Os números do crescimento de infectados pela dengue neste ano são assustadores: são 60.934 casos, que representam um aumento de 431,9% em comparação ao mesmo período de 2021, com 11.005 casos registrados. Oito pessoas morreram em decorrência de complicações causadas pela dengue. E isso sem considerar que ainda não estamos no período chuvoso, onde costuma acontecer o ápice da doença.
Em 2014, durante a Copa do Mundo de Futebol no Brasil, peguei dengue. Não tenho certeza, mas desconfio que fui picado pelo mosquito em minhas investidas por um terreno baldio para catar mangas. Sempre gostei de apanhar frutas nas árvores. Cresci em uma casa que era quase uma chácara, com uma infinidade de fruteiras: mangueiras, jambeiros, cajueiros, pitangueiras, abacateiros e romanzeiras.
De repente, acordei com a cabeça pesada, as articulações doloridas, as pernas com toneladas de peso e um gosto de chumbo na boca. Resisti a fazer um teste, mas, como os sintomas minaram a minha resistência, dei o braço a torcer. Era dengue. Lia ou assistia a reportagens com a informação de que o ciclo da doença era de, no máximo, 10 dias. No entanto, constatei que essa era uma meia-verdade.
Demorei quase um ano para recuperar a plena forma física e mental. Claro que cada um reage de uma maneira e isso não pode ser generalizado. Além disso, é preciso lembrar que, agora, existem também outras doenças associadas ao Aedes, também terríveis: a zika e a chikungunya. Não podemos permitir que todos nós estejamos expostos a perigos perfeitamente solúveis e sanáveis.
Cobrados, os governantes alegam que estão tomando todos os cuidados possíveis, mas não depende só deles. A explicação não convence. É claro que o governo não pode resolver o problema sozinho. De uma maneira semelhante ao que ocorre com a covid-19, a dengue é uma doença coletiva, só pode ser vencida com a adesão e a participação comunitária.
Mas como isso pode acontecer se não existe nenhuma campanha publicitária para informar, educar e sensibilizar as pessoas a não jogar lixo na rua, a cuidar da água da piscina e a não criar um ambiente favorável à procriação do Aedes aegytpi? É o governo que tem de liderar esse combate. Não é culpa dos funcionários, recebi em casa a visita de um técnico muito educado, que fez uma vistoria, inspecionou os possíveis focos de reprodução do mosquito, perguntou sobre as condições ambientais da vizinhança e forneceu dicas.
Ele foi impecável, mas a questão é mais complexa. Ora, a dengue não é a covid, uma doença desconhecida, ainda não mapeada totalmente pela ciência. Deveria figurar no calendário de problemas a serem combatidos pelo governo, com campanhas, provimento de equipes capacitadas e equipamentos para o combate à doença.
Não vemos nada disso. É impressionante a quantidade de lixo nas ruas, mesmo de um bairro de classe média alta, como é o caso do Sudoeste. Nas cidades da periferia, a situação é mais grave, associada à precariedade do saneamento, favorecendo a proliferação do Aedes. O fracasso expresso no aumento de 431,9% em relação ao ano passado é revelador do descaso e da improvisação no enfrentamento da dengue. É uma doença perigosa, pode matar e, mesmo quando não mata, deixa sequelas.
Não pode ser tratada com tamanha negligência. Todo ano ocorre a mesma coisa: de repente, o governo descobre que existe a dengue. É inaceitável que Brasília, a capital do país, ocupe o topo do ranking da doença. Esses números evidenciam a falta de uma política pública de combate à dengue no DF.
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