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'Desesperada pelas meninas'

Três dias após o atropelamento de cinco crianças, quatro das vítimas seguem internadas na UTI. Ontem, a Justiça decidiu pela prisão preventiva do motorista que atingiu as garotas. Mãe de Maria Eduarda, que recebeu alta, desabafa

Quatro das cinco crianças que foram atropeladas por um motorista embriagado em Ceilândia, no último domingo, continuam internadas no Hospital de Base. Uma delas teve melhora. O Iges-DF não indicou qual delas. Ana Julia, 6 anos; Bruna Raquel, 6; Ester Isabely, 10; e Sofia Valentina, 4, seguem na unidade de terapia intensiva (UTI). Uma das vítimas recebeu alta e foi para casa, sem ferimentos graves. Traumatizada, Maria Eduarda da Silva, 10, agora, torce pela recuperação das amigas. "Que elas fiquem bem e logo estejam aqui comigo", diz a menina. Ontem, a Justiça decidiu pela prisão preventiva do motorista, Francisco Manoel da Silva. Ele estava bêbado quando atingiu as meninas e possui habilitação.

Apesar da preocupação que sente em relação às outras vítimas, a mãe de Maria Eduarda, Francisca da Silva, 35, está aliviada com a rápida recuperação da filha. "Ela teve poucos hematomas, alguns ralados nas costas, na cintura e joelho, mas, pela gravidade do acidente, os hematomas são o de menos. É um milagre. Estou desesperada pelas meninas, mas sinto alívio por ela", revela, ao Correio.

Enquanto acontecia a audiência de custódia que converteu a prisão em flagrante do homem em prisão preventiva, familiares e amigos das vítimas e moradores da região de Ceilândia e Sol Nascente participavam de uma manifestação, no Instituto Abraço Solidário, para pedir justiça e segurança para as crianças da comunidade. Maria Eduarda, que recebeu alta na tarde de segunda-feira, foi ao ato com a mãe. A memória que ela tem da tragédia é do pavor que sentiu antes de ser atropelada. "Não lembro muito de quase nada, porque fiquei muito assustada, senti medo demais. Eu não imaginava que isso ia acontecer", conta a menina.

O protesto de ontem ocorreu no Instituto Abraço Solidário, na Quadra 202 do Sol Nascente, a algumas quadras do local onde aconteceu o atropelamento, na QNP 5 de Ceilândia Norte. A entidade, sem fins lucrativos, oferece doações, ações sociais e esportivas para pessoas carentes, crianças e jovens da região. As meninas atropeladas no domingo faziam aulas de artes marciais no local.

O filho da balconista Mayara Santana, 28, é amigo das meninas. Segundo a mãe de Michel, o garoto está tão abalado que não consegue ir à escola. "Sou mãe e me vejo no lugar delas. Sei que é uma dor muito grande, e a gente não pode fazer nada a não ser pedir justiça, para que isso não fique impune, e que o motorista pague pelo que fez, pois destruiu a vida delas e a da gente também", protesta Mayara, emocionada.

Glória Shirley Pereira, 50, é avó de Ana Julia, Bruna Raquel, e Ester Isabely. Ela esteve no ato e contou que Ester foi a única que não precisou passar por cirurgias. "As quatro que estão internadas tiveram traumatismo craniano, e três passaram por cirurgias", explicou. Segundo ela, a preocupação dos médicos é com a possibilidade de sangramento pós-cirúrgico, o que poderia levar a hemorragia. Abalada, a avó das meninas espera que o homem responsável pela tragédia continue preso.

Autoridades manifestaram solidariedade às vítimas da barbárie. Na manhã de ontem, o governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB), comentou o assunto. "Torço muito para que essas crianças saiam do hospital com saúde e que possam ter as suas vidas contempladas pela benção de Deus." Na ocasião, o chefe do Executivo local afirmou que, apesar da fiscalização feita pelo Departamento de Trânsito (Detran) e pelas polícias, a população precisa se conscientizar sobre a mistura entre o álcool e a direção. "Senão, vamos continuar tendo acidentes graves como este, independente do trabalho que o governo faça", avaliou o governador.

Investigação

Francisco Manoel da Silva, 53 anos, atropelou as crianças enquanto elas atravessavam a faixa de pedestres. O homem não tem carteira de habilitação e tentou fugir do local após o acidente, mas foi detido por motociclistas que presenciaram o crime. O exame do Instituto Médico Legal (IML) constatou a embriaguez do condutor, que confessou à polícia ter ingerido uísque. Em 2015, Francisco teve outra passagem criminal por dirigir sem habilitação. Ele foi preso em flagrante no domingo, e ontem, a juíza Monike de Araújo Cardoso, do Núcleo de Custódia de Ceilândia, decidiu que a medida será convertida em prisão preventiva.

Os advogados de Francisco pediram a liberdade provisória, mas a magistrada negou por considerar que houve caráter doloso nas ações do homem — ou seja, quando há intenção. "O caso ultrapassa a 'mera' embriaguez ao volante. O autuado, além de se encontrar embriagado na condução de veículo automotor, não possuía habilitação, ou seja, não possuía conhecimento técnico para conduzir veículo automotor e, ainda assim, assumiu o risco de ferir a integridade física própria e de terceiros", detalha a decisão.

Ao Correio, o advogado Abraão Carvalho dos Santos, que representa o motorista, disse que vai recorrer da prisão preventiva e que a Justiça agiu de forma inconstitucional ao considerar que houve dolo no acidente. A defesa reforçou que Francisco repudia o acidente e que se solidariza com as famílias das crianças atropeladas.

À reportagem, o delegado da 15ª Delegacia de Polícia (Ceilândia Norte), Fernando Crisci, explica que as investigação foram encerradas e que a corporação aguarda o resultado da perícia. "Quando isso for finalizado, será encaminhado diretamente ao poder Judiciário. E, pelo que já foi levantado no dia do fato, já tem material suficiente para o Ministério Público oferecer denúncia, em nosso entendimento. Pode ser que o MP provoque, de novo, a polícia para tomar novas diligências, e, neste caso, o inquérito será transferido para a 19ª DP", adianta.

*Estagiário sob a supervisão
de Guilherme Marinho

 

Ed Alves/CB - As meninas internadas na UTI do Hospital de Base têm entre 4 e 10 anos
Ed Alves/CB - Gloria Pereira é avó de três das vítimas atropeladas no domingo
Ed Alves/CB - 24/05/2022. Crédito: Ed Alves/CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF. Cidades. Uma das crianças, vitima do atropelamento na Ceilandia recebe Alta medica. Na foto Franciska Katiane Silva e sua filha Maria Eduarda.