Jornal Correio Braziliense

Democracia

Após ataques de vandalismos, um olhar de pertencimento sobre a capital

Mesmo com os ataques antidemocráticos do último domingo, turistas e até moradores da capital foram ao centro da cidade para visitar os locais onde tudo ocorreu. Com olhos curiosos, observavam aos detalhes do dia em que as sedes do poderes foram destruídas

Ponto turístico importante e conhecido da capital federal, a Praça dos Três Poderes foi alvo de atos antidemocráticos há uma semana. O rastro de depredação depois do ocorrido ainda é visível para quem circula pelo Congresso Nacional, Supremo Tribunal Federal (STF) e Palácio do Planalto. O olhar de quem passa pelo local se volta para os fatos ocorridos e tenta abstrair os estragos causados ao projeto arquitetônico de Oscar Niemeyer, para ver a beleza do que ainda está ali. A história atrai os curiosos de vários lugares do país e até do mundo.

Vindo do interior de São Paulo para conhecer a capital do país com a família, o técnico de celulares Fernando Lima, 34 anos, ficou entristecido com as notícias que chegavam sobre a destruição dos prédios públicos. "É uma ignorância tremenda achar que as coisas se resolvem desta maneira. Havia presentes para o Brasil que tinham muitos anos e foram destruídos. É irreparável", comenta o visitante.

Professora e esposa de Fernando, Talitha Lima, 34, já conhecia a cidade e reparou que haviam mais grades cercando as sedes dos três poderes. Ela conta que a viagem já estava planejada antes do ocorrido e, apesar de todo o caos do domingo passado, a família não desistiu da visita ao quadradinho. "É muito triste. A gente tem medo de expor a nossa opinião política quando vê essas coisas acontecerem", destaca a paulista. A pedagoga comenta que o filho mais velho do casal, Bento, chorou muito ao ver as imagens da depredação. "Ele é apaixonado pela capital", disse.

O casal estava acompanhado da amiga e médica Liliam Fernandes, 25, que visitava a cidade pela primeira vez. Para ela, a experiência está sendo diferente ao levar em consideração os últimos fatos. "Dá uma tristeza olhar como ficou e um pouco de vergonha do que fizeram aqui", conta. Assim como a médica, Fernando ressalta que, em alguns momentos, fica envergonhado com o senso político que o brasileiro tem. "Não é algo real o que está acontecendo. Me parece que cada indivíduo vive a própria realidade e tiveram a chance de ter um comportamento de manada de forma irracional", completa o técnico.

Tirando fotos com a família ao passar pelo centro da capital, o motoboy Jessé Lima, 41, estava pela primeira vez na cidade. De Jaguaquara, na Bahia, ele veio passear com a mãe e visitar os filhos da vizinha que moram em Brasília. "No domingo, a gente ainda estava na Bahia e vimos a depredação que aconteceu aqui pela televisão. Estava um pânico. A gente ficou até receoso de vir, só que resolvemos manter a viagem assim mesmo", comenta o turista, que achou o movimento normal e, apesar dos resquícios de estragos deixados, estava gostando do passeio.

Empolgado ao conhecer os pilares dos três poderes do Brasil, o motoboy avalia negativamente o comportamento dos vândalos que depredaram parte da história. "Os prédios não têm nada a ver com a questão política do Brasil. Não precisam vir aqui quebrar. Isso é um lugar turístico e de trabalho. É um patrimônio do país", destaca Jessé, que acredita que muitas pessoas gostariam de vir conhecer a cidade pelas belezas arquitetônicas.

Morador de Águas Lindas de Goiás, Reginaldo Celestino, 45, estava indignado com o resultado dos estragos. "Isso não é justo para quem é patriota mesmo e honra a bandeira. É um patrimônio do país. Não é o correto, dá uma tristeza. Isso não poderia acontecer", comenta o trabalhador da área de construção civil. Para ele, a forma de resolver os problemas do país não é destruindo o que há de valioso e histórico. "A pessoa que perdeu a eleição, tem que se conformar. Não é porque é a esquerda ou direita, a gente tem que honrar o nosso país e o que tem nele. Somos todos brasileiros", ressalta.

