Eleições

"Nós vamos virar esse jogo aqui no DF", afirma o distrital Chico Vigilante

Eleito para o quinto mandato consecutivo, o petista falou sobre o desempenho da legenda e os próximos passos da campanha nacional do partido para o segundo turno da disputa presidencial, entre outros temas

Carlos Silva*
postado em 05/10/2022 06:00
 (crédito:  Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
(crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

Chico Vigilante (PT) foi o convidado do CB Poder — parceria entre Correio e TV Brasília. O deputado distrital foi eleito para o quinto mandato, com a segunda maior votação desta eleição e a terceira maior da história do Distrito Federal. Na entrevista concedida à jornalista Ana Maria Campos, nesta terça-feira (4/10), o petista falou sobre os próximos passos da campanha nacional do PT para o segundo turno da disputa presidencial. Ele também comentou sobre a necessidade da união da esquerda para alavancar a candidatura de Lula (PT). Entre outros temas, Vigilante também aproveitou para falar um pouco sobre o novo mandato dele, no qual pretende dar foco em bandeiras já defendidas como melhorias na saúde e transporte públicos, infraestrutura local. O distrital afirmou que, com a reeleição de Ibaneis, outro ponto será a oposição mais incisiva na Câmara Legislativa.

O senhor está no quinto mandato de deputado distrital. O que está programando para essa nova fase?

Eu tive mais que o dobro da votação da legislatura passada. É demonstração de que estamos no caminho certo e fazendo aquilo que a população do DF espera. Eu vou continuar com o mesmo foco que tinha antes, combatendo o cartel dos combustíveis, que ainda existe. Esse cartel precisa ser fiscalizado e vigiado a cada dia. Vou lutar para que tenhamos atendimento médico-hospitalar melhor. A saúde pública do DF está um caos. Basta verificar que o próprio governo divulga, que tem 27 mil pessoas esperando para fazer uma cirurgia. Agora imagina uma pessoa que está com câncer de estômago ou intestino na fila esperando uma cirurgia e não faz. Isso é uma verdadeira tortura.

E a situação do transporte público?

Outra questão que é muito cara é a do transporte público. Eu sei o que é andar de ônibus. Sei o que é estar cansado no ônibus para chegar em casa e ele quebrar no meio da estrada e, então, esperar outro ônibus mais cheio ainda. Temos uma licitação que foi feita. São cinco empresas que operam cinco bacias. Pelo contrato, as empresas teriam que trocar todos os ônibus até 28 de agosto deste ano. Era o último prazo. Duas empresas cumpriram integralmente, a Pioneira e a Piracicabana, que estão com ônibus novos. A Urbi está cumprindo a determinação (lentamente) e os ônibus novos estão chegando essa semana. A São José e a Marechal, que não cumpriram nada. E o governo do DF cometeu uma ilegalidade, que foi autorizar essas duas empresas a continuar rodando com essas latas velhas até o final do contrato. Fui ao Ministério Público, fui ao Tribunal de Contas (TCDF) também, porque eu quero o cumprimento da lei.

E a questão da mobilidade urbana?

Outra questão é que a população envelheceu e as cidades também ficaram velhas. Taguatinga, Ceilândia, Planaltina estão com todas as calçadas praticamente destruídas. Quando você é novo, pula por cima de tudo e não acontece nada. Já quando você chega numa certa idade, qualquer depressão na calçada é motivo de queda, e você pode quebrar o fêmur, perna, braço, etc. Portanto é preciso que o governo cuide das calçadas e recupere tudo.

São muitos problemas, mas a população do DF deu um voto de confiança para o governador Ibaneis Rocha e ele foi reeleito no primeiro turno. Por que o senhor acha que o Ibaneis conseguiu essa essa aprovação da população e o que que faltou para o Leandro Grass (PV) chegar no segundo turno?

Se cometemos erros na política, pagamos por eles. Teríamos de ter formado uma frente de centro-esquerda no DF. Do meu ponto de vista, incluiria PSB, PT, PCdoB, PV e PSol. Nessa frente também iríamos até o PSD, do Paulo Otávio. Se tivesse juntado todo mundo no primeiro turno, com um candidato a senador e com um candidato a governador, nós estaríamos no segundo turno e ganharíamos do Ibaneis. Infelizmente, não tivemos a capacidade de fazer isso. Ficamos nós, PT, PCdoB e PV numa candidatura arrumada de última hora, com um companheiro brilhante, que demonstrou efetivamente a capacidade que ele tem. Por pouco, não chegamos ao segundo turno, e Ibaneis fez tudo pra ganhar essa eleição no primeiro turno, porque ele sabia que no segundo turno é outro jogo, outro momento e, dificilmente, ele ganharia as eleições.

O senhor acha que se o PSB tivesse ficado numa aliança com o PT, PV e PCdoB teria sido mais vantajoso para os partidos?

