Obituário

Morre Dom João Evangelista Martins Terra, aos 97 anos

Internado há algumas semanas, o bispo auxiliar morreu nesta sexta-feira (11/3). Sepultamento será realizado no sábado, na Catedral de Brasília

O bispo auxiliar emérito de Brasília, Dom João Evangelista Martins Terra, morreu, aos 97 anos de idade, após ficar internado algumas semanas. Nesta sexta-feira (11/3), o Instituto Bíblico Divino Mestre informou a morte por meio de nota. Leia na íntegra o pronunciamento:

“Com profundo pesar, o Instituto Bíblico Divino Mestre informa que nosso fundador e bispo auxiliar emérito de Brasília, Dom João Evangelista Martins Terra, faleceu nesta sexta-feira, 11 de março de 2022, aos 97 anos de idade”, disse o texto.

Nascido dia 7 de março de 1925, em Jardinópolis, Município de São Paulo, o pontífice foi ordenado sacerdote em 22 de dezembro de 1956, no Rio de Janeiro. Alguns anos após tornar-se padre, Dom João ingressou na companhia de Jesus em 1964, e, em 1988, recebeu a Ordenação Episcopal na cidade de São Paulo, adotando o lema: “Cum Christo Et In Ecclesia” (“Com Cristo e Na Igreja”).

Por meio das redes sociais, o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), prestou homenagem ao presbítero. “Um homem bom, querido por todos, biblista de renome, estudioso com centenas de obras publicadas. Assim era Dom Terra, bispo auxiliar emérito de Brasília, que faleceu hoje aos 97 anos, provocando profundo pesar na comunidade cristã do Distrito Federal”, declarou o chefe do executivo local.

A arquidiocese de Brasília divulgou que o velório acontecerá no sábado (12/3), às 7h, na Catedral Metropolitana de Brasília. A missa de corpo presente está marcada para 11h. O sepultamento será realizado na cripta da Catedral, após a cerimônia.

História

Natural de Jardinópolis, em São Paulo, Dom Terra vivia há pouco mais de dois anos na sede do Instituto Bíblico Divino Mestre, onde pôde compartilhar os últimos momentos com alunos e devotos que trabalham no local — pessoas que ele tratava como família.

Foi no escritório dele, com uma imensa biblioteca, que ele preservou o hábito que amigos e alunos afirmam ser o preferido: estudar sobre a Bíblia e sobre Deus. “Tem alguns fatos que me impactaram na vida de Dom Terra. Um deles, foi logo no começo. Quando eu o encontrei pela primeira vez, com 94 anos, ele estava no escritório, rodeado de livros, estudando”, lembra o irmão Bruno Cruz, morador e colaborador do Instituto Divino Mestre.

“Me apresentaram a ele e o bispo abriu um sorriso largo e fez questão de ficar de pé para me receber, mesmo com as dificuldades”, lembra. “Ele foi um homem de coração largo, muito acolhedor. Além de ser um grande homem de conhecimento, era um homem de grandeza de coração. O amor pela Santa Missa, por Nossa Senhora, e pela igreja me marcaram”, frisa Bruno.

Foi o amor a Deus e às pessoas que levou João Evangelista a se tornar padre, em 1956, aos 31 anos, no Rio de Janeiro. Cinco anos depois, integrou a ordem religiosa Companhia de Jesus, cujos membros são conhecidos como jesuítas. Após servir em Recife, ele foi ordenado bispo em 1988, em São Paulo.

Apaixonado por conhecimento e com anseio de ajudar outras pessoas a entenderem mais sobre a fé e sobre a história da religião no mundo, Dom Terra se propôs a escrever sobre os estudos feitos nas formações acadêmicas que conquistou. Ele é doutor em teologia, filosofia e arqueologia.

O resultado foi uma extensa bibliografia de mais de 220 obras publicadas no Brasil e no Mundo. Uma delas lhe rendeu o Prêmio Jabuti, na categoria Religião, em 2000: O Deus dos indo-europeus, publicado pela editora Loyola. Além disso, Dom Terra deu aula em diversos seminários dentro e fora do Brasil e pôde auxiliar novos professores e sacerdotes no começo da carreira.

Em 1994, chegou a Brasília e atuou como bispo auxiliar na Arquidiocese de Brasília, como auxílio do cardeal José Freire Falcão, na época, arcebispo da capital federal. Depois, se tornou bispo emérito de Brasília.

Material cedido ao correio - Dom João Evangelista Martins Terra, morre aos 97 anos

Mais do que títulos e reconhecimentos pelos escritos produzidos, Dom Terra impactou os fiéis com os quais viveu nos últimos 65 anos. A catequista e professora aposentada Maria Maura Figueiredo compartilhou fotos de momentos que viveu com o Dom Terra desde a chegada dele na capital federal.

“Hoje nosso amigo querido, Dom Terra, foi para o céu. Te amo muito, amigo querido! Interceda por nós, no céu”, escreveu em uma homenagem nas redes sociais. Já Jefferson Gomes, fiel e cerimoniário, agradeceu pelo bispo ser uma inspiração para a vida religiosa dele.