Jornalista em uma rádio de Madrid, na Espanha, Miguel Suárez, 46, fotografava os prédios e ainda se chocava com tudo que ocorreu. Sem conhecer a cidade, o espanhol chegou na terça-feira, após o ocorrido, para cobrir os fatos. "É triste tudo isso que aconteceu", comenta. Miguel avalia que há dois pontos de destaque para os ataques terroristas. "Foi muito grave. A justiça está atuando para responsabilizar os envolvidos e prendê-los. Acho que a democracia brasileira mostrou um nível muito alto e os três poderes reagiram muito bem", pontua.

No segundo ponto, o comunicador espanhol comenta que viu uma falta de reação por parte da população em relação ao ataque à democracia ao conversar com as pessoas nas ruas. "Falam muito dos materiais e do patrimônio público, mas senti falta de algo mais firme por parte da sociedade, pois 'assaltaram' o Estado Democrático de Direito, não respeitaram as eleições limpas e um governo novo. Isso é muito mais importante que o estrago material", avalia Miguel.

Ataques

No último domingo, manifestantes bolsonaristas desceram o Eixo Monumental até a Praça dos Três Poderes e invadiram os prédios do Congresso Nacional, Supremo Tribunal Federal (STF) e Palácio do Planalto. Os ataques destruíram vidraças, móveis e até obras de artes nos edifícios, causando o caos no centro da capital. A Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) prendeu em flagrante no dia do atentado cerca de 300 pessoas. Na segunda-feira, manifestantes que estavam acampados em frente ao Quartel-General do Exército foram retirados do local e presos. De acordo com a Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seape), mais de 1 mil pessoas foram detidas no sistema prisional do DF.

Nesta semana, a ministra da Cultura, Margareth Menezes, divulgou um relatório preliminar com levantamento sobre os danos causados ao patrimônio público durante os ataques. Elaborado por técnicos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), o documento faz um detalhamento dos bens móveis e imóveis danificados e traz fotografias do que foi depredado durante as manifestações antidemocráticas. O trabalho de recuperação dos itens será feito em conjunto por vários órgãos federais e locais. Uma comissão foi criada para coordenar as ações.

O relatório indica que não há bens móveis nem imóveis que sejam irrecuperáveis entre as obras e o patrimônio danificados. No entanto, pelos danos causados, alguns podem exigir mais esforço que outros, como é o caso do relógio Balthazar Martinot, confeccionado pelo relojoeiro de Luís 14, uma peça do século 17, presente da corte francesa para Dom João VI. A Organização das Nações Unidas para a Ciência e a Cultura (Unesco) é uma das instituições que se prontificou a apoiar as ações de restauro e recuperação dos bens.

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Júlia Eleutério/CB/DA Press - Congresso Nacional cercado após os ataques antidemocráticos no último domingo praticados por terroristas
Júlia Eleutério/CB/DA Press - De São Paulo, Fernando e Talitha Lima, acompanhados pela amiga Liliam Fernandes, visitam Brasília
Júlia Eleutério/CB/DA Press - De São Paulo, Fernando e Talitha Lima, acompanhados pela amiga Liliam Fernandes, visitam Brasília
Júlia Eleutério/CB/DA Press - O jornalista espanhol Miguel Suárez veio a cidade cobrir os ataques
Júlia Eleutério/CB/DA Press - Morador de Águas Lindas de Goiás, Reinaldo Celestino foi até a Praça dos Três Poderes para olhar os estragos deixados nos ataques antidemocráticos de domingo (8/1)
Júlia Eleutério/CB/DA Press - Morador de Águas Lindas de Goiás, Reinaldo Celestino foi até a Praça dos Três Poderes para olhar os estragos deixados nos ataques antidemocráticos de domingo (8/1)
Júlia Eleutério/CB/DA Press - Congresso Nacional cercado após os ataques antidemocráticos de domingo (8/1)
Júlia Eleutério/CB/DA Press - O motoboy Jessé Lima veio visitar a capital e ficou receoso com a vinda após assistir as imagens dos ataques pela televisão
Júlia Eleutério/CB/DA Press - O motoboy Jessé Lima ficou preocupado ao ver a destruição
Júlia Eleutério/CB/DA Press - O motoboy Jessé Lima veio visitar a capital e ficou receoso com a vinda após assistir as imagens dos ataques pela televisão
Júlia Eleutério/CB/DA Press - Congresso Nacional cercado após os ataques antidemocráticos de domingo (8/1)