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Sono é essencial para desenvolvimento e sistema imunológico das crianças

Em entrevista ao CB Saúde, o neuropediatra Paulo Lobão, do Departamento Científico do Sono da Sociedade de Pediatria do DF, destacou a importância da qualidade de sono na infância e alertou sobre os riscos da exposição exagerada a dispositivos como celulares e tablets

João Carlos Silva*
postado em 31/03/2023 06:00
 (crédito:  Carlos Vieira/CB)
(crédito: Carlos Vieira/CB)

A importância do sono para o desenvolvimento da criança foi o tema do CB.Saúde — parceria entre Correio e TV Brasília — desta quinta-feira (30/3) com o neuropediatra Paulo Lobão, do Departamento Científico do Sono da Sociedade de Pediatria do Distrito Federal. Em entrevista à jornalista Carmen Souza, ele explicou que uma noite de sono adequada também é fundamental para o sistema imunológico infantil. O especialista orientou ainda sobre o que fazer para que as crianças durmam melhor, começando por ficarem longe de celulares e telas à noite e adotando uma rotina.

Crianças têm insônia também?

No geral, 25% a 30% das crianças vão ter alguma dificuldade relacionada ao sono. A insônia comportamental é um dos distúrbios mais prevalentes da infância. Ela está associada com dois fatores: a falta de limites — aquela criança que tem dificuldade para ir para a cama e fica relutando em iniciar toda a rotina de sono — e insônia por associação — a criança associa um fator para iniciar o sono, seja mamadeira, no decorrer da madrugada, ou algum objeto específico.

Esses dois casos principais estão atrelados ao comportamento dos pais ou à rotina em casa?

A maior mensagem para os pais é que rotina é fundamental para tudo, inclusive para o sono. A criança não nasceu aprendendo a dormir, então os comportamentos relacionados à manutenção do sono tem que ser instituídos em conjunto com a família.

Uma noite mal dormida tem um efeito a curto, médio e longo prazo para adultos e crianças. No caso dos pequenos, quais são as complicações mais comuns?

A curto prazo, uma criança fica mais irritada ou sonolenta, o que pode atrapalhar o processo de aprendizagem. A longo prazo, a gente pode ter problemas mais sérios, como o aumento da obesidade, o risco elevado de desenvolver hipertensão e diabetes, além de outros distúrbios e doenças crônicas ao longo da vida.

O crescimento da criança está relacionado à qualidade do sono?

O crescimento da criança depende de alguns fatores hormonais. Algumas dessas cascatas hormonais vão ser afetadas por um sono insuficiente e inadequado, em especial o hormônio do crescimento.

Como a qualidade do sono e o sistema imunológico estão relacionados?

Os distúrbios do sono estão relacionados com fatores de imunidade. Uma criança e um adulto que tenham privação de sono crônica estão mais sujeitos a ter infecções por terem uma redução no sistema imunológico.

Uma criança dormir bem é um comportamento preventivo para se defender de vírus sazonais?

Todo o período de março a junho nós temos o pico de vírus respiratórios, que podem trazer quadros gripais leves, mas, também, evoluir para quadros mais complicados, em especial a bronqueolite, que pode evoluir com falta de ar, com sintomas de insuficiência respiratória e que, muitas vezes, necessitam desse suporte. Ter uma noite de sono adequada é fundamental para ter o sistema imunológico funcionando bem, produzindo os anticorpos que ele precisa produzir. Então, é um dos fatores de prevenção.

Há um senso comum de que ronco é uma coisa de adulto, mas criança também ronca. Quais são os sinais de que o ronco pode ser algo mais grave?

