A defesa da democracia 

Correio Braziliense
postado em 21/07/2022 00:01

O presidente da República voltou a atacar as urnas eletrônicas com mentiras requentadas em encontro com embaixadores de vários países. Novamente, não apresentou nenhuma prova. Tudo indica que subestimou a inteligência dos diplomatas.

No dia seguinte, a Embaixada dos Estados Unidos emitiu nota com um duro recado em que desdiz tudo que o presidente tentou impor na sua fala: "O país tem um forte histórico de eleições livres e justas, com transparência e altos níveis de participação dos eleitores. As eleições brasileiras, conduzidas e testadas ao longo do tempo pelo sistema eleitoral e instituições democráticas, servem como modelo para as nações do hemisfério e do mundo".

A nota destaca, ainda, que "os brasileiros confiam em seu sistema eleitoral" e aposta que "o Brasil mostrará ao mundo, mais uma vez, a força duradoura de sua democracia". A Transparência Internacional enviou aos embaixadores uma checagem desmontando as falácias propagadas por Bolsonaro. Além disso, 40 procuradores apontaram 19 falsidades nas versões do presidente e pediram ao Procurador-Geral da República, Augusto Aras, que investigue Bolsonaro por crime eleitoral e abuso de poder.

É óbvio que o presidente segue o roteiro de Donald Trump, que moveu mais de 50 ações de fraudes nas últimas eleições dos Estados Unidos, vencidas por Joe Biden, todas derrotadas nos tribunais. Sabemos que o sistema eleitoral norte-americano é uma carroça se comparado ao sistema eleitoral brasileiro. O voto impresso se presta às maiores falcatruas.

Em 2000, durante a eleição de George Bush, o resultado das urnas demorou mais de um mês para sair. Tentaram impor o voto impresso no parlamento, mas, com toda a servidão da Câmara dos Deputados, encerrada na bolha do orçamento secreto, não conseguiram. Essa proposta absurda só poderia prosperar por meio de fake news. Mas nem assim ela conseguiu a adesão da maioria dos brasileiros.

Pelo contrário: mesmo sob ataques constantes do presidente, em dezembro de 2020, 69% dos brasileiros confiavam nas urnas eletrônicas; em maio de 2022, o índice subiu para 73%. O Brasil utiliza o sistema de votação digital desde 1996 e, até agora, não foi constatada nenhuma fraude. Diferentemente do que ocorre com a internet, o sistema não está conectado a nenhuma rede de dados passível de invasão.

Com as cédulas de papel, é muito mais fácil alterar ou adulterar o voto. Querem desmantelar o nosso sistema eleitoral de maneira semelhante a que pretendem destruir as nossas florestas, o nosso sistema de educação e o nosso sistema de saúde.

Em vez de se preocuparem com o fantasma da urna eletrônica, altas autoridades da República deveriam proteger a Amazônia da invasão dos garimpeiros, da pilhagem dos madeireiros e da violência dos grileiros, no momento em que o mundo arde em chamas pelo aquecimento climático. A lógica é mais ou menos essa: se eu perder, só pode ter havido fraude.

É discurso de perdedor, que não confia sequer no auxílio-voto, recém-instituído, em flagrante desacordo com a legislação eleitoral. Investir contra as urnas eletrônicas, sem nenhuma prova, é atacar a democracia. Se alguém quisesse mesmo colaborar para o aprimoramento do processo eleitoral a primeira providência seria apresentar projetos para coibir as fake news nas campanhas políticas.

O roteiro da farsa das acusações de fraudes eleitorais sem prova está mapeado. Basta ver o que aconteceu com Trump e seus seguidores nos Estados Unidos. Todos que prezam a democracia não podem se omitir neste momento e têm de repudiar esse despautério. E, por falar em omissão, onde é que está o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira?

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