Economia, saúde e segurança devem ser os eixos centrais da campanha eleitoral no Distrito Federal em 2022. Junto a esses temas, estarão o combate às notícias falsas e a corrupção entre candidatos. A previsão é de especialistas ouvidos pelo Correio. As análises apontam que a pandemia da covid-19 vai continuar comandando o debate público, mas, desta vez, com outro viés além da saúde — a crise financeira. Sob o guarda-chuva da emergência sanitária, estarão as discussões que vão permear o debate no cenário nacional e respingar sobre o DF, como a polarização, o desemprego, a alta de preços e a diminuição do poder aquisitivo da população.
André César, cientista político da Hold Assessoria Legislativa, adianta que a economia será o tema central e o coração da disputa no DF. "Tudo em torno da crise estará em voga, como desemprego e aumento da inflação e dos juros. A preocupação do eleitor nacional se reflete em cada região, e os candidatos sabem disso", observa o especialista. Para o cientista político, o cenário de dificuldades financeiras reforça a preferência do público por políticos experientes. "Diferentemente de 2018, o discurso sobre a 'nova política' se esgotou — notamos isso nas eleições municipais de 2020", aponta André César.
A ideia é reforçada por Marcelo Vitorino, consultor e professor de comunicação e marketing político, que destaca o aspecto para a disputa ao Legislativo local. "Para a CLDF (Câmara Legislativa do DF), os políticos mais conhecidos levam vantagem. Depois de momentos de crise, como uma pandemia, a população tende a escolher políticos mais experientes. Vimos isso em 2020, quando o índice de reeleição, na comparação com 2016, subiu mais de 50%. Há tendência de políticos que haviam sido estigmatizados em 2018 voltarem", analisa o comunicador.
Na avaliação de André César, porém, a suposta vantagem não se reverterá em facilidade sobre os demais postulantes. "A realidade de crise aguda econômica, a dificuldade de recuperação geral, a saúde e o significado da pandemia vão demandar dos candidatos discursos melhor conduzidos, com propostas mais factíveis. O eleitor não vai comprar tão fácil assim propostas mirabolantes. Será uma campanha interessante nesse sentido", completa.
Covid-19
Paulo Fona, ex-porta-voz do Governo do Distrito Federal e ex-secretário de Imprensa da Presidência da República, acredita que as questões sanitárias terão protagonismo durante a campanha. "Por conta da pandemia da covid-19, a saúde será um tema bastante discutido, com destaque para as dificuldades que a população encontra para ter bom atendimento médico-hospitalar", argumenta.
Para Marcelo Vitorino, a condução do DF durante a crise do coronavírus será avaliada pela população e explorada pela oposição. "A eleição para governador será plebiscitária, ou seja, o eleitor vai, basicamente, decidir se aprova ou desaprova a gestão de Ibaneis Rocha (MDB), e não escolher, de fato, entre o atual governador e outro candidato. São coisas diferentes", avalia o especialista. Nessa discussão, as pautas, segundo Vitorino, vão incluir combate à pandemia, aspectos sociais, educação e manutenção do Estado, isto é, questões não ideológicas. "A tendência dos adversários de Ibaneis é olhar para assuntos sociais, culturais, de esporte, de lazer e de cidadania, que podem ter ficado de lado durante o mandato. O contraponto do governador será o combate à pandemia, que acabou orientando o governo", completa.
André César aponta que a importância das argumentações sobre a saúde foi reforçada pela pandemia e suscitou a conversa sobre assuntos adjacentes. "Haverá questionamento quanto a novas ondas e novas cepas, será um debate permanente. O DF sentiu o fechamento de empresas, comércios e serviços, então são temas inevitáveis", analisa.
Mentiras
Leticia Medeiros, diretora da ONG Elas no Poder, crê que o pano de fundo das campanhas deste ano não será diferente daquele visto em 2018. "Independentemente dos temas, o que podemos esperar destas eleições é, mais uma vez, uma batalha contra a violência política e as fake news", prevê. Para a cientista política, a atuação da população nesse combate é essencial. "Vai ser muito importante o próprio eleitorado atuar como um balizador dessas questões. Enquanto o próprio eleitor for conivente com essas práticas criminosas, não veremos mudanças na nossa cultura política", pontua.
O ex-porta-voz Paulo Fona liga as notícias falsas ao debate sobre crimes políticos e impunidade. "A corrupção ainda será debatida, por conta do fim da Operação Lava Jato e o retorno de políticos cassados. Será tratada, mas não com a ênfase de 2018. As fake news serão motivo de discussões — quais agentes produzem, qual é a versão verdadeira", adianta.
Complementando o colega, André César associa a corrupção e as informações mentirosas ao tema da segurança pública, que, na opinião dele, também será uma questão sensível até outubro. "É um fenômeno que pegou todos os estados, e a Câmara dos Deputados reflete bem isso, a discussão sobre 'nova política' em cima do discurso de combate à corrupção. Não vai se repetir com força como em 2018, porque é a menor preocupação da população nas pesquisas, mas ainda é uma preocupação", analisa o cientista político.
Ele chama a atenção para as dificuldades de combater as fake news. "Por mais que órgãos, plataformas digitais e sociedade civil tentem contê-las, as mentiras em cascata sempre existiram. A tecnologia permite disseminação em tempo real e imediata, e o dano que causa é quase impossível de ser revertido, então será um desafio. Para este ano, vejo uma onda de informações falsas mais forte do que em 2018. É inevitável, vai ser um instrumento muito utilizado", espera.
Leticia Medeiros lamenta o protagonismo das notícias não verdadeiras. "Quem perde com isso somos todos nós. Afinal, as pessoas que poderiam realmente fazer a diferença acabam desistindo de se candidatar, justamente pelo fato de o processo eleitoral ser violento e contar com certa conivência da sociedade", critica.
Polarização
Paulo Fona acredita que o antagonismo será visto nas campanhas da capital federal. "A polarização vai se reproduzir aqui e vai provocar discussões. Tudo que uma turma falar ou defender vai ser questionado pela outra turma, e vice-versa", prevê. O ex-secretário de imprensa também menciona a influência de outros aspectos nacionais no clima distrital. "Uma novidade do período pós-Bolsonaro é que questões culturais e comportamentais, como o armamento da população e o aborto, que não costumavam ser pautas de discussão, estão mais em evidência. Vários candidatos a deputado federal são defensores disso, então esses assuntos vão voltar", espera.
Em contrapartida, André César não crava a reprodução da disputa nacional entre lados antagonistas no Distrito Federal. "Não dá para aferir ainda com certeza, mas acho que a polarização também será uma tendência no DF. Vejo o DF, hoje, como um terreno fértil para o reforço da polarização. Quem tiver um discurso mais ou menos buscando uma terceira via pode ter menos espaço e menos chances no grande jogo", supõe o cientista político.
Para Marcelo Vitorino, as disputas de lados claramente opostos não serão, necessariamente, a tônica da polarização. "Os candidatos terão dificuldade na hora de apresentar as ideias para a população, que está com a atenção diversificada em vários meios e só consome conteúdos que interessam — e, via de regra, não são sobre política", analisa o comunicador. "Ao mesmo tempo, há uma escassez muito grande de profissionais de comunicação. Não basta ter diferenças em relação aos concorrentes, é preciso saber comunicá-las de formas interessantes para os eleitores", finaliza.