"Delicadeza urbana num ponto mágico", diz responsável pelo projeto do SESI Lab

Gustavo Penna é um arquiteto de Minas Gerais e foi responsável pela transformação do antigo Touring Clube do Brasil na sede do SESI Lab

Correio Braziliense

postado em 30/11/2022 06:00

(crédito: Iano Andrade / SESI)

O arquiteto mineiro Gustavo Penna tem uma ligação “quase visceral” com Brasília, e não é exagero. Filho do engenheiro Roberto Penna, um dos construtores do Catetinho, foi estagiário de Lucio Costa no IPHAN e amigo de Oscar Niemeyer. É membro do Conselho Curador da Fundação Oscar Niemeyer e algumas de suas obras, boa parte concentradas em Minas Gerais, receberam importantes prêmios internacionais. Penna é o autor da transformação do antigo Touring Clube do Brasil na sede do SESI Lab. Confira entrevista: 

Temos, no centro de Brasília, dois grandes arquitetos e urbanistas, Lucio Costa e Oscar Niemeyer. Como você se sente entrando para esse trio?

Conheci Lucio Costa quando fiz estágio no então Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico. Eu tinha 19 anos e ele era o coordenador do departamento onde eu estagiava. Lucio Costa me ensinou a olhar a arquitetura brasileira colonial. Tive grande contato com o mestre Oscar Niemeyer. E meu pai, Roberto Penna, construiu o Catetinho. Minha ligação com Brasília é quase visceral, faz parte da minha existência, do meu viver e do meu conjunto de significados e símbolos.

Você está no centro, no coração de Brasília…

O endereço disso aqui (SESI Lab) é um negócio louco, no cruzamento que Lucio Costa fez e começou Brasília a partir dessa cruz.

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Reformar, atuar num projeto já existente é mais complicado. Além de ser um projeto de Oscar Niemeyer, é um edifício tombado pelo Iphan. Como foi fazer esse projeto tendo todas essas referências?

Eu tiro o nome reforma porque reforma é como se você mantivesse as mesmas características e a mesma função. Nós aqui fizemos uma transformação, uma ressignificação, do prédio. O prédio tinha uma presença de lugar, sempre teve, mas nunca teve a função que ele tinha que ter tido na cidade, uma função de articulação cultural. O que mais me animou foi dar a esse prédio o valor que ele não tinha ainda demonstrado para Brasília. Nós estamos onde o povo está, como diz Milton Nascimento, e nós vamos trazer pra cá ciência, tecnologia, cultura, com a transferência do conhecimento de uma forma lúdica, no lugar símbolo de Brasília, por isso tem essa força emblemática, de paradigma de um novo modo de pensar. Um edifício de Oscar, feito na época da construção de Brasília, e que continua gerando valores para o futuro. O mestre Oscar, no Olimpo onde está, deve estar satisfeito de ver que um edifício dele teve uma sobrevida espetacular na cidade que ele tanto amou e pela qual ele tanto lutou.

Quais foram as suas preocupações na hora de juntar o passado com o futuro?

Primeiro, o prédio não poderia ser transformado naquilo que ele tem de fundante, que é a própria arquitetura do Oscar. (Ao longo do tempo) houve uma degradação, uma verdadeira desmaterialização, uma mutilação do prédio. O que nós fizemos foi limpar, limpar, limpar, arejar. O prédio não é mais obstáculo, é uma transição entre os espaços. Se você passa pelo Eixo Rodoviário (Eixão), hoje, você vê através do prédio, antes o prédio era um obstáculo. Agora ele passa a assumir uma nova missão na cidade. E trabalhar com o Exploratorium é o grande estímulo desse trabalho, uma instituição que, desde 1960, vem transferindo conhecimento para os jovens de maneira lúdica. Aqui será uma usina de ideias que teve a sorte de encontrar esse lugar, um ponto mágico no planeta.

Esse edifício (SESI Lab) pode ser um pontapé para uma transformação do centro de Brasília?

Alguma coisa vai acontecer, é uma coisa jovem, nova, não é nostalgia, não é reparação de erros passados. É o contrário, é dar uma significância muito importante para os tempos contemporâneos. Brasília tem a dimensão do simbólico. Essa não é uma obra, é uma doçura, no sentido de atitude gentil, é uma delicadeza urbana.