Os taguatinguenses foram surpreendidos por uma cena surreal na semana passada, com o desfile de uma misteriosa dama de vermelho, acompanhada de um séquito de homens armados com fuzis, escopetas e pistolas na Avenida Samdu. As imagens circularam pelas redes sociais. Pode ser somente exibicionismo proporcionado pela internet.
Mesmo assim, ele é perigoso e pode ameaçar a vida. O noticiário está inundado de uma avalanche de notícias de violência. O culto e a liberação de armas só intensificará e agravará o problema. Alega-se que o faroeste cafona de Taguatinga é uma cena inocente, que realiza um desejo de uma consultora de vendas, a pretexto de fazer um ensaio fotográfico de pré-casamento.
No entanto, ela é reveladora do glamour que as armas de fogo adquiriram. Não se trata apenas de mau gosto. O culto às armas é uma política em que só os fabricantes, os políticos irresponsáveis e os delinquentes são beneficiados. Ela está sendo estimulada em nome da defesa da liberdade. Mas basta percorrer o noticiário para perceber a relação entre a escalada da violência e o acesso às armas.
Questiúnculas afetivas, de trânsito, de desavenças em casas noturnas ou nas imediações de estádios se transformam em tragédias pelo uso de armas. Não é verdadeiro o argumento de que a arma garante a segurança do cidadão. O histórico de reação dos cidadãos comuns a assaltos é amplamente desfavorável. Baseadas nas estatísticas, as autoridades policiais não recomendam essa atitude.
E não podemos esquecer que, ao ser abordado por dois meliantes, na parada de um semáforo, no bairro de Vila Isabel, em 4 de julho de 1995, no Rio de Janeiro, o presidente da República, que tanto alardeia o culto às armas, entregou a moto Honda Shara e a pistola Glock calibre 380 aos bandidos, sem esboçar a mínima reação. No dia seguinte, Bolsonaro declarou que se sentiu indefeso no momento do assalto.
O Senado debaterá projeto de lei para votar novas regras para o uso de armas de fogo. A flexibilização proposta pela Câmara dos Deputados é algo de uma irresponsabilidade inominável, que terá graves consequências. Em um cenário de aceleração das desigualdades sociais, desestruturação das famílias e glamourização da violência, a flexibilização das armas é uma tragédia anunciada.
Existe uma clara e quantificada relação entre a violência e o uso de armas de fogo. Ela é o principal instrumento utilizado para matar mulheres da maneira mais covarde, segundo dados do Instituto Sou da Paz. A política de flexibilização é um atestado da incompetência do Estado para cuidar da segurança pública. Segurança pública não é sinônimo de violência de todos contra todos; é uma questão e um direito de cidadania.
Espero que o Senado barre mais essa insensatez aprovada por uma Câmara dos Deputados encerrada dentro da bolha do Orçamento secreto, completamente omissa em relação aos problemas reais do país e servil aos interesses políticos mais insanos. É preciso que os eleitores registrem, com muito carinho, os nomes dos que apoiam essa proposta destrambelhada, visando às próximas eleições. Quem é verdadeiramente cristão não pode votar a favor de um projeto que aumentará, ainda mais, a escalada da violência.