A imagem do homem branco de toga ou de terno e gravata está se diluindo no sistema de Justiça do Distrito Federal. O número de mulheres nesse espaço, ainda majoritariamente masculino, tem crescido. Entretanto, apesar dos avanços, juízas, promotoras, advogadas e servidoras do Judiciário e do Ministério Público se orgulham das conquistas e celebram o mês da mulher com expectativa de um futuro melhor para todas.
Logo que se formou em direito, a promotora de Justiça Fabiana Costa, 47 anos, sabia que queria ingressar no Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios (MPDFT), sonho realizado há 23 anos. Os estudos sobre gênero é uma marca na sua atuação e a Lei Maria da Penha, um marco. “É um instrumento jurídico no qual eu atuei durante anos. Fui promotora na defesa e na proteção das mulheres vítimas de violência doméstica quando essa lei foi implantada”, comenta. Para ela, as novas regras trazem conceitos e princípios que impactam o dia a dia das mulheres e também a consciência global de todas enquanto parte da sociedade.
Saiba Mais
Fabiana foi a primeira promotora a assumir o comando do MPDFT, em 2018. Antes, duas procuradoras ocuparam o cargo. “Acreditem no seu potencial, não desconfiem da sua capacidade de liderança, não tenham medo de ocupar lugares que são, tradicionalmente, comandados por homens”, pontua. Costa ressalta que juntas é possível mudar uma realidade. “Nós não estamos sozinhas, embora estejamos falando de uma história recente. Existem desafios a serem enfrentados, sem dúvida, mas vale a pena”, reforça.
Dedicação
Com 15 anos de carreira, a juíza Clarissa Masili, 36, é um exemplo de dedicação. A magistrada ingressou no quadro de servidores do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) na metade da graduação, em 2008. Passando por concursos exigentes, viu-se obrigada a conciliar as diversas áreas da vida e o objetivo de atuar na magistratura. “Tive de abrir mão de muitos momentos de lazer e de descanso, de convivência com a família e, no meu caso, de usufruir da juventude”, relembra.
Mas todo esse esforço valeu a pena também para todas as mulheres impactadas pela atuação de Clarissa, que se sente realizada ao final de cada caso. “Tomo, com muito cuidado, cada decisão em que podemos conferir maior segurança à integridade de mulheres e meninas, mas com a satisfação de saber que elas podem contar com o Poder Judiciário”, afirma.
Base da Justiça
Juízas e promotoras têm uma retaguarda composta por mulheres que contribuem para que realizem suas missões. Muitas técnicas, auxiliares e outras profissionais ajudam no bom andamento das atividades nos vários órgãos do sistema de Justiça. Entre elas, está Elenara Oliveira de Souza, que faz parte da equipe da Secretaria de Atendimento ao Jurisdicionado (SEAJ) do TJDFT, desde 1998. Com passagens por diversos setores do tribunal, revela que a entrada no Judiciário mudou sua vida. “Trabalho no atendimento ao público. Quando a gente faz o que ama, não sente o peso e supera os entraves do dia a dia”, relata.
Elenara confidencia que, em alguns momentos, foi difícil harmonizar o cuidado com a família e a rotina profissional, enquanto seus três filhos eram pequenos. “Nós, mulheres, ainda hoje, somos responsáveis por uma parcela maior de obrigações na vida familiar, que nos demanda mais tempo e dedicação. Porém, acho que, por isso mesmo, somos mais aguerridas. Todas as adversidades que passei me serviram de estímulo”, garante.
Persistência
Para a advogada especializada em direito e gênero Mariana Nery, 34, o 8 de março, Dia Internacional da Mulher, deve ser aproveitado para conscientizar a sociedade. “As mulheres têm o direito de viver todos os dias das suas vidas sem pressão social, sem a obrigação de estarem lindas e produzidas, sem machismo, sem desigualdade e, principalmente, sem medo de morrer”, destaca. Mariana diz que sua principal conquista foi ser respeitada pela profissional que é e pela autoridade que carrega consigo.
No entanto, ela ressalta que o machismo estrutural é um desafio que costuma passar despercebido. Está presente quando ela é ouvida no exercício do trabalho, ao estar em uma mesa repleta de homens. “Pior é ser taxada de grossa, por ser firme, ou bruta, por ser assertiva”, detalha. Além disso, Mariana avalia que a Justiça deve ser o refúgio das mulheres que sofrem violência. “Se a polícia, o Judiciário e as políticas públicas de proteção à vítima funcionassem, os números de feminicídio seriam bem menores”, avalia.
Mariana almeja que, efetivamente, as mulheres sejam respeitadas e reconhecidas. “Empoderamento significa que elas sabem o seu valor, entendem que são pessoas com sonhos, anseios, desejos e podem e devem correr atrás deles.” A advogada anseia que mais leis possam ser aprovadas, a fim de proteger as mulheres, e “que os agentes públicos misóginos e machistas sejam afastados e substituídos por pessoas que entendam o recorte de gênero e a perspectiva das mulheres”.
Com 35 anos de profissão, a advogada Ildecer Amorim, 61, também coleciona relatos de persistência. Com diversas passagens por cargos como presidente da Comissão de Direito do Consumidor da OAB, presidente do Procon/DF, assessoria parlamentar da Câmara Legislativa, entre outros, ela vê o impacto que pode causar na vida de outras mulheres. “A advocacia sempre me deu muito orgulho, sou apaixonada pela minha profissão e sei a sorte que tenho por isso, pois é um campo árduo como tantos outros, mas que nos permite exercer uma função social importantíssima na promoção da justiça”, analisa.
Apesar de gostar da área em que atua, Ildecer relata que nem sempre as coisas foram fáceis. Desafios surgiram pelo caminho, alguns deles ligados, unicamente, ao fato de ser mulher. “O preconceito de gênero acontece quando uma advogada é humilhada por um juiz em audiência; quando um colega tenta forçar um acordo injusto por duvidar de sua capacidade ou por achar que ela é jovem demais; quando é impedida de adentrar nas dependências do fórum pelo comprimento de sua roupa”, lamenta.
Ildecer acredita que a Justiça ainda precisa avançar a fim de que as mulheres se sintam seguras também no ambiente de trabalho e possam ocupar espaços a que têm direito. “As lutas das mulheres já trouxeram leis e podem trazer sua efetividade, podem remover barreiras sociais. O que resta é agir, continuar a luta e a disseminação da informação, e, assim esperar que um dia sejam cessados os preconceitos e as adversidades”, conclui.
*Estagiário sob a supervisão de Malcia Afonso.
Saiba Mais
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para contato. Clique aqui e mande o e-mail.
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.