Segurança

Usuários da Rodoviária convivem com rotina de violência e falta de estrutura

O terminal é um dos pontos de maior circulação de pessoas na região central de Brasília. Porém, o local, que deveria oferecer segurança para os cidadãos, tornou-se fonte de preocupação para comerciantes e usuários

Carlos Silva*
postado em 07/08/2022 06:00
 (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)
(crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)

A madrugada de ontem foi marcada pela violência em pleno coração de Brasília. Por volta de 1h, um homem de 34 anos foi esfaqueado no pescoço e na mão direita, no banheiro do mezanino da plataforma superior da Rodoviária do Plano Piloto. Ele foi encontrado pelo Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal (CBMDF) e levado em estado grave para o Hospital de Base, após receber o primeiro atendimento dos socorristas no local. Ele estava com sangramento no pescoço e um corte profundo na mão direita. Os bombeiros não souberam informar os motivos da agressão. Ao Correio, a Polícia Civil do Distrito Federal informou que trata o caso como tentativa de latrocínio. O celular da vítima foi roubado pelo agressor. A 5ª Delegacia de Polícia (Setor de Grandes Áreas Norte) investiga o crime.

Infelizmente, os episódios de violência são recorrentes na rodoviária central. Em maio, uma mulher foi presa após esfaquear o braço de outra e, em fevereiro, um homem foi preso depois que atingiu com golpes de faca uma pessoa. Ele tentou esconder a arma dentro de uma caixa de engraxate. 

Usuários ouvidos pelo Correio contam que a rotina no principal terminal de transporte coletivo do Distrito Federal se resume ao medo. A Rodoviária do Plano Piloto recebe diariamente cerca de 800 mil pessoas, como a empregada doméstica Maria do Carmo do Rosário, 58 anos, vai à rodoviária pelo menos três vezes por semana, a caminho do trabalho. Ela conta que foi vítima de bandidos enquanto esperava o ônibus na volta para casa. "Já fui furtada duas vezes em paradas por aqui. Enquanto entrava no transporte, conseguiram abrir minha bolsa e levar meu celular. Já vi alguns assaltos com arma aqui e fico com medo de aumentar a violência nas abordagens", desabafa.

O engenheiro Wendel Farias, 42, morador de Uberlândia, Minas Gerais, fez uma parada em Brasília, no retorno para a cidade natal, depois de uma viagem a Lençóis Maranhenses (MA). Quando aguardava transporte na plataforma superior, teve sua bagagem furtada. "Me virei um pouco e passaram a mão na minha mala. Por sorte, não tinha nenhum documento meu lá, mas fiquei sem nenhuma peça de roupa", relembra, indignado.

O engenheiro rememora que, mesmo prestando queixa, não recebeu atenção. "Tentei atendimento naquela estação da Polícia Militar da plataforma inferior. Pedi para olharem as câmeras, porque, talvez, vissem quem foi, mas disseram que não podiam fazer nada, que as câmeras não cobriam toda a área da rodoviária". Da experiência de estar brevemente na capital, Wendel só guarda uma certeza. "Não sinto vontade de voltar novamente", conclui.

Conviver com o crime

Além dos que circulam diariamente pelo terminal para ir e vir, há aqueles que lá tiram o sustento da família. Delci Almeida, 55, dono de uma mercearia, está há 40 anos estabelecido no local. Ele relata a falta de segurança presenciada nesse período. "Por aqui passa a população de uma cidade. Então, deveria haver policiamento regular. Se surgir algum caso de violência, não temos a quem recorrer. Em pleno dia vemos bandidos andando atrás das pessoas, abrindo bolsas para roubar", denuncia.

Os comerciantes dividem espaço com aqueles que praticam crimes. Nesse cenário, a intimidação e o receio de perseguições faz com que muitos donos de estabelecimentos não queiram falar sobre o que vivenciam. Mesmo Delci, que aceitou conversar com o Correio, não ousa ir muito longe. "Estamos num local tão vulnerável que não temos nem condições de reagir, porque ficamos marcados. Não temos poder de reação, pois pode se tornar pior. Eles estão aqui todos os dias", protesta.

Infraestrutura

Outro problema encontrado foi nos banheiros. Além da grande quantidade de água no chão, a maior parte das cabines estava sem portas e havia mictórios estragados. Alguns foram arrancados das paredes. Em um dos banheiros da plataforma superior, somente duas das oito lâmpadas funcionavam. No escuro, transeuntes se arriscavam a assaltos e acidentes com os pés afundados em água e sem sequer torneiras e sabonete para lavar as mãos.

"É perigoso até ir ao banheiro. Dependendo do horário você pode ver pessoas usando drogas e fazendo outras coisas. Pra não correr mais risco, só fingimos que não vemos na hora e saímos do local, mas qualquer um que passe aqui pode ver o que acontece", disse um comerciante, que preferiu não se identificar.

Segurança

O Governo do Distrito Federal (GDF) informou ao Correio que foi realizada uma ação integrada entre os órgãos responsáveis pela segurança na rodoviária, dos dias 13 a 15 de julho. Entre as iniciativas tomadas, foi realizada uma força-tarefa para o cumprimento de mandados de prisão em aberto e para prender foragidos da justiça. Também foram realizados fiscalização de comércios e combate ao tráfico de drogas, roubos e furtos.

"Ressaltamos que a localidade possui muitos moradores em situação de rua e usuários de drogas, sendo um problema que extrapola a esfera da segurança pública. A PMDF flagra diversos crimes e efetua prisões e apreensões, porém, os mesmos criminosos estão de volta às ruas rapidamente", destacou a nota.

O Correio esteve na Rodoviária entre os dias 29 de julho e 2 de agosto. Na data mais recente, depois dos questionamentos feitos ao GDF, a reportagem encontrou a segurança mais reforçada no terminal.

*Estagiário sob a supervisão de Malcia Afonso

 

 

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