Em todas as áreas, as mulheres vão ocupando os espaços a que têm direito, apesar dos obstáculos impostos pelo preconceito. No esporte, elas quebram paradigmas. Mostram seu talento e valor em modalidades que, até pouco tempo, eram dominadas pelos homens, como as artes marciais, o futebol, o skate e o kart.
A uruguaia Cibele Gonzalez, 46, dedicou-se às lutas desde cedo — capoeira, Jiu-Jítsu e kung fu. "Quando comecei no Jiu-Jítsu não tinham mulheres para treinar, então, foram 10 anos treinando só com homens. A curiosidade é que a maioria dos colegas de treino se graduaram e, hoje, a maioria deles é faixa preta, e eu permaneci na azul por 10 anos. Cansei de ver todo mundo graduar e eu não. Aí, fui treinar kung fu por quatro anos", conta.
Cibele acabou abandonando o universo das lutas. "Passei a frequentar o Eixão para ensinar meu filho a andar de skate. Conheci um grupo de skatistas, comecei a me interessar por longboard e, em seguida, um amigo me convidou para dar aulas de skate", relembra.
Sobre a diferença entre homens e mulheres nos campeonatos, Cibele avalia que ainda há um grande abismo nos rendimentos e patrocínios. "Nós nunca temos patrocínios e prêmios iguais. É difícil ir para um campeonato e ver que um homem ganha R$ 2 mil de premiação, e as meninas ganham só R$ 1 mil. Até em premiações de objetos as dos homens sempre vão ter mais itens." E continua: "Quando vão dar patrocínio, eles não dão para mulheres que têm que cuidar dos filhos e sangram todo mês. Dão para quem não tem esse tipo de problema", lamenta.
A bola vai rolando
Em meio aos recreios na escola, as gêmeas Nayeri e Nayara Albuquerque, 33, viram a oportunidade de jogar futebol, ainda crianças. O esporte, que era uma forma de lazer, virou paixão e se tornou a profissão de ambas as presidentes do clube Minas Brasília. Apesar de praticarem uma modalidade predominantemente masculina, as irmãs tiveram apoio da família para investir na carreira. "A gente sofre por ser mulher, mas, como nossa família nos blindou em relação a esse preconceito, continuamos", revela Nayeri.
Ela diz que os perrengues são parte da vida de quem faz essa escolha. "O futebol feminino ainda não é muito valorizado, mas está melhor do que antes." Ter de provar a cada dia a qualificação para presidir um clube é outro desafio. "Às vezes, a gente tem essa resistência, pelo fato de ser mulher, só que como temos um trabalho benfeito, consolidado, as pessoas conseguem nos respeitar mais em relação a isso", explica.
Muitas vezes, uma mulher tem que se esforçar em dobro para poder mostrar que é tão capaz quanto um homem. Durante a jornada, Nayeri fez cursos para se especializar. Para quem sonha em seguir a carreira de jogadora de futebol, ela deixa um recado: "Nunca desista do sonho, seja resiliente e nunca esqueça suas raízes".
Nádima Skeff, 32, foi atleta profissional, com passagem pela Seleção Brasileira Sub-20. Há 10 anos, é treinadora e auxiliar em clubes de futebol masculino e feminino. A caminhada não foi fácil. Dos 8 aos 15 anos, treinava praticamente todos os dias ao lado de meninos, mas, quando aconteciam jogos e campeonatos, só podia assistir. "Ao longo dos anos, a sociedade reconheceu que o futebol pode ser jogado por mulheres, mas a falta de calendário, estrutura, profissionalismo e suporte é problema até hoje", afirma.
Ao longo da carreira, Nádima viu muitas posições de liderança "intocáveis e impossíveis para mulheres", tanto no futebol feminino quanto no masculino. "Os processos seletivos para cursos de capacitação geralmente não são realistas para ex-jogadoras ou pelo próprio mercado, que tem a maior parte das portas fechadas para mulheres e que, às vezes, não será a capacitação o critério para oportunidades", diz.
Atualmente, a treinadora trabalha no clube Sfera, que é masculino e tem como diretrizes a diversidade e o respeito. "Tenho buscado estudar para 'educar' os outros a aceitarem a presença feminina, para que as portas estejam abertas a outras mulheres", ressalta.
O gosto da vitória
Após a pandemia, a professora de educação física Edileia Montes, 35, começou a treinar futevôlei na Escolinha do Aranhada, no Gama, que, na ocasião, abriu uma turma para mulheres. A principal conquista de Edileia veio no primeiro torneio do qual participou, na própria escolinha. "A minha categoria era iniciante. Competi acima, na misto intermediário. Fiquei em segundo lugar e foi um prazer, porque tinha cerca de um ano no futevôlei", recorda.
Para ela, o principal desafio foi escutar comentários preconceituosos e insinuações por parte de homens, enquanto ela estava nas quadras, como "mulher é mais sexo frágil", "a bola machuca e é difícil". Mas isso não a desanimou. "A gente rompeu o tabu, porque foi totalmente ao contrário, tanto que bombou em todos os lugares que têm futevôlei, e os clubes aderiram às turmas femininas", comemora.
A piloto de kart Ana Júlia Miranda, 18, teve suporte dos pais e do irmão para iniciar a carreira, aos 15, no motorsport. "No início, muitas pessoas duvidaram que eu conseguiria me manter e evoluir nesse esporte. Hoje, tenho bem mais apoio e me vejo crescendo como profissional", celebra.
Apesar de ter passado por "provas" de valor no início, Miranda conta que o esporte tem cada vez mais dado espaço para as mulheres crescerem nele. "Quando comecei, os campeonatos tinham normalmente entre duas a três mulheres e agora chega a quase 10. Ainda é pouco, comparado com o número de homens, mas está tendo muito incentivo para mais mulheres entrarem no automobilismo", diz.
A jovem faz parte da categoria F4 no kart, pela equipe Dibo Racing. Ana, que tem como maior meta viajar pelo país e alcançar novas categorias, confidencia: "Acho incrível o sentimento de estar na frente e correr no limite. Não vou mentir. Estar na frente dos homens e conseguir competir com eles tête-à-tête é bem gratificante", finaliza.