TELEVISÃO

Crônica: Um amor radical

"É comovente a entrevista de Viola Davis com Oprah Winfrey. Na verdade, muito mais uma conversa entre duas celebridades com histórias de vida semelhantes"

Mariana Niederauer
postado em 26/07/2022 23:09 / atualizado em 26/07/2022 23:09
(FILES) In this file photo taken on December 5, 2018 actress Viola Davis attends The Hollywood Reporters Power 100 Women In Entertainment at Milk Studios, in Los Angeles. Viola Davis received the award for Outstanding Performance by a Female Actor in a Leading Role (?Ma Rainey?s Black Bottom?) during the virtual SAG awards on April 4, 2021. / AFP / VALERIE MACON -  (crédito: VALERIE MACON)
(FILES) In this file photo taken on December 5, 2018 actress Viola Davis attends The Hollywood Reporters Power 100 Women In Entertainment at Milk Studios, in Los Angeles. Viola Davis received the award for Outstanding Performance by a Female Actor in a Leading Role (?Ma Rainey?s Black Bottom?) during the virtual SAG awards on April 4, 2021. / AFP / VALERIE MACON - (crédito: VALERIE MACON)

É comovente a entrevista de Viola Davis com Oprah Winfrey. Na verdade, muito mais uma conversa entre duas celebridades com histórias de vida semelhantes. O encontro delas tem como pano de fundo as memórias da atriz, registradas em sua autobiografia recém-lançada Em busca de mim (Finding me: A memoir, no título original).

Vários trechos do bate-papo me emocionaram. Apesar do ambiente descontraído, até mesmo pela proximidade que as duas parecem compartilhar, os assuntos tratados são densos e dolorosos. Machismo, sexismo, racismo, abuso sexual. Tudo isso permeia a conversa de cerca de 50 minutos, em que Oprah chega a compartilhar alguns trechos do livro de Viola.

"Meus sonhos são maiores que meus medos", disse a certa altura a atriz, explicando o motivo de ter sido a única numa plateia de crianças a manter a mão levantada diante do questionamento de seu primeiro diretor sobre quem queria ser um ator. A princípio, todos levantam a mão. Na sequência, ele começa a elencar as dificuldades da carreira e, aos poucos, todos desistem, menos ela.

 

  • (FILES) In this file photo taken on December 5, 2018 actress Viola Davis attends The Hollywood Reporter's Power 100 Women In Entertainment at Milk Studios, in Los Angeles. Viola Davis received the award for Outstanding Performance by a Female Actor in a Leading Role (?Ma Rainey?s Black Bottom?) during the virtual SAG awards on April 4, 2021. / AFP / VALERIE MACON VALERIE MACON
  • US actress Viola Davis poses as she arrives to attend the 14th Rome Film Festival (Festa del Cinema di Roma) on October 26, 2019 at the Auditorium Parco della Musica in Rome. / AFP / Andreas SOLARO ANDREAS SOLARO
  • US actress Viola Davis and her husband Julius Tennon arrive to attend the 14th Rome Film Festival (Festa del Cinema di Roma) on October 26, 2019 at the Auditorium Parco della Musica in Rome. / AFP / Andreas SOLARO ANDREAS SOLARO
  • US actress Viola Davis arrives for the 71st Emmy Awards at the Microsoft Theatre in Los Angeles on September 22, 2019. / AFP / VALERIE MACON VALERIE MACON
  • US actress Viola Davis poses on the red carpet upon arrival at the BAFTA British Academy Film Awards at the Royal Albert Hall in London on February 10, 2019. / AFP / Tolga AKMEN TOLGA AKMEN
  • Actress Viola Davis attends the 2018 Glamour Women Of The Year Awards: Women Rise on November 12, 2018 in New York City. / AFP / Angela Weiss ANGELA WEISS
  • US actress Viola Davis and husband Julius arrive for the 2018 British Academy Britannia (BAFTA) Awards at the Beverly Hilton hotel in Beverly Hills on October 26, 2018. / AFP / VALERIE MACON VALERIE MACON
  • Actress Viola Davis arrives for the 90th Annual Academy Awards on March 4, 2018, in Hollywood, California. / AFP / ANGELA WEISS ANGELA WEISS

Mas o que mais me tocou foi o momento em que comentam da relação da família com a escola. Vivendo em situação de extrema vulnerabilidade na Rhode Island dos anos 1970, os pais e os cinco filhos, além da fome, enfrentaram o frio, que chega a -2ºC no inverno, por vezes sem aquecimento nem água potável.

Num dos dias de maior dificuldade, quando não haviam conseguido tomar banho, sentiam frio e fome, a irmã Dianne decidiu que, mesmo assim, queria ir à escola. A professora Ann Prosser os recebeu na porta e questionou o motivo de não terem ido à aula a semana toda. Quando ouviu a explicação da senhora Davis, não pôde conter o choro.

"Ela tinha lágrimas nos olhos, acariciava nossos rostos, e dizia: 'Sinto muito, senhora Davis. Eu sinto muito. Diga-nos o que podemos fazer por vocês'", conta Viola. "A senhora Prosser me chamava à sala dela, de tempos em tempos, e me dava uma sacola cheia de roupas lindas que tinham sido da filha dela", continua a atriz, e comenta ainda que sentia como se estivesse ganhando joias.

Oprah reforça que, para ela, os professores também foram salvadores. Apesar de concordar, Viola relata como é difícil contar essa história, pois também viveu, ao lado da irmã Dolores, momentos de abuso moral na escola, chamadas a atenção por estarem cheirando mal.

Ela destaca, no entanto, que, mais do que as condições financeiras para tomar banho e vestir uma roupa limpa, faltavam ensinamentos básicos sobre higiene pessoal. "As pessoas não percebem que, se ninguém te mostra, você tem que descobrir sozinho. E eu não tinha as ferramentas para descobrir sozinha. E eu tinha vergonha de não ter as ferramentas para isso. Então, tudo o que eu tinha, o que eu podia fazer, era nadar na vergonha."

Quanta dor não precisou passar essa família para que algo bonito e feliz pudesse surgir em meio a tanto sofrimento? Quantas vezes nós, enquanto sociedade, também não desprezamos o nosso bem mais precioso: as crianças. Nas escolas, em casa, na rua. Elas merecem a nossa dedicação integral e obstinada. Gestos simples, como ensinar a lavar as mãos, oferecer um abraço, garantir uma refeição, fazem toda a diferença.

"Quando você está diante de compaixão e empatia é incrível como isso mata a vergonha. Porque você é vista. E você é vista por algo muito mais valioso do que as suas circunstâncias", explica Viola. "Acho que, no fim das contas, o que eu estava procurando era amor. Um tipo radical de amor."

 


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