A fauna do Distrito Federal sempre despertou nos candangos inspirações para diversas produções. Com Astral Melo, 63 anos, não é diferente. O fotógrafo está lançando, em parceria com a Gráfica Movimento, o livro-calendário Pássaros do Cerrado, com imagens das mais bonitas aves deste bioma. A obra também tem participação do artista visual e coordenador do laboratório de tipografia da Universidade (TipoLab/UnB), responsável pelo design de página.
Economista de formação, mas fotógrafo por paixão, Astral começou a se interessar pela área depois de uma viagem de férias, em 2005. Ao ver a paisagem de uma praia, resolveu tirar algumas fotos. Aquele foi o ponto de virada para uma grande história de produções. "Quando fui olhar as fotos, realmente, estavam boas. Passei a olhar diferente para isso. Tomei gosto pela coisa e não parei mais", relembrou.
Depois de perceber a própria habilidade, ele resolver investir no hobby. Com uma Canon Powershot SX60, o fotógrafo amador passou a desbravar o mundo das imagens, tomando como foco seu principal gosto: a natureza. "Resolvi trilhar esse caminho, porque gosto e acho que já tem muita foto de gente. Comecei a ver como é bonito um pássaro bem fotografado ou uma cachoeira", afirmou.
A busca por boas imagens ajuda o fotógrafo até mesmo a controlar a ansiedade. "Não sou o melhor exemplo de calma, mas esse tipo de coisa exige paciência. Tem uma foto que estou esperando há uma semana pelo momento certo. É uma forma de terapia e mais barata que comprar remédios", brincou.
Câmera na mão
Mesmo sem ter feito curso de fotografia, as fotos viraram tema de conversas de bar com grandes nomes da área que são amigos dele, como Luiz Clementino, Juan Pratginestos, Carlos Moura e Ivaldo Cavalcante. "A convivência e a conversa com esses grandes amigos me influenciou bastante, os admiro. Era muito curioso e sempre buscava informações com eles. Queria saber como faziam para ajustar a luz, enquadrar e tudo mais."
No entanto, Astral sempre manteve para si a ideia de que não importa o equipamento, e sim o olhar de quem aperta o botão da Câmera. "É uma espécie de dom mesmo. Você vê a foto antes de olhar para ela. Conheço gente que tem acesso a máquinas boas, mas que não consegue uma boa foto", comenta.
Mas ele não deixa de lado a importância de se ter os itens certos para conseguir capturar o momento ideal. Principalmente se o foco for animais, que se assustam facilmente. "Se você vê um pássaro numa determinada posição, tem uma fração de segundos para conseguir a foto. Se abaixar para trocar de lente, já perdeu o momento. Até porque eles também são muito sensíveis, podem se assustar com o barulho de disparo da máquina ou até mesmo com a presença dela apontando para eles", explicou.
O momento do clic
Por falar em pássaros, os animais-tema do calendário renderam momentos incríveis para Astral, os quais ele relembra com empolgação e carinho. Ele cita, por exemplo, o encontro com um grupo de Emas (Rhea americana) próximo a sua residência em Olhos d'Água (GO). "Estava passando de bicicleta e saltei um pouco antes de onde elas estavam para não assustá-las. Havia umas 10. É bem raro ver tantas juntas. Fiquei tão emocionado que até esqueci de mexer no foco", contou.
Outro momento que ele guarda na mente foi a presença de um Tucanuçu (Ramphastos toco) em uma árvore próxima à janela do quarto do fotógrafo. "Sempre que olho para ela me emociono. Essa foto nem tem edição. Do jeito que tirei passei para o computador. Vi ali que acertei a mão. Eles sempre aparecem por lá para derrubar algumas embaúbas e abacates", comentou.
Mas algumas fotos exigiram esforço intenso para capturar o momento certo. É o caso da Siriema (Cariama cristata), que, segundo o fotógrafo, corre ao menor sinal de perigo. "Ela fez pose. Me viu e ficou quieta. Isso é bem raro. Normalmente, fazem que nem o Papa-Léguas, do desenho, e correm. Chegam fácil em 50km/h, aí não tem quem pegue", disse.
A sorte de Astral para fazer os registros não acabou por aí. Ele também relembrou a fotografia de um Sanhaço-cinzento (Thraupis sayaca). A imagem da ave foi capturada no momento exato em que ela comia uma fruta. "É um pássaro raro. Peguei essa por acaso da janela da minha sala. Dei sorte, foi na hora exata em que ele se preparava para engolir", pontuou.
Preservação
No entanto, o fotógrafo se preocupa com o futuro desse tipo de imagem, já que espécies do Cerrado também estão sendo ameaçadas pelo avanço ilegal de alguns agricultores e pela caça ilegal das aves. "Vemos essa plantação exacerbada, que afasta os animais dos seus habitats. Veja a Curicaca, por exemplo, está vindo para a cidade, porque estão desmatando o campo", ressaltou.
O ex-economista aponta que é preciso parear a produção e proteção da fauna e flora nacionais. "Não sou contra o agronegócio. Só acho que existe uma equação, um equilíbrio e cuidado a serem tomados. Esse tipo de coisa pode acontecer sem que façamos a natureza ir embora. Talvez uma registro desses daqui a uns anos não seja mais possível", concluiu.
*Estagiário sob a supervisão de Márcia Machado