O Teatro Galpão é a maior sala do Espaço Cultural Renato Russo e destina-se ao teatro, dança, apresentações musicais, cerimônias e solenidades. Por anos, a sala tem sido espaço de celebração da cultura e da dramaturgia brasiliense, marcando diversos artistas que passaram por lá. Diante disso, foi proposta uma petição para que o local seja renomeado para Teatro Hugo Rodas, em homenagem ao recém-falecido artista.
Hugo Rodas foi ator, diretor, bailarino, coreógrafo, cenógrafo, figurinista e professor de teatro, responsável pela formação das primeiras gerações de artistas brasilienses. Aqueles formados e influenciados por ele trazem à tona a petição pública como um presente para a cidade que Rodas tanto amou.
Quem teve a ideia inicial sobre a homenagem foi o diretor de teatro e colega de profissão de Rodas, James Fensterseifer. Em entrevista para o Correio, ele conta que a proposta surgiu depois que o secretário de Cultura, Bartolomeu Rodrigues, optou por dar ao teatro o novo nome de Teatro Galpão Orlando Brito. "Brito foi um excelente fotojornalista, mas não possui relação com a área da cultura. Não seria um nome ideal para o teatro, ele deveria receber um nome de uma pessoa de fato inserida na arte e cultura de Brasília", relatou.
Após saber da morte de Hugo Rodas, James militou nas redes sociais a favor da renomeação, e foi o seu colega de profissão Fernando Martins quem criou a petição para tornar esse desejo realidade. "O intuito inicial era que o nome do teatro mudasse para Teatro Galpão Hugo Rodas, mas com a petição de Fernando, acabou ficando Teatro Hugo Rodas", explicou James.
"A enfermeira do hospital, ao ver todos que acompanharam ele e deram amparo, falou: 'a gente morre como a gente vive'. Ela ficou chocada com quanta gente que ia lá, cantava, a farra que estava sendo. É bem isso mesmo, o Hugo morreu como viveu: cheio de gente, de afeto, de amor". Assim definiu Luiz Ferreira, ator da Agrupação Teatral A Macaca (ATA), a vida de Hugo Rodas.
Legado
As palavras eram demonstradas por todos que foram se despedir do diretor teatral uruguaio que, desde a década de 1970, escolheu Brasília como capital de seu legado. A atriz Iara Pietricovsky, amiga e parceira de longa data, aponta como a visão de mundo do artista partia daqui.
"Brasília era seu mundo, seu cosmo, o útero no qual ele produziu uma centena de milhares de filhos e filhas, esculpiu atores e atrizes, fez espetáculos que fez muita gente rir e chorar, amar, ter prazer estético. Ele foi o maior diretor que essa cidade teve, o maior artista de teatro desta cidade. E eu acho que ele foi um dos grandes do país", elogia a amiga.
Colaboradora de Rodas desde que ele chegou à cidade, Iara relembra, ainda, o impacto que o diretor teve enquanto docente do curso de artes cênicas da Universidade de Brasília (UnB) e ressalta o compromisso que Hugo tinha com o teatro.
"Ele formou muitos atores, foi para a UnB, com notório saber. Porque ele construiu isso cotidianamente. Eu sou uma testemunha dos últimos 48 anos da vida dele, dessa construção. Ele sempre dizia que eu era a atriz mais "hugorrodiana" dele, porque eu tenho esse temperamento muito parecido com ele e era onde a gente se amalgamava", relembra.
O velório do artista foi incomum: uma tristeza se misturava à alegria em festejar sua vida. A cerimônia aconteceu no Teatro Galpão, com direito a cenografia de palco e banda d'A Macaca tocando as músicas preferidas do mestre. Jovane Nunes, da companhia Os Melhores do Mundo, afirma que o tom do adeus fez jus ao homenageado.
"Estou extasiado com a alegria que isso aqui [o velório] foi. Era tudo que o Hugo queria: o teatro cheio, cenário bonito, pessoas cantando e com muito amor envolvido. É uma passagem, mas é uma passagem feliz. No começo da cerimônia, estava tocando uma música que ele gostava muito. 'Gracias a la vida que ha me dado tanto', imaginei o quanto a vida deu coisas boas a ele e a nós também, que nos deu ele", diz Nunes.
Rastro na cidade
André Araújo, ator da ATA, celebra a abrangência transgeracional que Rodas tinha e a linguagem teatral própria que desenvolveu. "Ele morre, mas o que ele trouxe não porque a gente está aí. Está registrado em uma linguagem, nosso grupo carrega uma linguagem que nós desenvolvemos com ele. Mas o Hugo era um dos últimos baluartes, dos velhos que mostravam para nós o que é teatro. Nesse velório tem gente de 20 anos e de 70, é incrível. Ele conquistou isso aí. Ele estava velho, mas manteve a mente dele sempre fresca. Tendo vivido outras épocas, ele se mantinha na atual. O Hugo deixou um rastro pela cidade."
Muitos dos presentes foram, antes de colegas de trabalho, pupilos de Hugo Rodas. Luiz Ferreira conta como o contato dos estudantes com Hugo era um divisor de águas. " Era o encontro com o mestre: ou você dá pra isso ou melhor ir pra outra coisa. Desde o começo ele já te provocava, de imediato" elogia Ferreira. "Todos os trabalhos que eu faço hoje fora do grupo [ATA], em outras áreas artísticas, percebo que o Hugo está comigo o tempo todo. Tenho um Hugo interno, penso na simetria das coisas, o equilíbrio, o volume, a ocupação do espaço, tudo."
*Estagiárias sob a supervisão de Severino Francisco
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