A resolução do governo federal que proibiu o uso de animais em testes para cosméticos e produtos de higiene não basta, é preciso que se torne uma lei. A avaliação é de Vanessa Negrini, diretora do Departamento de Proteção, Defesa e Direitos Animais da Secretaria Nacional de Biodiversidade, Florestas e Direitos Animais do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima. À jornalista Ana Maria Campos, no programa CB.Poder — parceria entre o Correio e a TV Brasília —, a diretora informou que um projeto de lei está engatilhado para ser votado na Câmara dos Deputados, após passar por análise dos senadores. "A resolução é importante, está em vigor, mas pode ser revogada a qualquer momento. Uma lei é importante para assegurar esse movimento. Temos certeza que será a cereja do bolo para banir e deixar para trás esse assunto de teste nos animais. Tenho confiança que esse projeto será encarado como prioritário (pelos deputados)", afirmou.
A senhora esteve no GT do meio ambiente. Agora, ocupa um cargo no ministério. Como encara esse desafio inédito de estar à frente de um departamento que não existia antes?
A criação desse departamento atende uma reivindicação de movimentos sindicais junto ao governo Lula, e teve um acolhimento muito grande da ministra Marina Silva. O desafio é fazer a reestruturação desse departamento. Nós temos uma equipe com cinco analistas, mas precisamos ampliar e fortalecer. O desafio, agora, é desenhar os programas e ações que vão dar vazão a essas demandas do departamento. A partir desses desenhos, vamos para a etapa de orçamento, que vai viabilizar as políticas visadas.
O brasileiro respeita e protege o animal?
São situações adversas. Quando falamos de animal, estamos falando de um longo espectro. Cerca de 61% dos tutores de cães e gatos, por exemplo, consideram esses animais como membros da família. Quem comete crimes contra eles pode pegar de dois a cinco anos de detenção, além da multa. Por outro lado, não vemos essa proteção sobre os animais silvestres. No final de semana passado, circulou nas redes sociais a imagem de três onças que foram capturadas e decepadas. O que foi informado é que os suspeitos foram presos, mas soltos poucas horas depois. Por quê? Porque a legislação punitiva é diferente. A gente pune de forma mais branda crimes contra animais silvestres. É um trabalho que a gente buscará fazer no Congresso Nacional para mudarmos isso. Existe uma frente parlamentar em defesa dos animais, que está mobilizada e empenhada sobre esse tema. É necessário levar esse debate para lá e aumentar essas penas.
A relação entre os humanos e os pets se fortaleceu?
Sem dúvidas. Todo mundo que convive com cão e gato, sabe que o animal sente, e não apenas em questões biológicas, como fome. Ele também tem emoções, como tristeza, alegria, amor e, às vezes, fica até doente pela falta do tutor. O animal é um ser com consciência. A partir desse reconhecimento científico, a sociedade também vai se aprimorando e entendendo que, nesse convívio familiar, existe um ser que também merece ser tratado pela sua própria razão, pelos seus valores intrínsecos. A mudança da sociedade também vai impulsionando, também, a mudança das leis. É uma coisa que vai puxando a outra. Antigamente, quando você tinha um cachorro e era do casal e o casal se separava, no máximo, seria discutido em um juizado sobre quem ficaria com o pet. Hoje, a mudança da sociedade está tão avançada que discutimos esses casos nas varas de família. O animal não é um objeto, mas, sim, um membro da família. O juiz vai estabelecer quem vai ter a guarda, visitas, entre outros. Existe até um termo, hoje, chamado de família multiespécie, que é o reconhecimento de uma família com humanos e seus animais.
Recentemente, a senhora esteve na terra indígena Ianomami, com esse olhar sobre os animais. O que viu lá?
Fui, no início do ano, como voluntária de um programa de médicos veterinários que fazem resgate e salvamento em situação de desastre. O que a gente pôde perceber é que pessoas, comunidade indígena e animais padecem, da mesma forma, dos efeitos devastadores do garimpo e da exploração desenfreada do meio ambiente. Da mesma forma que acompanhamos aquelas cenas desoladoras dos povos indígenas desnutridos e sofrendo com doenças, (vimos) cães e gatos também vivendo na mesma situação. Cães e gatos que convivem naquela relação tão próxima, ficam mais suscetíveis a doenças. Muitas dessas doenças podem ser transmitidas para os humanos.