Frente ao estresse cotidiano, atividades que colaboram com a exteriorização dos sentimentos são aliadas da saúde mental. Pintura, dança e artes plásticas, como práticas regulares, transcendem a fruição artística e aumentam a qualidade de vida. Considerando que amanhã é o Dia Mundial da Saúde Mental, o Correio traz histórias de brasilienses que encontraram nas artes um caminho de autocuidado e equilíbrio emocional.
Psicóloga, dançarina e terapeuta corporal. Nartan Lemos, 52 anos, sempre foi apaixonada pela dança. Com o tempo e anos de psicologia, a profissional acabou percebendo a possibilidade de integração das duas práticas para a promoção da saúde mental. Em 2012, ela desenvolveu um método chamado Dança Vital, que reúne técnicas de dança e terapia, além de meditações ativas e passivas.
O projeto traz a arte como forma de acesso ao inconsciente para os participantes, em busca de mais espaços para a própria criatividade, expressão de sentimentos e combate ao adoecimento mental. "Através dessa externalização genuína, é possível evitar certas doenças de fundo emocional, como uma gastrite nervosa, uma enxaqueca crônica ou alguma dor", explica.
Por meio de cursos regulares e workshops, a arteterapia criada pela moradora da Asa Norte possibilita uma nova maneira de lidar com os obstáculos impostos pela vida. Com o desenvolvimento do trabalho, relatos positivos a motivam para continuar com o projeto.
"O sentimento que me traz é de gratidão, de satisfação, de ver as pessoas mais saudáveis e felizes com elas mesmas", diz. De viagens à Índia, até formações internacionais, a psicóloga conta que sempre se mantém atualizada sobre o tema, para levar o melhor das expressões corporais àqueles que precisam de uma vida melhor.
Na oficina Dança Vital, Vânia Vianna, 68, comenta que se encontrou nas várias expressões artísticas e corporais. "O que me tocou profundamente é conseguir ampliar minha consciência pessoal através dos movimentos, sentidos e minhas singularidades individuais", descreve. Incorporar a arte ao cotidiano trouxe um conceito novo de como viver para a moradora da Asa Norte. Na compreensão das danças, Vânia ressalta que o projeto foi uma oportunidade de sair de um momento de fragilidade física e psíquica para um lugar novo, com a liberdade da criação, dentro de um imaginário que ela nunca havia experienciado.
Arte e ansiedade
As tintas e as formas nos quadros de Jeff DuPrado, 41 anos, são a comunicação do universo não verbalizado. Nascido em Goiás e radicado em Brasília desde 2004, o artista conta que sua trajetória até a pintura foi um encontro de redenção. "Sem ela eu estaria perdido", assegura.
O processo de cura por meio da arte gerou uma série de obras intituladas Minha natureza, desenvolvidas durante a pandemia, em razão de um quadro de ansiedade. Autorretratos e momentos de tristeza, raiva e angústia compõem o acervo. "Esse trabalho foi uma autoanálise. Ele me revelou, me trouxe autoconhecimento, porque a emoção daquele momento era a ansiedade, e eu precisava reconhecer isso. Foi um desabafo", diz Jeff. Segundo ele, se não tivesse mergulhado no projeto, provavelmente teria continuado em aflição.
Hoje, ele admite que aprendeu a conviver e controlar a ansiedade. A úlcera estomacal, herança dos momentos mais agudos da pandemia, foi superada com cirurgia. No entanto, somente com a ajuda da arte Jeff conseguiu dar limite para o quadro. "Esse processo de ficar no ateliê criando obras me salva de perder a cabeça", conta.
Tempo de contemplação
Para a psicóloga Roberta Cunha, 27, além do processo criativo, o legado dos artistas pode servir de gatilho para reflexão e mudança de quem contempla as obras. Vendo o trabalho de Jeff, ela reflete sobre o poder da arte. "Isso diz muito sobre a saúde mental. Se você puder se expressar e ser você mesmo em algum lugar, isso favorece o seu estado psicológico", afirma.
Roberta, que precisou rever a própria rotina de saúde mental, comenta que se identificou com algumas obras e confessa que esse processo de espelhamento é reconfortante.
Para o artista Jeff, impressões como a de Roberta é que concluem o processo da obra. "Acredito que mais pessoas ainda precisam conhecer a série. O trabalho só fica completo com isso", afirma.
*Estagiário sob a supervisão de Juliana Oliveira