“De uns tempos pra cá, devido a idade, ele começou a andar sempre com um seminarista ao seu lado para ajudar a andar, mas o que sempre me impressionou era que nos eventos que a igreja promovia ele sempre estava lá. Diversas missas que participei na Esplanada ele deixava muito mais belas. Pude aprender com ele diversas coisas para o meu ministério de cerimoniário. São João Paulo 2 tem orgulho de tudo que ele criou aqui em Brasília”, declarou o fiel.

O Padre José Ronaldo Oliveira, de Minas Gerais, fez questão de definir Dom Terra e agradecer pelos ensinamentos. “Grande professor da Bíblia! Apaixonado pela palavra de Deus! Meu carinho e gratidão pelos vossos ensinamentos na teologia aqui no Seminário Maior, em Patos de Minas”, disse o ex-aluno.

Já Luis Rogério, que também o conheceu pelos livros publicados, diz que Dom Terra é insubstituível. “Um dos poucos insubstituíveis. Como eu o admirava, e admirava mesmo. Seus livros são verdadeiramente alimentos espirituais, principalmente um que ele tem sobre o evangelho de São João. Chegou a hora de receber a recompensa por todo bem que fez, por todo serviço que prestou, em especial à Santa Igreja. Descanse em paz, dom Terra; seja Cristo a tua recompensa!”, disse.

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) emitiu nota sobre o falecimento de Dom Terra. “Em preces pela alma de dom João Evangelista, damos graças a Deus pelos seus anos de dedicação, especialmente dedicados à esta igreja particular. Diante do testemunho dedicado de dom João, reiteramos a certeza de que a vida sempre vence a morte. Reafirmamos, ainda, a certeza de que, mesmo diante da morte, somos sempre convidados a nascer de novo”, escreveram a nota assinada pelo presidente da CNBB, Dom Walmor Oliveira de Azevedo e outros membros da diretoria da instituição.

O sonho conjunto com Papa João Paulo II


Responsável pela formação de professores para seminários nacionais e internacionais, o Instituto Bíblico Divino Mestre foi concebido ainda em 1994, mesmo ano da chegada de Dom Terra à Brasília.

Facebook/Reprodução - Dom Terra em encontro com o Papa Francisco, líder da Igreja Católica desde 2013

O religioso, que estava há 10 anos no Vaticano, e chegou a trabalhar no jornal L’Osservatore Romano e a servir os papas São João Paulo II e Bento XVI, compartilhou com o primeiro sobre a ideia de criar um local para compartilhar e multiplicar estudiosos.

“Em 1994, falei com o Papa João Paulo II sobre a conveniência de fundar no Brasil um instituto bíblico, semelhante ao de ROma, mas insistindo no conhecimento das línguas bíblicas — hebraico, grego e também latim — para formar formadores e professores em nossos seminários. O Papa ficou entusiasmado com a ideia. ‘A coisa mais importante é formar formadores’, disse-me ele”, diz um trecho de uma memória escrita por Dom Terra e registrada no site do Instituto Divino Mestre.

Terra queria que o instituto atendesse apenas pessoas do Brasil, mas o Papa abriu os olhos dele para uma visão maior: um local que atenda toda a América Latina. Para isso, João Paulo II falou que ele teria que estar em uma posição central e de fácil acesso no Brasil e enviou Terra para a Arquidiocese de Brasília.

“O Arcebispo de Brasília, Cardeal Dom José Freire Falcão, deu todo o apoio e deu um terreno para a construção. No dia 21 e dezembro de 2001 reuniu-se em Brasília, na "Casa do Clero", situada em SGAN, Quadra 601, uma comissão fundadora, que contava com a presença de três bispos, quatro jesuítas e um diácono para elaborar o Estatuto do Instituto Bíblico de Brasília e lavrar a Ata de Fundação”, lembrou Dom Terra.

Em 2002, a pedra fundamental foi lançada e quatro anos depois o Instituto foi inaugurado. “Para a construção, Dom Terra fez um itinerário por recursos. Ele escreveu cartas para muitos amigos mundo afora pedindo ajuda para levantar o local. Ele foi atendido. Por isso, contamos que temos 20 anos de existência, porque nossa história começou antes da inauguração”, conta Bruno.

Nos anos seguintes, diversas turmas foram abertas e concluídas, alunos chegaram e saíram e outros permaneceram. Eles eram os fiéis ao lado de Dom Terra, com quem passou os últimos momentos. “Nos últimos oito dias que ficou com a gente, entre uma alta e a nova internação em que permaneceu até o falecimento, ele fazia questão de ministrar a nossa missa, mesmo de cadeira de rodas”, revela Bruno, emocionado.

Agora, ele afirma que os fiéis do Instituto planejam continuar o legado de Dom Terra. “A gente tem esperança de continuar, de permanecer. Inclusive, estamos com turmas marcadas para iniciar, de grego e latim. Nós iremos continuar aquilo que Deus colocou no coração dele e que ele nos passou. Iremos dar continuidade no legado”, declarou Bruno.

 

Saiba Mais

Material cedido ao correio - Biblista renomado, dom João Evangelista Martins Terra publicou mais de 200 livros pelo mundo
Facebook/Reprodução - Dom Terra em encontro com o papa Francisco, em 2013