Pela primeira vez desde o início da pandemia, voltei a pegar um avião. O motivo era nobre: o casamento de uma querida amiga de infância. A empreitada, nada fácil. Levar duas crianças para a praia exige uma operação de guerra. Aliás, criar uma, duas ou dez crianças é viver num campo de batalha. Para além de todos os preconceitos e cobranças que cercam a paternidade, mas sobretudo maternidade, certificar-se de que aquele pequeno ser crescerá bem e feliz dá um trabalho imenso.
É por isso que me assusta tanto tomar conhecimento da proporção de mais de 5% de mães solo no Distrito Federal em 2021. Evidentemente que isso não significa a falta de uma rede de apoio, essencial mesmo quando há um pai presente e que não apenas "ajuda". Não tenho a menor dúvida e sei que não cometo erro em dizer que essas mulheres são verdadeiras guerreiras, que devem ser respeitadas e apoiadas. Em palavras e em gestos. Muito mais do que heroísmo, é uma questão de humanidade, de saúde pública de sobrevivência da espécie. Sabe-se que crianças bem-cuidadas na primeira infância adoecem menos, o que tem impacto essencial nos sistemas de saúde. Serão adultos mais bem preparados para o convívio social, por exemplo. Investir no bem-estar de uma mãe não é luxo, é garantir o futuro de um país.
Não é a toa que em povos tradicionais o cuidado com bebês e crianças é compartilhado entre muitos, em organização tribal. Oferecer afeto, carinho, atenção e alimento adequado, tão essencial nos primeiros anos de vida, como sabemos, é tarefa simplesmente impossível quando se está à beira do colapso causado pela exaustão. A privação de sono é apenas um detalhe entre as preocupações de "ticar" todas essas caixinhas do que é essencial para elas.
Tive o privilégio de estar e ter nascido numa condição econômica e num contexto social que me permitiram, na vida adulta, viver a maternidade com vários confortos de que muitas mulheres são privadas, até mesmo integrando camada social semelhante. Casos recentes e amplamente repercutidos de violência obstétrica não me deixam mentir. Nem consigo contar nos dedos das mãos o número de pessoas que me ajudaram a atravessar os primeiros meses do puerpério. Algumas, contratadas, mas extremamente dedicadas e amorosas, e outras da família e do ciclo mais próximo de amigos. Que sorte a minha. Que privilégio.
E impossível não citar meu companheiro, que honra em todos os sentidos a palavra. Um parceiro de vida e de paternidade. Ele sabe e faz questão de ressaltar que nunca conseguirá entender o que se passou e o que se passa comigo. Apenas me dá o tempo de que preciso para recuperar as energias e a vivacidade. Não quero enganar nem desanimar ninguém. Ter filhos foi a melhor decisão que já tomamos na vida e nossas duas pequenas são nossas maiores alegrias — sem medo dos clichês. Mas a jornada é exaustiva, às vezes enfadonha, irritante e monótona. É todo dia tudo igual. E ai de nós se mudarmos uma vírgula, ou elas mostrarão a que vieram. É o poder da rotina, não tem jeito.
Pois, enfim, chegamos ao dia da viagem tão esperada. Um misto de emoções, primeira viagem de avião da mais nova, a estreia da mais velha numa fase em que certamente se lembrará da experiência e a nossa desde que começou a pandemia. Com o apoio dos meus sempre presentes sogros, conseguimos ganhar algumas horinhas sozinhos na festa de casamento. A mais velha, sempre sábia, disparou: se divirta e se acalma!