A questão da moradia e da proteção de reservas é motivo de constantes embates entre a população, o Estado e ambientalistas. Recentemente, os ministérios públicos Federal (MPF) e do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) emitiram recomendação contra a transferência do território que compõe as áreas das fazendas Contagem de São João e Sobradinho — também conhecida como Paranoazinho. O documento defende que as terras não sejam transferidas da União para a Agência de Desenvolvimento Brasília do DF (Terracap), após acordo entre as duas partes.
A justificativa é de que as duas fazendas ficam em áreas de proteção integral, com uso de recursos naturais admitido apenas de maneira indireta — quando não envolve consumo, coleta ou dano. Advogado e professor especialista em regularização fundiária, Emerson Caetano afirma que esses tipos de territórios não podem ser objeto de transferência para regularização urbana. "É necessário, inclusive, que haja trechos de amortecimento para que um região de proteção não seja interrompida e, logo depois, comece uma cidade, pois isso também afeta a questão ambiental", comenta.
O advogado lembra que a Lei Federal nº 9.985/2000 impede a transferência de terras em áreas integralmente protegidas e, em nível distrital, a Lei Complementar nº 986/2021 proíbe a regularização urbana nesses locais e em parques ecológicos. O Correio visitou algumas das regiões afetadas pelo acordo entre União e Terracap, em Sobradinho. Na entrada da fazenda homônima, uma placa avisa: "Proibido, neste parcelamento, a realização de quaisquer obras de infraestrutura, edificações, exploração de recursos naturais e supressão de vegetação".
As áreas de transferência envolvem setores conhecidos como Nova Colina, Dorothy Stang, Uberaba, Novo Oriente, Petrópolis e respectivos arredores. Questionadas pela reportagem sobre o assunto, a Secretaria de Patrimônio da União não se posicionou, e a Procuradoria-Geral do Distrito Federal informou que, "no momento, não se manifestará". A Terracap informou que as terras pertencem ao Distrito Federal e que o termo de conciliação assinado em março corrige um problema da década de 1970, à época da criação da agência.
"(As titularidades) foram transferidas, para compor o capital social da Terracap, as Fazendas Contagem de São João, Sálvia, Brejo ou Torto e Sobradinho. Para cumprimento dos órgãos de controle externos e internos, tanto da União quanto do GDF, esse termo foi acordado, não restando dúvidas de que essas áreas pertencem à agência há cinco décadas, restando (homologar) o registro cartorial, que, por uma série de motivos, não foi realizado", justificou a empresa pública, em nota.