Fui ver a exposição Arte de transformação, de Mila Petrillo, com 127 fotos de 30 dos mais de 100 projetos de educação espalhados por diversos pontos do país, e saí com uma sensação de ter uma experiência lisérgica, tamanho o êxtase que provocam. Mas tive o privilégio de acompanhar uma parte pequena das sessões de fotos que resultaram na mostra e posso assegurar que nada têm a ver com aditivos químicos. O que está em jogo é a potência transformadora e transfiguradora da arte.
Alguém já disse, com muita perspicácia e senso de humor: existe o Sebastião Salgado e a Mila doce. A brincadeira com o fotógrafo internacionalmente famoso pode ser esclarecedora. Enquanto ele opta por uma abordagem crua para denunciar as mazelas sociais, como se fosse um Graciliano Ramos com uma câmara na mão, fotografando a palo seco, em preto e branco, Mila fica de tocaia para captar o instante fugaz de eternidade, como se fosse uma pintora da luz.
Ela encontrou nos projetos de arte-educação os temas e os personagens ideais para expressar a sua sensibilidade amorosa, terna, maternal e mística. Esse movimento viveu o ápice nas décadas de 1980 e 1990, mas resiste até hoje. São as únicas instituições que retiram as crianças e os adolescentes da rota da violência, do tráfico de drogas e do tráfico de asneiras midiáticas e virtuais.
É um dos absurdos que o Brasil ostente os piores índices de educação e, ao mesmo tempo, tenha forjado algumas das experiências mais inovadoras de arte-educação no mundo. Entre outros, que figuram na mostra, é possível destacar os projetos Axé, Cria, Edisca, Balé de Rua, Tapera das Artes e a Cia Étnica de Dança. Em vez de armas, as crianças e os adolescentes portam violões, violinos, flautas, tambores ou movimentos alados de dança.
Armada de radares poderosos de sensibilidade, Mila não faz fotos de teatro, de dança ou de música; ela faz teatro, dança e música com fotos. Capta a alma dos personagens e das cenas com a técnica e o coração.
Flagra, a seco, na fisionomia do rosto, o átimo desvelador do estado de espírito do personagem. As imagens das cenas teatrais dançam como uma pintura em movimento. E o movimento da dança ganha um ritmo de música para os olhos. Como pinturas impressionistas, os corpos se desintegram nas cores e ganham a leveza da luz.
A Galeria Marcantônio Villaça é um espaço que precisa ser descoberto e apropriado pelos brasilienses. É um ótimo programa para toda a família. Oferece uma estrutura muito boa para os artistas e para os visitantes. A montagem do curador Bené Fontelles não modificou, mas potencializou as imagens, inventando narrativas, ângulos, perspectivas, transparências e luzes. É como se nos emprestasse novos olhos para ver as fotos da Mila.
Fomos recebidos pelo mediador Marcelo, que apresenta a mostra com conhecimento de causa, fervor pela arte e elegância. Além disso, leve as crianças, pois elas poderão fazer atividades lúdicas em espaço especialmente preparado, sob a coordenação de um arte-educador. Nestes tempos turvos, recomendo, vivamente, ver a exposição da Mila para lavar a alma com a beleza e sentir a força transfiguradora da arte. Como disse Jorge Luis Borges, a arte é um pequeno milagre.
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