Nesse caso, a gente entra em outro tema muito importante, que é a apneia obstrutiva do sono. A gente sempre tem a ideia de que ela é uma doença de adulto e, na verdade, ela se inicia na infância. Claro que a gente tem grupos de risco, como, por exemplo, as crianças com sobrepeso e com obesidade, as que têm alguma síndrome genética, como os pacientes com Down. Mas o que está intimamente relacionado à apneia do sono, além do ronco, é a obstrução nasal (aquela criança que faz um barulhinho enquanto dorme), aquela criança que, por algum motivo, apresenta sinal de cansaço, desconforto, enquanto dorme. A gente fica muito preocupado com o ronco, mas existem outros sinais indiretos que demonstram apneia obstrutiva e é fundamental reconhecê-los o quanto antes, para tratá-la, porque está intimamente ligada a prejuízos futuros — não somente no sistema respiratório, mas, também, no desenvolvimento de outros sistemas, assim como, também, a outros distúrbios do sono.

Que outros transtornos?

As parassonias estão intimamente ligadas às crianças com antecedentes de apneia obstrutiva. A criança com apneia obstrutiva não vai dormir bem, podendo desenvolver um quadro de insônia comportamental. E também favorece, dentro das parassonias, a enurese noturna, que é quando a criança, após 5 anos de idade, permanece fazendo xixi na cama.

Sobre as parassonias, que complicações são essas?

Parassonia é quando a criança apresenta algum fenômeno indesejado durante o sono e isso acaba levando a um despertar. As parassonias podem ocorrer em qualquer faixa etária, mas algumas delas são particularmente bem comuns em crianças, como o terror noturno, que, geralmente, ocorre na fase pré-escolar, dos 2 aos 5 anos. Na primeira metade da noite a criança acorda, acaba gritando e chorando, fica com o coração mais acelerado, os olhos bem abertos, fica sudoreica, o rosto vermelho. E, depois, volta a dormir, como se nada tivesse acontecido. Tem também o despertar confusional, em que a criança, geralmente, acorda com uma vocalização mais ineficaz, tende a não levantar da cama ou fazer algum ato motor mais complexo. E tem o sonambulismo, em que a criança pode se levantar da cama e fazer atos motores que podem até causar falta de segurança para ela própria e a família.

O uso de dispositivos eletrônicos à noite está relacionado a uma maior frequência ou intensidade dessas complicações?

Com toda certeza. Hoje, estamos vivendo a epidemia das telas. As crianças têm um excesso de telas, uma duração acima do que é recomendado tanto pela Sociedade Brasileira de Pediatria quanto pela Academia Americana de Pediatria. E, principalmente, esse uso excessivo no período noturno — então, a criança tem um acesso a uma iluminação mais clara, que impede que ela entre no processo de sono. A gente sabe que um dos fatores importantes relacionados ao sono é a produção da melatonina. A partir do momento em que ela recebe um estímulo luminoso muito intenso, isso impede a sua produção. Então, a criança tem uma tendência a postergar esse sono. As telas têm que ter um período reduzido. Para crianças menores de 2 anos é zero. Na faixa pré-escolar, uma hora de telas por dia. E na faixa etária escolar, duas horas por dia. E essas horas devem preferencialmente ser distribuídas ao longo do dia, evitando o período noturno.

Pensando em higiene do sono, o que fazer para que crianças durmam melhor?

De forma geral, a orientação é criar um ritual de sono. Jantar com a criança, levá-la para tomar um banho morno, fazer uma atividade calma como uma leitura. O ato de dormir deve ser um momento agradável. É importante criar um ambiente calmo, com o menor barulho e luminosidade reduzida, além de evitar que a criança vá dormir mamando. Nos primeiros meses de vida a criança ainda não tem regularidade de alimentação, mas dos 3 aos 6 meses de idade já se pode fazer o desmame no período noturno.

E levar o celular ou tablet para a cama?

Nem pensar, de jeito nenhum. Sem telas.

Tem um tempo médio, de acordo com a idade, que a criança precisa dormir?

Sim, inclusive tivemos a semana do sono, no final de março, e apareceu o tempo de sono para cada faixa etária. Ele vai reduzindo ao longo da vida. O bebê, quando nasce, dorme uma média de 18 horas por dia e vai reduzindo até chegar a 8 horas diárias, no período adulto. De 3 a 5 anos, a criança dorme, em média, de 10 a 12 horas por dia. Os mais velhos vão dormir uma média de 8 a 9 horas por dia.

*Estagiário sob supervisão de Malcia Afonso

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