A expressão "Feliz Páscoa" é uma lindíssima redundância. Páscoa para ser Páscoa, no sentido judaico-cristão, precisa ser uma experiência feliz: é a passagem da escravidão do Egito para a libertação que começa com a travessia do deserto e termina com a chegada à Terra Prometida; é a passagem da situação de opressão do pecado para a liberdade trazida pelo sacrifício redentor da cruz.
Mas é uma redundância que não incomoda os ouvidos nem o coração, porque reforça uma das mais urgentes necessidades dos nossos dias, que é a volta da paz.
A pandemia da covid-19 nos tirou a paz. Passamos mais de dois anos assustados, temerosos, perplexos diante das estatísticas de contaminação e de mortes e do desamor manifestado no escárnio pela vida representado por tantas declarações infelizes.
Perdemos a paz, porque já não sabíamos bem se nós e nossas famílias sobreviveríamos à correnteza de dor e de falta de ar nos centros de atendimentos intensivos dos hospitais.
No entanto, fizemos páscoa, porque a ciência correu, os operadores da saúde se sacrificaram e as vacinas vieram expulsar esse vírus que continuará aqui e ali, mas não tem mais aquele poder diabólico de nos apontar o cemitério. Depois dessa páscoa feliz, poderíamos estar em paz. Só que não. Veio a guerra. Aquela obsoleta, reacionária, burra. Aquela que coloca uma multidão de jovens com roupas pesadas e armas no ombro para "morrer pela pátria". E eles só vão morrer, porque, quando matam, também morrem. E o pior é que a globalização nos ensinou que aquela guerra tosca do Leste da Europa promovida pela Rússia sobre a Ucrânia é uma guerra do mundo inteiro. Dos que colaboram, financiando-a, dos que protestam e a registram e daqueles que fazem de conta que não tem nada acontecendo e tocam a vida para frente como se fossem peças de uma engrenagem sem alma.
Precisamos de Páscoa.
Precisamos de Paz.
No âmbito da fé religiosa, especialmente do cristianismo, nossas comunidades celebraram, esta semana, a caminhada que levou Jesus ao calvário.
Uma caminhada que começa com a traição colaboracionista de Judas e termina com um assassinato cruel sobre a cruz romana. O ódio representado pela impaciência de um apóstolo decepcionado e traidor, de religiosos ciosos de suas doutrinas, de submissos ocupacionistas de um império mundial e do "efeito manada" presente na atitudes daqueles que não podem ver uma multidão reunida em torno de uma tragédia que começam a gritar sem a mínima consciência do que estão gritando. "Crucifica-o!". Foi o berro de uma massa de manobra. E a vítima de todo esse ódio venceu a tudo com amor. O amor levado até as últimas consequências.
Morreu. E ressuscitou. Para não mais cedermos ao ódio e para que fôssemos promotores de paz.
Feliz Páscoa!
Pe. Rafael Vieira, CSsR, Autor do livro Entre a fé e os fatos, da Editora Máquina de Livros