ELEIÇÕES 2022

Cresce o percentual de candidatos das forças de segurança pelo DF

Número de postulantes a cargos eletivos vinculados às forças de Estado aumenta proporcionalmente desde 2014, no DF. Pautas defendidas por esses nomes têm mais relação com reivindicação por direitos das próprias categorias do que com políticas públicas

Dos 860 nomes que disputarão estas eleições pelo Distrito Federal, 85 fazem ou fizeram parte dos quadros das forças de segurança. Por categoria profissional, esse é o segundo grupo com mais candidatos, atrás apenas dos empresários (111). O total inclui policiais e bombeiros militares — da ativa e reformados —, integrantes das Forças Armadas e policiais civis (leia Corrida eleitoral). O grupo representa cerca de 10% das candidaturas, segundo levantamento do Correio, com base nas informações de registro dos postulantes junto à Justiça Eleitoral.

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Na comparação com os números absolutos das eleições de 2018, houve queda na quantidade desses candidatos. No entanto, em termos proporcionais, a porcentagem deles em relação ao total cresce desde 2014. Doutor em ciência política e especialista em comportamento eleitoral, Leonardo Barreto afirma que a formação de uma "bancada" com integrantes da segurança pública se tornou tradição na política do DF. "Fiz uma pesquisa à época do doutorado, e, até 2010, se essas forças fossem um partido, ele seria a segunda maior legenda de Brasília em número de deputados, atrás apenas do PT naquele ano", comenta.

Apesar da força histórica na capital do país, esse grupo não deve se fortalecer nas eleições deste ano, acredita o especialista: "Esse discurso foi bem mais forte em 2018, com toda a narrativa do Bolsonaro. Foi curioso porque houve uma espécie de efeito manada. E, agora, o pessoal tenta aproveitar uma onda que, em minha opinião, passou".

O cientista político acrescenta que a grande quantidade de postulantes dessas categorias não seja algo necessariamente benéfico para as corporações. "A PM (Polícia Militar), por exemplo, embora seja (um grupo) maior, elegia pouca gente, por causa do excesso de candidatos, pois os votos ficavam divididos. Isso foi diferente em 2018, porque Bolsonaro trouxe a questão da segurança pública, então esses políticos receberam votos de fora das corporações. Não acho que isso vá se repetir. Mesmo os eleitos no último pleito terão muito custo para se reeleger, porque, em geral, são pessoas com pouca experiência (na política). Muitos entraram na disputa com base nessa esperança (de se eleger pela relação com as forças de segurança), mas acho que o efeito será de dividir ainda mais as corporações", pondera Leonardo Barreto.

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Corporativismo

Em 2018, dos 24 distritais eleitos pelo DF, cinco estavam ligados às forças de segurança. Neste ano, mais da metade dos candidatos dessa parcela (54) concorrem a uma cadeira na Câmara Legislativa, seguidos pelos 27 que tentam chegar ao cargo de deputado federal. Para Senado e Palácio do Buriti, há apenas um nome da categoria na briga pelas duas vagas — ambos de policiais militares. 

O Correio ouviu alguns desses postulantes e, entre as principais bandeiras, estão o reajuste salarial das forças de segurança, por meio da equiparação dos ganhos com a Polícia Federal, e o fortalecimento de políticas educacionais para conter o avanço da criminalidade entre jovens. A reestruturação das carreiras policiais foi um dos temas debatidos na campanha eleitoral de 2018, e a tendência deve se manter na corrida deste ano, inclusive entre os que tentam se eleger para o governo local.

Nas últimas eleições, o candidato Ibaneis Rocha (MDB) prometeu a equiparação salarial, o que acabou sem sair do papel. Outro ponto levantado pelos postulantes das forças de segurança neste ano, o alinhamento dessa área com a educação, também não é novidade: em 2019, o atual governador implementou um sistema de militarização das escolas públicas do DF. Hoje, a rede tem 12 colégios com  gestão dividida entre as secretarias de Educação e de Segurança Pública, além de quatro das duas pastas com o Ministério da Educação.

Professor de antropologia do direito da Universidade de Brasília (UnB) e pesquisador do Núcleo de Estudos sobre Violência e Segurança e do Grupo Candango de Criminologia, ambos vinculados à instituição de ensino superior, Welliton Caixeta Maciel se diz cético em relação às políticas de associação das duas áreas. "Ações de enfrentamento a esses problemas (da criminalidade entre jovens) vinham sendo feitas mesmo sem a presença de policiais e de militares na política partidária ou em cargos eletivos. Pela própria natureza interdisciplinar da resolução, ela independe da polícia e das Forças Armadas. Uma pauta que não vingou foi a militarização das escolas públicas", defende.

Outras bandeiras levantadas frequentemente pelos candidatos das forças de segurança são a defesa das instituições às quais estão associados. As pautas incluem, além do reajuste salarial e da reestruturação de carreiras, a valorização dos profissionais, com melhorias das condições e dos fluxos de trabalho. Os sete candidatos ouvidos pelo Correio citaram a agenda corporativa como prioridade, mesmo os que enumeraram políticas públicas, como o fim dos "saidões" de presos e o endurecimento de penas para crimes de violência doméstica.

O foco nas corporações, contudo, chama a atenção de Welliton Caixeta Maciel. "O fato de, em 2022, os registros de candidaturas das forças de segurança superarem proporcionalmente os números das últimas eleições é uma evidência da disposição política desses atores, mesmo reformados, em não largar a arena política, visando defender e emplacar interesses de classe com chancela de parte da população. Mostra também que eles não pretendem deixar os direitos e as regalias conquistadas", observa o professor e pesquisador.

Cenário nacional

A defesa das pautas ligadas à segurança pública ultrapassa candidatos das forças de segurança. Nos últimos três anos, os representantes do Distrito Federal no Congresso Nacional têm se alinhado a essas carreiras. O foco, contudo, não tem sido, especificamente, aperfeiçoar a função do Estado em prover segurança para os cidadãos, mas a capacidade individual de defesa de cada um.

Advogado e assessor em advocacy — defesa de causas —, Bruno Renato Teixeira avalia: "O que observamos na Comissão de Segurança Pública da Câmara dos Deputados é que boa parte dos parlamentares do DF compõe a base do governo (federal); por isso, está alinhada com as pautas de armamento da população. São deputados que têm a mesma compreensão da agenda proposta pela chamada 'Bancada da Bala', que faz parte da sustentação do governo Bolsonaro e defende a facilitação do acesso da população a armas e munições".

Apesar disso, nenhum dos oito eleitos pelo DF para a Câmara dos Deputados integra as forças de segurança atualmente: dois são advogados, três são empresários, um professor, uma administradora e uma bancária. No Senado, há um jornalista e economista; um contador e professor; e uma ex-atleta.

*Estagiário sob supervisão de Jéssica Eufrásio