Com cerca de 3 mil pessoas vivendo em situação de rua no Distrito Federal, segundo levantamento realizado no ano passado pelo Instituto de Pesquisa e Estatística do Distrito Federal (IPE-DF/ Codeplan), os Centros de Referência Especializada para População em Situação de Rua (Centros Pop) são a principal opção para essa população carente que busca apoio em meio a tanta dificuldade. No entanto, após visita aos locais, na última segunda-feira, o Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios (MPDFT) recomendou a manutenção e a implantação de novas unidades para a Secretaria de Desenvolvimento Social do DF (Sedes-DF).
Através do Núcleo de Enfrentamento à Discriminação (NED) e das Promotorias de Justiça de Defesa dos Direitos Difusos (Proregs), o MPDFT apontou à pasta sobre a necessidade de adaptações, manutenções e reformas nas unidades já existentes, localizadas na Asa Sul e em Taguatinga Norte, regiões com a maior incidência de pessoas em situação de rua, além de enviarem um requerimento para a elaboração de um plano de ação para melhorar o serviço, em especial, no Centro Pop Brasília.
Morador em situação de rua há uma década, Natalício Lins, 57 anos, depende do apoio do Centro Pop da Asa Sul para se alimentar e fazer a higiene pessoal. No entanto, ele avalia que a qualidade da alimentação fornecida pelo local caiu bastante nos últimos anos. "Antes o café da manhã era nota 10, agora está nota 1", comenta. Além da comida, o morador conta que a estrutura dos banheiros também está comprometida. "Ficou fechado por dois dias, no fim de semana, porque alguns outros moradores quebraram vasos e pias. Sei que não é culpa deles (trabalhadores locais), mas essa atitude de terceiros atrapalham quem quer usar e precisa", pontua.
De muletas e com dificuldade para caminhar, Natalício sofreu um acidente após ter uma convulsão e perdeu parte da coordenação motora das pernas. Vindo de São Paulo para resolver um problema pessoal na capital do país, o morador vive em um barraco de lona nas grades do Centro Pop. "A situação da administração está muito precária", opina. Ele destaca que espera há anos uma vaga em um albergue, mas não apareceu a oportunidade ainda. "Pretendo ir embora daqui. Todo mundo quer uma vida melhor e ser bem tratado", conclui.
Segundo o núcleo e as promotorias, a instalação de novos Centros Pop na cidade, em especial na região central de Brasília, irá aliviar o atendimento da unidade da Asa Sul. De acordo com os membros do MPDFT, durante as visitas institucionais, foram ouvidos relatos sobre a ocorrência de curtos-circuitos nos quadros elétricos, além de observarem falhas nas estruturas dos prédios e mofo nos banheiros. Os promotores recomendam ainda que a Sedes-DF reestruture o Centro Pop Brasília e adote soluções resolutivas de conflitos para o gerenciamento da crise que envolve usuários e servidores.
Grávida de cinco meses, Daniela dos Santos, 37, conta que não tem torneira do chuveiro no banheiro feminino e isso dificulta na hora de abrir e fechar a ducha, além de o local estar em situação precária. "Só tem um chuveiro para todas as mulheres tomarem banho. É péssimo isso", destaca. Ela conta também que tem dificuldades em pegar o café da manhã e almoço para o marido Silvano Daora, 50, que ficou deficiente e anda de muletas por conta de uma queda de um pé de jaca.
Vindos de Salvador, na Bahia, para procurar familiares, o casal perdeu o contato dos parentes e ficou sem ter onde morar. "Não tivemos condições de voltar para a nossa cidade", diz Silvano. Há um ano vivendo nas ruas da capital, os dois desejam melhores condições para viver, ainda mais por conta da espera dos gêmeos. "Já vieram e levaram nossas cobertas, lençóis e até as roupas dos nenéns. Tentaram levar tudo ao desfazerem nosso barraco", pontua, acrescentando que alguns funcionários do centro e ONGs os ajudam com mantimentos.
Prazo
A Secretaria de Desenvolvimento Social tem 60 dias para informar ao Ministério Público sobre todas as medidas tomadas. A pasta informou que tomou conhecimento formalmente das recomendações, na terça-feira, e fará as análises técnicas para responder dentro do prazo estabelecido. "Cumpre esclarecer que as recomendações oriundas do MPDFT já estão de acordo com o planejamento de ampliação e melhoria dos serviços e das estruturas físicas das unidades desta secretaria", informa a nota enviada ao Correio.
Acolhendo a população de rua do DF, os Centros Pop oferecem atendimentos individuais e coletivos, oficinas, atividades de convívio e socialização. O local não funciona como abrigo. Nos centros, os moradores em situação de dificuldade podem guardar pertences, fazer a higiene pessoal, se alimentar com café da manhã, almoço e lanche, além de conseguir documentação. O espaço também orienta sobre os direitos e viabiliza o acesso a outros serviços, benefícios socioassistenciais e programas públicos. Nos centros, são atendidos jovens, adultos, idosos e famílias.