Neste momento conturbado da vida brasileira, esta coluna conseguiu uma entrevista mediúnica exclusiva com a Clarice Lispector. Fala, musa!
Clarice, escrever é destino?
Há três coisas para as quais eu nasci e para as quais eu dou minha vida. Nasci para amar os outros, nasci para escrever e nasci para criar meus filhos. Escrever é também abençoar uma vida que não foi abençoada.
Qual o lugar do amor em sua vida?
Amar os outros é a única salvação individual que conheço: ninguém estará perdido se der amor e, às vezes, receber amor em troca.
Você se considera uma
pessoa afirmadora?
Tudo no mundo começou com um sim. Uma molécula disse sim a outra molécula e nasceu a vida.
Você passou a imagem de ser uma uma mulher complicada. Isso é verdade?
Sou complicada? Não, eu sou simples como Bach.
Você foi feliz?
Ser feliz é para conseguir o quê? É para conseguir um final feliz? Só concebo uma felicidade inesperada, uma felicidade do instante, uma felicidade clandestina.
Por que você gostava tanto de bichos?
Somente quem teme a própria animalidade não gosta de bichos. Talvez seja porque sou de sagitário, metade bicho.
Você é uma mulher delicada, os seus dedos são frágeis. De onde vem a sua força?
Minha força está na suavidade de meus dedos frágeis e delicados. Não tenho medo nem das chuvas tempestivas nem de grandes ventanias soltas, pois sou o escuro da noite.
Você foi considerada
uma pessoa alienada.
Isso procede?
Minha ideia — veja o absurdo da adolescência — era estudar advocacia para reformar as penitenciárias. Eu cuido do mundo, eu sou a mãe do mundo, a minha responsabilidade é grande.
A inspiração é uma
forma de loucura?
Inspiração não é loucura; é Deus.
Que defeito gostaria de
eliminar em você?
Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso — nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro.
Você passou, rapidamente,
por Brasília. O que foi
Brasília em sua vida?
Brasília é um pacto que eu fiz com Deus. Brasília é uma estrela espatifada.
Você se tornou famosa e
curtida nas redes sociais.
É bom viralizar nas redes?
O anonimato é suave como um sonho. Eu estou precisando desse sonho.