Em 14 de junho de 1991, foi instituída uma das grandes alternativas de lazer do Distrito Federal. No lugar do ronco dos motores e da poluição, crianças correndo, diversão, música e rodas de conversa. Há quase 33 anos, é assim que a vida flui aos domingos no Eixo Rodoviário, principal rodovia que corta o coração de Brasília. Ao invés de carros, motos e ônibus, gente. Muita gente. De todas as tribos, de diferentes idades.
A iniciativa, batizada como Eixão do Lazer, se torna propícia para a prática de atividades como a caminhada, ciclismo, skate e… tomar vinho? É o que fazem os amigos de longa data Reinaldo Leite, 67 anos, e Manuel José Forero, 68. Os dois se conhecem há mais de 30 anos, mas, depois da pandemia, passaram a se encontrar no trailer, que fica na altura da 211 Norte.
Reinaldo conta que frequenta o Eixão do Lazer desde o início, praticamente. "Depois da pandemia, isso aqui virou também um clube para mim, tenho que vir todos os domingos", comenta. "É algo sagrado, não troco por lugar nenhum. Os dias que não consigo vir, parece que não existiram", ressalta o advogado. Ele recorda que, no começo da iniciativa, os moradores do DF desperdiçavam o que tinham. "Era um ostracismo. Ficava pensando em quantos estados que queriam ter o que temos e não conseguem", acrescenta.
Sobre o hábito de tomar vinho no local, o morador da Asa Norte conta que começou depois que seu amigo apresentou o trailer. "Ele me convidou e acabei gostando. O espaço é muito bom", elogia. "Desde então, todos os domingos, faço minha atividade física no Eixão e depois sento aqui para tomar um vinho, bater um papo e 'consertar' Brasília e o Brasil. Aqui, a gente resolve qualquer problema", brinca.
Costume parecido com o de Manuel Forero. Ele comenta que se tornou um frequentador assíduo do local depois que a pandemia amenizou. "Domingo, para mim, também é sagrado passar por aqui antes de almoçar. Faço caminhada e depois me sento para tomar um drink ou um espumante", destaca. Nascido na Colômbia, o aposentado mora no DF desde 1978, mas conta que esteve em outros estados do Brasil. "Morei em outros lugares, que têm algo parecido com isso, mas nada se compara (ao Eixão). O brasiliense tem uma joia", aponta o colombiano, sobre o Eixão do Lazer. "É um lugar onde você se encontra e conversa com todo mundo. Independentemente de cor, gênero ou ideologia. Aqui, todo mundo é igual", diz.
Momentos de paz
O trailer onde os amigos tomam as bebidas pertence ao empresário venezuelano Eládio Doruber, 63, que mora no DF há 33 anos. Ele afirma que tentou se estabelecer com seu empreendimento em vários lugares, mas, há cerca de um ano, acabou parando no Eixão do Lazer e foi onde deu mais certo. "Gosto de falar que, em Brasília, os carros predominam. Para quem tem comércio de rua, isso é muito ruim, pois a observação das pessoas se torna muito rápida", observa. "No Eixão do Lazer, é totalmente o contrário. Por estarem caminhando ou no máximo de bicicleta, elas podem apreciar melhor, tem tempo de ver e decidir se querem ou não o produto", ressalta.
E essa foi a razão da escolha de Eládio. Para ele, o domingo no Eixão do Lazer está dentro da "escala humana de viver". "As pessoas namoram, relaxam, fazem poesia, etc. E nada melhor para acompanhar esse ritmo mais desacelerado do que tomar um bom vinho. Imagina só, tomar uma taça apreciando um belo pôr do sol", destaca. "Aqui não preciso convencer ninguém que eu sou bom. O próprio ambiente já convence o cliente. O negócio se vende", brinca o venezuelano.
Para relaxar
Há também quem aproveite o domingo no Eixão para atividades culturais e de contemplação. Moradores no Noroeste, Lucas Mattos e Isabela Fernandes, ambos com 31 anos de idade adoram curtir os dias de sol no local. Brasiliense de nascença, o servidor público Lucas afirma que aproveita o momento para apreciar melhor a cidade. "Aqui, posso desconectar da rotina de trabalho e relaxar, para começar a semana bem", aponta. "É um momento bem agradável, com um ambiente excelente. Não sei se consigo definir o que mais gosto aqui, acho que é uma mistura de tudo que o espaço oferece, do chorinho ao ar livre", comenta Lucas.
