Há uma semana o Instituto de Cardiologia e Transplantes do Distrito Federal (ICTDF) atingiu uma marca histórica: 600 pacientes voltaram a sonhar após receberem transplante de fígado. Em atuação desde janeiro de 2012, o ICTDF é referência regional e nacional, pois é a única instituição que realiza os procedimentos no Centro-Oeste. Além disso, pacientes que estão na fila do Sistema Único de Saúde (SUS) à espera do órgão, em todo o Brasil, podem ser encaminhados para a capital do país.
Brasiliense, empresário e amante da vida, Robério Melo, 57 anos, teve 90% do fígado comprometido em 2017, em decorrência de uma cirrose hemocromatose — sobrecarga de ferro que pode intoxicar órgãos e levar a doenças como câncer, batimento cardíaco irregular e cirrose do fígado. Ao procurar uma médica hepatologista, Robério recebeu o diagnóstico e precisou vivenciar o transplante na prática. Dia 19 de maio de 2017, foi o dia mais importante da vida do paciente, como relatou ao Correio.
"Fiquei uma semana em casa e foram os piores dias da minha vida. Um dia minha esposa chegou do mercado com a minha irmã e decidiram me levar ao hospital, pois eu não estava bem. Chegando lá, escutei o médico falando para minha esposa que o meu fígado estava 90% comprometido e que eu teria três dias de vida, após isso, eu entraria em coma e o quadro seria irreversível", contou Robério.
A história do empresário foi 1 entre 599 que deram certo. Ele disse que viver esse momento marcou sua trajetória para sempre. "Eu fiquei internado quarta, quinta e sexta. Na quinta, quando eu estava sozinho na UTI, uma enfermeira entrou e disse 'Seu Robério, a partir de agora você não vai tomar nem água, pois amanhã de manhã vai acontecer o seu transplante', aí meu coração faltou explodir. Aquele foi o momento mais importante da minha vida, pois na sexta era o terceiro dia e eu podia morrer", relatou.
Nova vida
Em 2017, a então estudante de medicina, Ianna Lara de Paula Miranda, 29 anos, foi submetida a um transplante de fígado. Após sentir-se mal e apresentar um quadro de vômito e náuseas, realizou os primeiros exames, identificando alterações nas taxas do fígado. O diagnóstico assustou a jovem, que estava no sexto período da faculdade. "Foi assustador, pois tinha estudado recentemente sobre insuficiência hepática. Eu via ali, tudo que estava acontecendo comigo, e lembrava do tratamento. Mas custava acreditar", revelou.
Após encaminhar os resultados a uma professora, Ianna, que estava em Balsas (MA), dirigiu-se, imediatamente, para Goiânia, onde foi transferida para a UTI, com um quadro de insuficiência hepática fulminante. O diagnóstico era claro: seria preciso um transplante. O ICTDF recebeu o alerta e, em poucos dias, a paciente foi transferida.
Em Brasília, a equipe do médico supervisor do programa de transplante de fígado do ICTDF, André Watanabe, recebeu a estudante. Devido a gravidade do caso, ela foi incluída como prioridade na lista de órgãos e, um dia após a chegada, a paciente recebeu um novo fígado. "Ali no ICTDF aprendi, novamente, a viver, com mais intensidade. Cresci, evolui. Hoje, com 29 anos, e 4 anos e 4 meses de transplante, sou médica, levo uma vida cheia de intensidade, vivendo cada minuto com gratidão", relatou. A agilidade foi o diferencial na vida da médica. O processo, entre os primeiros sintomas e o transplante, levou apenas oito dias.
André Watanabe explicou ao Correio porque o transplante de fígado é tão importante. "O transplante salva e recupera a vida das pessoas. Ele dá uma sobrevida, mas assim como todo procedimento, possui riscos e complicações. Porém, a maioria dos pacientes volta a ter uma vida normal. Nos últimos 5 ou 6 anos, o DF é o estado que mais realiza transplantes de fígado por milhão de habitantes, e isso é graças ao trabalho que se iniciou no instituto", falou o especialista.
Direito à saúde
Mas a história do Instituto de Cardiologia começou antes, em 2007. Na ocasião, o primeiro órgão transplantado no local foi um coração. Durante dois anos houve uma pausa nos atendimentos para troca de gestão, e, somente em 2009, o local retornou com os procedimentos. Três anos depois, em 2012 a instituição aderiu o transplante de fígado, e, em 2013, incluiu medula óssea, rim e córnea. "O ICDF veio para tapar uma lacuna grande que havia na região central do Brasil, pois os pacientes procuravam outros estados para conseguir o atendimento", afirmou a supervisora da Unidade de Transplantes do ICTDF, Carolina Couto.
Os programas de pré e pós transplantes são compostos por enfermeiros e técnicos de enfermagem que fazem o gerenciamento da lista de espera, avaliações dos pacientes e acompanhamentos pós-cirúrgicos, pois o procedimento não se resume ao transplante. Além disso, antes do paciente ir para a fila esperar o órgão, existe um preparo com a equipe multidisciplinar (psicólogos, assistentes sociais, nutricionistas, dentistas, fisioterapeutas, médicos e enfermeiros).