Fui professor do curso de jornalismo em uma faculdade particular durante oito anos. Ao longo do período, em todas as disciplinas que ministrei a primeira tarefa que passava era escrever uma crônica. Eu tinha em mira conhecer melhor cada um. A crônica revela, voluntária ou involuntariamente, a alma.
Surgiam narrativas muito inventivas. Uma história que elegi como uma das melhores teve como tema um misterioso "professor de loucura". No primeiro dia de aula, o referido docente entrou em sala e começou a expor seu plano de ensino. Antes de tudo, explicou no que consistia a disciplina da qual era titular: "Sou professor da disciplina loucura. O que constitui essa estranha disciplina?", indagou o lunático professor.
E ele mesmo respondeu: "Loucura consiste em conhecer as principais vertentes e fontes da cultura brasileira e internacional, numa relação crítica, de corpo a corpo com os autores e com as obras. Conhecer, conviver e tornar-se íntimo dos personagens mais brilhantes da humanidade de todos os tempos. Inventar uma internet espiritual para interagir intensamente com esses luminares".
Combater o culto da ignorância. "Resistir ao espírito de rebanho e de Maria-vai-com-as-outras e tornar-se um ser singular. Adquirir autonomia de estudo e tornar-se um verdadeiro autodidata. Extrair o que havia de melhor em cada um."
Os alunos ouviram, mas ao tomar ciência do plano de ensino, informaram ao quixotesco personagem: "Professor, acho que o senhor se enganou e entrou na sala errada. Ninguém aqui está interessado nesta disciplina".
E, ao entregar os comentários, levei tremendo susto: a autora disse que escrevera o texto em homenagem a meu "esforço dramático" em transmitir o conhecimento. Contou que a minha presença era polêmica, provocava comentários desencontrados: "É inteligentíssimo". Ou: "Ele é louco". Ou: "Viaja na maionese". Ou: "Não, ele é lúcido, estuda para falar". Entendia que eu "atirava pérolas aos porcos". Só uns 20% aproveitavam.
Retifiquei que apenas a primeira parte da frase estava correta. Tentava compartilhar o que havia aprendido de mais precioso. Tentava fazer a minha parte. O que as pessoas fariam com isso era da responsabilidade delas. Mas sempre deixava aberta a possibilidade de que eu tivesse errado em algum ou em vários momentos. O que é interessante para um aluno ou para uma turma pode não ser para outro aluno e outra turma. Não existem fórmulas infalíveis, porque os seres humanos são misteriosos, singulares e imprevisíveis. Educar é difícil e dramático, exige autocrítica e reinvenção permanentes.
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