Isabela destaca que o momento a dois com o noivo é perfeito para tomar uma cerveja. "Às vezes, também gostamos de curtir o chorinho, que sempre tem por aqui. Quando chove e não dá para vir, acabamos sentindo muita falta, porque é muito bom mesmo, até para trazer nossos cachorrinhos (Cacau e Bento)", comenta. Ela afirma que a iniciativa é muito boa e se tornou parte de Brasília.
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Banho de chuva
Mas o Eixão do Lazer também proporciona reuniões animadas para famílias, como a do casal de servidores públicos Rafael Simões, 41, e Patrícia Mariano, 37, que aproveitou o domingo de sol para levar a filha Manuela Mariano, 5, e o sobrinho João Gabriel, 17, para um passeio de triciclo. Vindos de Goiânia, eles moram no DF há oito anos. "Desde então, sempre frequentamos o Eixão do Lazer, é muito difícil ter um domingo em que a gente não vem", afirma Rafael.
Segundo ele, é a variedade proporcionada pelo espaço que atrai visitantes. "Tem dia que a gente traz a Manu para brincar nos brinquedos infláveis, no outro a gente anda de bicicleta e também gostamos de vir para ouvir música. Todo domingo é uma atividade diferente", destaca o servidor público. "A qualidade que essa iniciativa proporciona é impressionante. No dia a dia, cada um vive sua rotina e seu trabalho. Só que aos domingos, as pessoas se conectam no Eixão", avalia.
Nesses oitos anos frequentando o Eixão do Lazer, Patrícia comenta que a filha do casal criou uma memória que pode durar a vida toda. "Temos uma lembrança muito forte, que foi o primeiro banho de chuva da Manu, quando ela tinha 1 ano e 10 meses de idade. Foi aqui", revela. "A gente já teve que correr algumas vezes por conta da chuva, mas, nesse dia, tomamos um baita banho", lembra. "Para ela, foi um máximo. A experiência mais marcante da vida dela, até agora, foi tomar banho de chuva e pular em uma poça d'água, no Eixão do Lazer", afirma Patrícia. "Vir aqui brincar, praticar alguma atividade física ou comer algo diferente, é sempre muito bom. Temos sempre a oportunidade de fazer algo novo", completa.
Música a céu aberto
As atividades ao ar livre que podem ser praticadas no Eixão vão além, há opções culturais nos domingos do cidadão brasiliense. Um desses projetos que é mais recente é o Choro no Eixo. Aos domingos, Márcio Marinho convida músicos de choro para uma roda ao ar livre na altura da 211 norte. Os instrumentistas juntam famílias no gramado ao lado do Eixão. "A gente fez esse projeto despretensiosamente, porque a gente acredita na cultura e no choro. Ver isso como um ponto de encontro é impagável. Porque observamos que conseguimos transmitir cultura para pessoas que se amarram em estar aqui com a gente. Não consigo nem descrever a felicidade, é mágico", conta Márcio. "A gente não imaginava proporção que iria tomar, nunca pensamos que tocaríamos para um público tão grande e diverso. Essa é a família Choro no Eixo", acrescenta o integrante do grupo responsável pelo cavaquinho de seis cordas. "Trazer a cultura e o choro para rua mostra que Brasília é também uma cidade-parque, não apenas uma cidade-museu", completa.
Essa música a céu aberto atrai pessoas de todas as idades. Marília Carvalho Linhares, assistente social de 24 anos, costuma frequentar o Choro no Eixo com os amigos, por gostar de atividades fora de casa aos fins de semana. "É muito gostoso estar em um ambiente assim, com boa música e com comida em volta", afirma. Ela pontua uma característica positiva do evento. "Rola quase toda semana e é super-acessível, seja para famílias, crianças, idosos e até pets", avalia. A assistente social classifica como "importantíssimo" ocupar a rua para esses tipos de projeto. "Por muito tempo tivemos dificuldade de ter eventos como esses, mas Brasília está criando bons espaços de lazer. Muita gente diz que não tem o que fazer em Brasília, mas projetos como Choro no Eixo fazem com que essas afirmações caiam na mentira", complementa.
Marília aproveitou para apresentar o projeto a quem mais ama. Ela trouxe os pais para o domingo no Eixão e o resultado foi positivo. Lea Linhares, dona de casa de 56 anos, foi pela primeira vez e disse que há mais de 20 anos não via algo musical tão legal. "Um lugar muito bom em que você se sente mais livre e a vontade e atrativo, porque não exige tantos recursos financeiros, qualquer um pode vir e se divertir", elogia.
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