Aos 85 anos, o jornalista Adirson Vasconcelos tem a vívida lembrança do início da capital federal. Escalado pelo jornal recifense Correio do Povo para acompanhar a empreitada de Juscelino Kubitschek, não tardou para o comunicador se apaixonar pelo céu do planalto central e, a partir de um convite inesperado, virar personagem histórico da cidade integrando a equipe de profissionais responsáveis pela implementação do Correio Braziliense, primeiro veículo de comunicação de Brasília. De lá para cá, Adirson, assim como o jornal e a própria cidade acumula boas histórias para contar. Confira a entrevista.
Como foi a sua chegada à nova capital do Brasil?
Eu pisei nestas terras 50 dias antes da inauguração da Pedra Fundamental, que estava programada para ocorrer dia 3 de maio de 1957. Eu vim do Recife, como correspondente do Correio do Povo, para retratar como seria a cerimônia que marcaria o início das obras da nova capital do país. Primeiro eu cheguei ao Rio de Janeiro e depois vim no "pinga-pinga", até chegar em Goiânia. Lá, peguei um micro-ônibus que carregava de 16 a 20 pessoas para me deslocar ao local que seria a futura capital.
Quando você chegou em Brasília ficou hospedado onde?
Lembro que eu carregava um gravador e uma máquina fotográfica assim que pisei onde hoje é o Núcleo Bandeirante. Na época, existiam cerca de 40 barracos e um deles era um hotel, chamado de Souza, pois era um núcleo provisório da construção da capital. O local não tinha água quente, era todo de madeira, e a luz era controlada por um motor.
E a carreira jornalística? Como o seu caminho esbarrou com o Correio?
O Correio Braziliense surgiu quatro anos depois, após Assis Chateaubriand fazer um acordo com o presidente. Então, até lá meu caminho foi outro. Como eu estava na capital pelo jornal de Recife, o deputado que me escalou para cobrir o ato da pedra gostava muito de mim e nós conversávamos muito. Quando fiz uma viagem para o Rio de Janeiro, eu contei que fiquei encantado com o céu de Brasília, com o horizonte, com essa solidão e com o sol que explodiu no ocidente. Então, durante o nosso papo eu disse que não queria voltar para Pernambuco, pois aquela tinha sido uma aventura incrível. Fizemos um acordo, continuei como correspondente do Correio do Povo em Brasília e estava ganhando melhor. Isso para um jovem de 21 anos foi incrível.
Você lembra de como foi o início do jornal?
Bom, na época eu estava na Agência Meridional, que produzia conteúdo para os Diários Associados. E me lembro que o Assis Chateaubriand inventou e disse ao Juscelino que se ele inaugurasse a capital no dia que estava marcado pela lei, ele também iria inaugurar um jornal dos diários associados em Brasília. Eu assisti a pedra fundamental deste jornal que, em 12 de setembro de 1959, começou a tomar forma. Engraçado pensar que nos anos 60 aqui não tinha asfalto, era só estrada de terra. Então, o Ari Cunha começou essa obra e foi uma correria. Faltando 2 meses para inauguração do jornal, o diretor da minha agência meridional disse que eu iria fazer parte da equipe que instalaria o Correio Braziliense.
Como foi esse desafio?
O Correio começou sem ter nenhum leitor, olha que situação difícil. Era um canal de comunicação novo, em uma cidade nova, e tinha uma população que não era daqui. Começaram a transferir trabalhadores em abril, mas para ler um jornal é preciso criar um hábito. Jornal é hábito, então o grande Edilson Varela que foi o primeiro diretor teve uma ideia brilhante: doar exemplares todos os dias aos moradores das quadras da Asa Sul. Para isso, ele contratou um motorista com um ajudante para distribuir nos apartamentos das quadras 108, 107, 106, e nas casas que ficavam nas proximidades da W3 sul. A pessoa recebeu por 30 dias o jornal de graça, e depois começaram as assinaturas.
Qual a relação entre a capital federal e o Correio?
Eu amo essa cidade. Desde que cheguei aqui, como eu disse, me encantei com o nada. Eu vi a comunicação e a nova capital do país tomarem forma. Dentro do Correio fiz matérias incríveis e cobri coisas importantíssimas. Se nós não estivéssemos lá desde a fundação, talvez os rumos da cidade seriam diferentes, pois muitas pessoas queriam retornar a capital para o Rio de Janeiro. Nós resistimos, era um jornal bem feito, tinha tudo da capital, havia muito idealismo e era uma equipe completa, de pessoas novas e entusiasmadas. Tudo que se fazia naquele contexto era com desprendimento e alegria. Então de lá para cá escrevi 60 livros sobre Brasília, inclusive uma Enciclopédia contando todas as décadas, até 2020.
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