbito dos inquéritos internos, e na Polícia Civil, no tocante aos inquéritos que envolvem tanto 12 de dezembro quanto 8 de janeiro. Isso é um trabalho que a gente tem que esperar, respeitando o prazo da investigação.
Há possibilidade de atos como os de 8 de janeiro se repetirem?
Não. Temos total confiança de que o que aconteceu naquele fatídico dia, não vai se repetir. Aumentamos o efetivo do 6º Batalhão — responsável pela região da Esplanada —, estamos definindo os procedimentos que envolvem as manifestações naquela região, principalmente próximo à Praça dos Três Poderes. Estamos preparados de forma que o 8 de janeiro não vai acontecer.
O senhor viajaria de férias dois dias antes de um grande ato político na Esplanada? O que o senhor faria?
Tudo o que aconteceu está sendo objeto de apuração das forças e poderes competentes. É fácil ser "engenheiro de obra pronta". Não sei o nível das informações que o Anderson Torres tinha quando tomou as decisões. Qualquer coisa que eu falar aqui sobre o que aconteceu, vai ser precipitado.
Foi parte do seu desafio, quando assumiu a SSP, resgatar a imagem de que a PMDF é uma boa corporação e a população pode confiar nela?
Não tenho dificuldade em defender a Polícia Militar, pois acredito no que falo. Já tive a oportunidade de trabalhar com eles na primeira vez em que fui secretário de Segurança Pública, então, conheço a competência e as dificuldades da corporação. Meu papel é contribuir para que todas as forças de segurança, não só a PM, possam dar o seu melhor, além de mostrar as dificuldades pelas quais passamos, para buscar as melhores condições de trabalho, que vão se refletir no bem estar da população.
Durante o início das investigações, foi levantada a possibilidade da criação de uma Guarda Nacional para cuidar da Praça dos Três Poderes. Acha que isso seria necessário ou a população pode confiar na PM?
Tenho certeza absoluta de que a PM tem condições de exercer esse papel. Até porque ela já fez isso antes. É preciso que a gente tenha condições de gerenciar aquela região, ou seja, quando houver uma manifestação, os organizadores precisam se reportar à SSP, informando as condições que eles pretendem fazer e o número de participantes previstos. Tem que ter respeito àquela região. Ela merece uma atenção especial, por ser o centro dos poderes federais, além de ser o centro do poder do DF. Não é plausível que as manifestações que ocorram naquela zona, não tenham uma atenção especial, inclusive, no que precede, com as informações por parte dos organizadores. São aspectos que precisam ser levados em consideração.
Todos os secretários de Segurança têm um discurso de que a inteligência é o ponto crucial para combater o crime, mas os investimentos nessa área são pequenos. O que pode ser feito efetivamente?
A gente tem procurado incrementar essa área, otimizando os recursos e fortalecendo as ferramentas que nos ajudam na inteligência. Uma das coisas que temos feito é a integração entre as inteligências dos órgãos vinculados à SSP, além de contar com a participação de órgãos federais, que têm somado nesse esforço de alcançarmos as melhores condições de trabalho, com troca de informações.
O que o senhor acha da militância política nas forças de segurança?
Como tudo na vida, precisamos buscar o equilíbrio. Procuro ter, com os políticos que têm vínculo com a área de segurança, uma relação construtiva, ou seja, aquela pessoa que conhece a corporação e está com o espírito de contribuir para evolução dela, será muito bem acolhida nas suas ideias. O que não se pode admitir são interferências indevidas, que venham a comprometer o bom andamento das atividades das corporações. E o meu papel é, justamente, buscar esse equilíbrio.
Pretende mudar algum setor da SSP? O governador, na coletiva após o retorno ao cargo, disse que o senhor teria total autonomia sobre a pasta. Mas parte da equipe que hoje trabalha era de Júlio Danilo e Anderson Torres.
A Segurança Pública deu mostras de que o trabalho está sendo correto. Tivemos outras grandes manifestações que foram realizadas na época da posse do Congresso Nacional. O carnaval de 2023 foi muito bem conduzido — no que diz respeito à segurança, os números (de ocorrências) foram bastante baixos. Nos casos da criminalidade cotidiana, temos conseguido investigar e solucionar os casos que acontecem no DF. A autonomia dada pelo governador é, sim, importante para que a gente faça as mudanças em caso de necessidade — e elas já foram feitas. Mas não há razão para mudanças radicais. Se um dia elas forem necessárias, serão feitas, com certeza.
Em relação ao crime organizado no DF, a polícia tem realizado prisões com frequência de criminosos apontados como integrantes de facção. Como impedir que as células dessas facções se instalem na capital?
A gente tem feito uma troca permanente de informações, tanto no âmbito da nossa inteligência, como contando com a participação dos órgãos vinculados ao governo federal (PF, PRF, DEPen e Abin). Eles têm somado conosco nesse esforço de identificar eventuais ameaças e combatê-las. Estamos todos do mesmo lado e creio que essa integração vai nos ajudar a colher sempre bons resultados para impedir que essas facções tenham qualquer tipo de atividade no DF.
Em números, os crimes estão caindo. Mas as estatísticas positivas ainda não refletem na sensação de segurança da população. Como mudar isso?
A população tem que sentir a presença do Estado. Da nossa parte, temos procurado levar as nossas forças para perto da comunidade, utilizando também os efetivos do Detran-DF e do Corpo de Bombeiros, em apoio às polícias Civil e Militar. Para compensar o grande deficit de policiais que temos hoje, estamos otimizando os nossos meios, integrando as quatro forças de segurança com outras áreas do governo.
Em 2022, houve episódios de abordagens truculentas, por parte das forças de segurança. Por que isso acontece e o que será feito para que não aconteça mais?
Eventuais excesso, precisam ser apurados. As corregedorias estão aí para isso e costumam atuar de forma bastante incisiva. Considero que a nossa doutrina não é de cometimento de atos agressivos.
Os números de feminicídio dispararam no DF em 2023. O que a SSP tem planejado para coibir essa e outras práticas de violência contra a mulher?
Estamos acelerando o atendimento às mulheres que são vítimas de violência. Temos uma ferramenta que é importante dentro do projeto Viva Flor, que permite com que as vítimas acionem as forças de segurança com bastante rapidez. São crimes que demandam um esforço grande, por isso, além da SSP, a Secretaria da Mulher e a Secretaria de Comunicação estão trabalhando firmes para combater esse tipo de violência. Aquele vizinho, parente, amigo ou porteiro do prédio, por exemplo, que sabe de alguma situação de violência, tem que denunciar. Em briga de marido e mulher, tem que meter a colher sim. Essa soma de esforços é necessária, pois os crimes de violência contra a mulher, em quase 100% das vezes, são cometidos no ambiente familiar, onde a SSP não está presente de forma efetiva.
Qual é a importância da proposta do aumento para as forças de segurança?
Essa recomposição é fundamental. Essa expectativa é muito antiga e as nossas corporações estão com os salários extremamente defasados. Se fizermos uma análise comparativa com os 26 estados e o DF, é possível verificar que as nossas forças têm, hoje, um dos salários mais baixos do Brasil — ficando em torno da 21ª colocação. Perdemos, de longe, para locais onde o custo de vida é muito mais baixo.