Se tivesse feito essa aliança, estaríamos com três deputados federais, o Rollemberg (PSB), a Erika Kokay (PT) e Reginaldo Veras (PV). Acredito também que, nesse cenário, não teria tido a facilidade que Damares Alves (Republicanos) teve para ser eleita.

No começo dos debates, o PT tinha dois pré-candidatos ao governo do DF: Rosilene Corrêa (PT) e Geraldo Magela (PT). O senhor acha que se Rosilene ou Magela tivessem sido candidatos, o resultado teria sido diferente?

Não, Leandro desempenhou esse papel com brilhantismo. Eu andei por muitos pontos aqui do DF junto com ele. Senti um companheiro com garra, com vontade e com conhecimento. As pessoas estranharam um pouco a idade, porque ele é muito novo, e eu dizia que estaríamos junto com ele, para ganhar e governar juntos. Portanto, eu não tenho dúvida de que ele faria um grande mandato como governador do DF. Acho que nós erramos no início, quando o PT ficou batendo cabeça, se escolhia Magela ou Rosilene. Se isso tivesse sido decidido antes, acredito que a história escrita hoje seria outra.

Leandro teve dificuldade, por ser uma pessoa relativamente desconhecida para o eleitorado. A campanha dele demorou a deslanchar justamente por esse motivo, o senhor não acha?

Foi uma campanha sem dinheiro, sem estrutura, sem recurso e com pouca gente. Eu me dediquei o tanto que eu pude, porque sabia da importância de colocar o Leandro no segundo turno. Ele era novidade da política e, infelizmente, não conseguiu chegar em todos os pontos do DF. Certamente, se ele tivesse chegado a cada cantinho do DF, hoje, a história seria outra. Mas é importante ficar pontuado aqui que os três deputados mais votados da Câmara Legislativa do DF hoje são de esquerda. Sou eu o Max Maciel (PSol) e o meu amigo meu companheiro de bloco Fábio Félix (PSol).

Na Câmara Legislativa, os três primeiros colocados são da esquerda, é um foco de resistência ali na Câmara Legislativa frente a esse poder do presidente Bolsonaro?

É uma demonstração de que escolhemos bem. Sem querer me auto-elogiar, pois não é do meu feitio, mas eu, o Fábio e o Max foram boas escolhas para a Câmara Legislativa. Se você pegar também o mapa de apuração, nós verificamos que a esquerda está se recuperando no DF a partir do Plano Piloto. Só verificar a votação que o Lula teve nas Asa Sul e Norte e vemos que a esquerda está se recuperando aqui no DF o que é altamente positivo. Mas tem um problema que a esquerda precisa superar. O Agnelo Queiroz (PT) fez um excelente governo aqui no DF. Porém, ele não se comunicou. Foi o governo que mais construiu escolas, que teve a coragem de fazer a licitação dos ônibus, que construiu UPAs, deu reajuste para todas as categorias de servidores e foi o governo que deu 68% de aumento salarial para a Polícia Militar do DF (PMDF). No ato assinado ali no ginásio de esportes. Portanto, essa cidade não tem porque ser bolsonarista. O Bolsonaro não fez nada por Brasília. As obras que o Ibaneis está fazendo agora, dizendo que é obra do Bolsonaro são todas obra do PAC 2, da presidenta Dilma, que é do Partido dos Trabalhadores. Agora que ele está iniciando obras já iniciadas pelo Agnelo, como o BR Transporte Norte e BR Transporte Oeste, que são todas obras com recursos alocados do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), do Banco do Brasil e da Caixa Econômica. Só que, como dizia o velho Chacrinha, "quem não comunica se trumbica". Nós não nos comunicamos e perdemos a narrativa da história.

Na segunda-feira, houve reunião dos partidos da base do ex-presidente Lula em Brasília para pensar uma estratégia de campanha nessas quatro semanas para o segundo turno. Você vai se engajar nessa campanha? Dá para virar?

Nós vamos virar esse jogo aqui no DF. Estou entrando de corpo e alma nessa campanha e vamos fazer com que o Lula seja o mais votado no DF. Mas, eu não quero só isso. No encerramento da contagem dos votos, nós estávamos com o trio elétrico ali na Torre de TV. No meu pronunciamento, chamei à responsabilidade os partidos que compõem a Federação PT, PCdoB e PV, mas eu estou chamando os demais. Estou dizendo que está na hora de termos capacidade de sentar em torno de uma mesa, elaborar um projeto para o DF, pensando nas próximas eleições, daqui a quatro anos. Assim, precisamos focar nesses quatro anos, para que, quando chegar o período das eleições, tenhamos uma chapa forte para disputar o governo do DF, para disputar o Senado e para ter uma boa bancada de deputados federais. Não dá para ficar cada um para um canto, muitas vezes um falando mal do outro, aí quando chega perto das eleições quer se juntar, e achar que isso vai dar liga, não vai.

O futuro do PT no DF depende também, em parte, do resultado da votação presidencial. Com Lula presidente, a possibilidade de fortalecimento do PT em Brasília também é maior?

