Economia

Com baixa demanda e qualificação profissional, malharias do DF agonizam

Sem a confecção de uniformes dos alunos da rede pública de ensino, que passaram a ser produzidos em outros estados, e com dificuldades para encontrar mão de obra qualificada, o setor enfrenta queda no faturamento

Naum Giló
Isac Mascarenhas*
postado em 21/03/2023 06:00 / atualizado em 21/03/2023 17:38
 (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)
(crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)

O setor de vestuário gera 6,2 mil empregos diretos e indiretos na capital e é formado, majoritariamente, por micro e pequenas empresas. No entanto, a previsão é de que este ano sejam grandes as dificuldades, já que os uniformes das escolas da rede pública do Distrito Federal passaram a ser produzidos em outros estados.

Até o ano passado, microempresas locais vendiam para as associações de pais, alunos e mestres que, por sua vez, distribuíam aos estudantes. "São 3 milhões de peças que deixaram de ser produzidas aqui. Não temos expectativa de crescimento para este ano", lamenta Walquíria Pereira Aires, presidente do Sindicato das Indústrias do Vestuário (Sindiveste-DF).

De acordo com a representante sindical, 80% do faturamento das malharias do DF vêm da confecção de uniformes da Secretaria de Educação e a decisão de escolher confecções de fora para fazer as roupas vai acarretar em uma queda de 50% a 60% no faturamento de todo o setor de vestuário da capital. "Estamos fazendo uma pesquisa sobre mais de 200 melhorias para elaborar uma proposta ao GDF e trazer de volta pelo menos parte dessa produção", revela.

Entre os 7.582 empresários do setor, 89% são micro empreendedores individuais (MEI'S). Um deles é Sidney Graciano Felipe, que produzia uniformes para 65 escolas do DF. Fora do novo modelo de distribuição, ele prevê a falência. "Eu tinha 12 pessoas trabalhando, hoje eu só tenho três. Precisei mandar todas embora, minha empresa vai fechar", reclama.

O empresário acredita que faltou diálogo entre GDF e setor. "Se a Secretaria (de Educação) deixasse a gente vender as peças que estavam produzidas, não teríamos esse prejuízo que estamos tendo", diz Sidney, que deve jogar todo o estoque produzido no lixo.

Mão de obra

Fora do segmento de produção de uniformes, o de moda também agoniza. O sindicato informou que o ramo ainda amarga os efeitos da pandemia e que a venda não voltou aos patamares de 2019. "Além disso, o segmento tem maior participação de multimarcas de fora do DF", explica Walquíria.

A escassez de mão de obra é outro desafio enfrentado pelo setor. A costura é uma área dominada por mulheres, que precisam cuidar da casa e dos filhos, o que acaba afastando-as das oportunidades de emprego, segundo a avaliação da consultora do Sebrae e diretora da Escola Moda Brasil Verônica Goulart.

"É uma exclusividade delas [o cuidado da casa], também há falta de creche, como elas vão trabalhar? Muitas das mulheres, por falta de recursos econômicos e por violência doméstica, não conseguem sair de casa", analisa. De acordo com a especialista, mais de 60% da cadeia produtiva é formada por mulheres. Dessa fatia, mais da metade são mulheres pretas.

A escassez de pessoas qualificadas para trabalhar em confecção é um dos grandes desafios do estabelecimento gerenciado por Terezinha Pires Soares, 57, no Polo de Moda do Guará. Segundo a gestora, o proprietário do estabelecimento chegou a comprar um conjunto de maquinário moderno, que fica no subsolo do imóvel. "O dono daqui decidiu abrir uma fábrica em Jaraguá (GO). Com cerca de 30 empregados, lá funciona muito bem e os resultados são ótimos", diz a gerente.

A fábrica em Goiás produz as roupas que são transportadas para a loja no DF, onde são feitos os trabalhos de acabamento de pinturas e bordados. O estabelecimento trabalha com a confecção de uniformes. Entre os clientes estão empresas de transporte, hospitais, condomínios, construção civil e escolas. Terezinha atribui a ausência de mão de obra no DF à falta de disposição de parte dos trabalhadores da cidade. "São muitos benefícios concedidos pelo governo, o que faz com que muita gente não queira trabalhar", queixa-se.

Segundo a consultora do Sebrae Verônica Goulart, o governo de Goiás tem investido no setor, instalando centros de automação em pequenos municípios. Nessas fábricas, o corte da peça é feito com o mínimo de desperdício, o que barateou o processo. "O GDF deveria olhar para o setor e perceber a importância que ele tem. É sem dúvida um vetor de transformação social e econômico para o DF, principalmente para as mulheres", finaliza.

O que diz o GDF

A Secretaria de Educação do DF informou ao Correio que a licitação para a compra dos uniformes da rede pública foi feita na modalidade pregão. A nota diz que foram 28 lotes de contratação, sendo metade deles para participação exclusiva de pequenas e microempresas, dando oportunidade às empresas do DF.

"O Pregão foi amplamente divulgado no Diário Oficial do DF e no Diário Oficial da União e em jornais de grande circulação. As empresas vencedoras apresentaram os menores preços do Pregão e atenderam todos os requisitos classificatórios do certame", diz a nota. 

 

*Estagiário sob a supervisão de Márcia Machado

 

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