Aos apaixonados pela história de Brasília, bem como aqueles que seguem a fé católica, a Igreja Nossa Senhora de Fátima, mais conhecida como "Igrejinha de Fátima'', está completando 64 anos desde sua inauguração. A pequena capela foi o primeiro templo em alvenaria a ser erguido na capital e sua construção e inauguração são consideradas um marco para a cidade.
Sob o mandato de Juscelino Kubitschek, a igreja foi construída em cem dias em cumprimento a uma promessa da primeira-dama, Sara Kubitschek, pela cura de sua filha Márcia. A sugestão da promessa foi dada pelo presidente de Portugal, Craveiro Lopes, que estava no Brasil na época e ao saber da situação relembrou à Primeira Dama a história das aparições de Nossa Senhora de Fátima.
A ideia inicial era a construção de um grande santuário onde atualmente se encontram as Superquadras 307/308 Sul. Porém, os planos mudaram após a necessidade de uma igreja para a cerimônia de casamento da filha do presidente da Novacap, Israel Pinheiro. Logo, o plano inicial da família Kubitschek foi substituído com urgência pelo projeto de uma capela mais simples: a atual Igreja Nossa Senhora de Fátima. A paróquia foi inaugurada antes mesmo de Brasília, no dia 28 de junho de 1958.
Tombado pela Unesco como patrimônio cultural e histórico nacional em 7 de dezembro de 1987, o templo foi projetado por Oscar Niemeyer e é composto por três pilares que sustentam uma laje em referência aos antigos chapéus usados por freiras. A parte externa da parede é revestida por azulejos de Athos Bulcão que simbolizam a descida do Espírito Santo e a Estrela da Natividade. Já no seu interior, o monumento apresenta pinturas de Francisco Galeno, aluno de Alfredo Volpi, artista italiano responsável pela primeira obra artística da igreja.
Segundo informações da Paróquia Nossa Senhora de Fátima, a primeira pintura realizada por Volpi no interior da igreja apresentava afrescos com bandeirolas e anjos que remetiam a uma quermesse, principalmente as festas juninas. As pinturas modernistas causaram estranhamento em alguns paroquianos que se queixaram da personalização artística e até falta de religiosidade da obra. Dessa forma, a arte chegou a ser coberta de tinta azul quatro anos após a inauguração, mas foi restaurada por Francisco Galeno entre janeiro e junho de 2009, que manteve a inspiração festiva de Volpi de uma forma mais discreta.
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Moradores e turistas
Apesar da simplicidade e do espaço reduzido, a igrejinha é considerada um dos maiores símbolos da fé católica em Brasília. O Frei Venildo Trevizan, 83 anos, sacerdote mais antigo da paróquia, afirma que os candangos já faziam da igreja ainda em construção, um lugar de prece e pedidos de milagres. "Ela representa o marco central da atual capital", ressalta. Nesse sentido, a paróquia conquista o coração de muitos moradores de Brasília, turistas e fiéis que ainda a frequentam desde os seus primeiros anos de funcionamento.
A bibliotecária, arquivista e tradutora, Nilza Teixeira Soares, 96, conta que se mudou do Rio de Janeiro para Brasília em outubro de 1960. Assim que chegou na nova capital, ela passou a frequentar as missas e logo se engajou nas atividades da igreja, onde é ativa até hoje. A arquivista, referência no campo da arquivologia brasileira, trabalhou na área de pesquisa para históricos da paróquia, além de ter escrito a biografia do Frei Bernardo Cansi (entusiasta à Liturgia e à implantação da Catequese renovada em todo Brasil, membro da academia de letras de Brasília e fundador da Missa dominical transmitida pela TV Brasília).
Nilza se alegra ao relembrar de como foi uma das primeiras comunhões realizadas no templo, dia 29 de outubro de 1961. Segundo a bibliotecária, as crianças se arrumavam no Bar-restaurante, hoje conhecido como "Xique-Xique'' e atravessavam a rua para chegar na Igrejinha. "Todos saiam vestidos de branco e chamavam atenção das pessoas, que as apelidaram de anjinhos de Fátima", explica.
A bibliotecária conta que também acompanhou a restauração de Galeno na paróquia. Segundo Nilza, a obra ainda causa estranhamento em alguns fiéis, mas ela acredita que as pinturas remetem o amor de Nossa Senhora de Fátima pelos três pastorinhos e a infantilidade. Além de sua história, Nilza conta que tanto a arquitetura quanto as pinturas da paróquia são o que tornam o templo autêntico e significativo. "Me lembro de uma vez estar na missa com uma criança e ela ficou impressionada com a imagem de Nossa Senhora segurando uma pipa. Eu achei aquilo muito interessante!", ressalta.
Memória e tradição
Com sua história, arquitetura e simplicidade, o templo acabou se tornando um símbolo memorável principalmente para os pioneiros da capital. A aposentada Terezinha de Jesus, 83, declara que esteve presente durante a primeira missa da paróquia e se emociona ao relembrar de momentos que presenciou no dia da inauguração.
Segundo Terezinha, a expectativa com a abertura da igreja era tanta, que muitos candangos se alocaram em caminhões para assistirem o evento, pois não havia espaço o suficiente para a multidão ansiosa. "Muitas pessoas, principalmente senhoras, se emocionaram com a bênção realizada no templo e a mensagem do Papa, traduzida pelo Núncio Apostólico D. Armando Lombardi", recorda.
A professora e diretora aposentada, Zelma Capelli, 88, também é uma frequentadora antiga da paróquia. Ela conta que ao chegar de Belo Horizonte em 1963, tudo ainda era muito inédito. "A cidade e a igrejinha já existiam, mas para mim ainda era o começo. Me lembro que naquela região ainda havia muita terra e não tinha nem calçamento. Eu chegava na igrejinha com os pés sujos de barro", relembra. A católica aposentada sempre foi devota de Nossa Senhora de Fátima e vai com frequência às missas, que segundo ela, seguem uma tradição de anos.
E por falar em tradição, muitos fiéis procuram a igrejinha Nossa Senhora de Fátima para a realização de cerimônias religiosas, como o caso de Joseane Prestes, 44, e Rônio Mota, 43, que se casaram na paróquia no dia 26 de março deste ano. Segundo eles, por possuir uma pequena estrutura, a ideia do casamento na paróquia acabou sendo inicialmente descartada pelo casal. Porém, por se tratar de um lugar tão simbólico, Joseane e Rônio optaram por realizar uma cerimônia menor na igreja. Para eles, apesar da limitação de espaço e convidados, o casamento foi muito marcante para toda a família. "É um local tão agradável, que você acaba se sentindo abraçado.Toda a cerimônia tocou fundo nossos corações", completa.
A igrejinha Nossa Senhora de Fátima se destaca há 64 anos como um dos mais importantes cartões postais de Brasília e para este aniversário a Paróquia organizou uma programação especial em comemoração a data.
*Estagiária sob a supervisão de Samanta Sallum