Não é só o futuro do PT que está em jogo. O que está em jogo é o futuro da democracia neste país. É se nós queremos um país eminentemente democrático, com avanços sociais, com respeito às minorias, aos negros, que trate da questão racial, da homofobia, do racismo, da matança de índios, entre outros. É se nós vamos continuar sendo uma nação do ocidente eminente democrática ou se seremos uma teocracia da família Bolsonaro. Isso é que está em jogo no dia 30/10. Está muito parecido com o final da ditadura militar, em que para derrubá-la, unimos de Tancredo Neves a Luiz Inácio Lula da Silva, passando por Leonel Brizola. Todo mundo deu as mãos. Portanto, é preciso que as pessoas hoje tenham dimensão do momento grave que vivemos, da importância de virar o jogo. Pode votar no Lula e no outro dia fazer oposição, mas vai fazer oposição na democracia e não em um governo antidemocrático e ditatorial, que o governo Bolsonaro. E isso não acontece só no Brasil. Na Turquia aconteceu a mesma coisa. São pessoas que se elegem pelo voto popular e depois corroem e destroem a democracia por dentro das instituições. Imagina o Bolsonaro com a maioria do Supremo Tribunal Federal (STF), com maioria no Congresso, aumentando o número de ministros para que ele possa mandar efetivamente no supremo, nomeando a maioria dos ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), nomeando maioria de juízes bolsonaristas nos tribunais regionais e federais. É o fim da democracia nesse país. É a democracia ou barbárie, aí você escolhe.

Mas nas urnas, o recado do eleitor é de uma aprovação grande ao presidente Bolsonaro. Embora ele tenha seis milhões de votos atrás do ex-presidente Lula, vários integrantes do governo dele foram eleitos. Como é que você vê essas quatro semanas pela frente?

Nós estamos crescendo e vamos virar ainda mais esse jogo, porque a população do Brasil, na sua maioria, é eminentemente democrática. Ela quer a democracia ela sabe que a única maneira da classe trabalhadora das mulheres, dos negros e indígenas ganharem alguma coisa é numa democracia. Nós já experimentamos a ditadura e sabemos que, como dizia o saudoso deputado Ulysses Guimarães: "Temos que ter nojo da ditadura". É por isso que temos ir para as ruas eleger o Lula, porque nós temos nojo da ditadura. Isso me encoraja ainda mais a lutar para que este país não caia na mão de um ditador, de um homem que defende a tortura, que a cada momento cria uma crise. Agora fica dando uma de bonzinho. Porque ele viu que está perdendo e vai perder as eleições, fica fingindo que se reconciliou e respeita as regras, porque ele é um ator.

Independentemente do resultado das urnas no dia 30 de outubro, haverá um país polarizado. Como vai ser um governo Lula num cenário de uma polarização tão grande e com o bolsonarismo forte?

Vai ser necessariamente de reconciliação nacional. O Lula vai entrar com toda a humildade que é peculiar a ele, conversando com o Supremo, com segmentos religiosos, com os segmentos de mulheres — inclusive dando poder às mulheres —, com o empresariado, que é importante para o crescimento desse país. Mas, acima de tudo, combatendo a fome e fazendo com que as pessoas voltem a comer, e não entrar nesse jogo que interessa ao bolsonarismo, que é o tal dos costumes. Eles ficam sempre falando de aborto. Questão de aborto no Brasil está resolvido desde 1943. Não tem mais porquê se falar de questão de aborto. Neste país, o que está em questão são 33 milhões de pessoas que estão passando fome. São 100 milhões que estão em insegurança alimentar. São milhões que não têm emprego decente, nem carteira assinada. Não venha me dizer que a ocupação informal, sem pagar previdência, é emprego, porque isso não é emprego. Emprego é com carteira assinada, emprego é formalizado, é contribuindo para a previdência. Isso é emprego e é isso que nós vamos voltar a gerar no Brasil.

Como vai ser seu papel na oposição na Câmara Legislativa?

Na eleição passada, dei 120 dias a ele. Agora não vou dar nenhum dia, porque ele já é governador e conhece direitinho. Portanto, tudo que for projeto bom pra Brasília, vou apoiar sem pedir nada ao governador Ibaneis Rocha. Tudo que for projeto que não presta para a cidade, nós vamos lutar muito pra corrigir. Não tem um projeto que passe por aquela Câmara que não tenha pela nossa discussão, pela nossa análise. E quero dizer também aqui ao governador Ibaneis: "Não tente vender o BRB e não tente privatizar a Caesb, porque para mim são coisas inegociáveis". E, governador, vamos recuperar a Rodoviária do Plano Piloto em vez de entregá-la para a iniciativa privada. Cuide ao menos de arrumar os banheiros, elevadores e as escadas. Lá já foi um lugar bonito, um lugar bom, onde podíamos passear, e hoje, não podemos nem usar o banheiro. Governador, pense melhor na Ceilândia, que mostrou não estar satisfeita com o que o senhor fez com ela nos últimos quatro anos.

*Estagiário sob a supervisão de José Carlos Vieira

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