Celeiro da arte, Ceilândia comemora seu 52º aniversário no Dia Mundial do Teatro. A junção da cidade e da Sétima Arte cria roteiros inspirados na rotina da região, arrastam grande público para peças e, o principal, criam identidade dos alunos com a própria cidade.
Morador do P Norte Gabriel Smithy, 25 anos, é graduado em cinema. Aluno do Centro de Juventude (CJ) de Ceilândia, desde agosto de 2019, quando assistiu a peça O Grande Miserável. "Eu estava passando por um momento difícil e o CJ foi um dos lugares onde eu pude exercer essa minha criatividade. Trouxe ideias de roteiro, personagens e aprendi mais sobre métodos de atuação", emociona-se.
Nascido na região, Gabriel lembra que começou a fazer curta-metragens aos 13 anos, na escola. "Naquela época eu sentia falta de ter um espaço assim, e hoje em dia, pessoas que querem colocar a criatividade para fora têm um local maravilhoso como esse."
O Centro de Juventude conta com o módulo 1, módulo 2 e grupo avançado de pesquisa CeinCena, totalizando 108 alunos. O último grupo se destacou no Festival Estudantil de Teatro (Festa), em 2019, com o espetáculo A Última Estação, e ganhou a premiação em duas categorias. Antes dessas conquistas, Ana Gabriela Aguiar, 22, conhecida como Gabi Aguiar, entrou para o projeto. "Eu precisava de alguma coisa que me ajudasse a falar na frente das outras pessoas e me apaixonei. Depois de alguns dias, eu não me via mais fora do teatro. E o teatro ajuda muito com a criatividade no mercado de trabalho e isso foi o que abriu o meu mundo", comenta Gabi Aguiar, que atualmente faz direito e usa as técnicas do palco para desenvolver melhor sua habilidade na advocacia.
Quem guia os alunos do projeto é o instrutor de teatro Dill Diaz, com participação no Cena Contemporânea, principal festival de teatro do DF. Ele dirigiu os espetáculos O Grande Miserável e Equalliz — Um Eco de Integridade, que trata de restabelecer o equilíbrio. "Eles se percebem não só como alunos de uma linguagem artística, mas como jovens que estão buscando um espaço", analisa.
Jovem de Expressão
Juntos desde 2015, o grupo teatral Jovem de Expressão, na Praça do Cidadão, em Ceilândia Norte, começou com 40 participantes em uma sala pequena, onde tinha aulas de dança e fotografia, mas, ainda, não havia teatro. À época recém formada, a atriz Mila Ellen, 30, ponderou. "A gente percebeu a importância de trazer o teatro para cá. A justificativa de todo mundo era não encontrar em lugar nenhum da região", recorda. "Depois que a gente começou a dar aula, muitos alunos entraram na universidade para fazer o curso de teatro. E, hoje, temos mais de 20 alunos formados em teatro", relata o dramaturgo Elmo Férrer, 41.
Com a peça Pertencer, o coletivo ficou em 3º lugar no Prêmio Web de Teatro como melhor espetáculo. Colher os resultados passa por expor a realidade que os artistas veem nas ruas, como Jakeline Ribeiro, 25, fez ao citar a violência contra a mulher no palco. "Levei coisas que vi na infância, com uma forma de viver o meu passado e as pessoas perceberem o quão importante é falar sobre feminicídio e juntar a arte com coisas relevantes para a sociedade."
Casa do Cantador
Inaugurada há 36 anos, a Casa do Cantador é reduto da cultura nordestina. Cleverton Silva, técnico administrativo que atua como gerente da casa, conta que "por volta de 1956, a grande maioria do pessoal que veio trabalhar era do Nordeste. Se apostava que quem participou da construção voltaria para sua cidade de origem, mas não foi o que aconteceu. Quem ficou por aqui trouxe na bagagem, além da mão-de-obra, toda a cultura nordestina", lembra.
Nos anos 1980, uma grande quantidade de repentistas reivindicaram a construção de um espaço. "Inicialmente, a Casa do Cantador era utilizada somente pelos repentistas, com o passar do tempo, outras pessoas — vindas de outros lugares do país — trouxeram uma pluralidade de gêneros. Nosso espaço passou a ser a maior referência cultural de Ceilândia. Tudo se mistura aqui na Casa do Cantador."
Ao ser questionado se Ceilândia pode ser considerada independente no quesito cultural, o técnico administrativo não titubeou. "Com certeza. Temos uma infinidade de artistas ceilandenses: no samba, temos o Marcelo Café; na parte mais regional, temos o Riva Santana; existem inúmeros de rock; trios de forró; e duplas sertanejas", listou o gerente interino.