Pandemia

Estudo mostra elevada taxa de mortes por covid-19 no DF em 2020

Publicado este mês, pelo MInistério da Saúde, o estudo que traça um raio X da pandemia no país fevereiro de 2020 a janeiro de 2021; para especialistas, o resultado do mapeamento é um reflexo da falta de vigilância epidemiológica na capital

O Distrito Federal está entre as unidades federativas com maior taxa de mortalidade registrada em 2020: foram 1.397 óbitos por milhão de habitantes. O dado faz parte de uma análise do Ministério da Saúde, publicada neste mês, que traça um raio X da pandemia no país no período que vai de 26 de fevereiro de 2020 até 2 de janeiro de 2021. Para especialistas, o resultado do mapeamento é um reflexo da falta de vigilância epidemiológica na capital federal, que sofre, ainda hoje, com a ineficiência de políticas públicas relacionadas ao enfrentamento da covid-19.

A análise detalha, ainda, a crise que aconteceu no Complexo Penitenciário da Papuda, que viveu um surto de covid-19 entre 1º de abril e 17 de julho de 2020. De acordo com o levantamento, dos 1.877 casos registrados no período, 1.648 (87,8%) ocorreram entre os integrantes da população privada de liberdade; 201 (10,7%) entre policiais penais; 17 (0,9%) entre profissionais da saúde; e 11 (0,6%) entre trabalhadores de serviços terceirizados. A letalidade geral por covid-19 foi de 0,2%. Para o doutor em saúde pública e professor na Universidade Católica, Roberto José Bittencourt, o estudo revela que não houve medidas eficazes de combate à pandemia.

De acordo com Roberto, existem três modelos de combate à disseminação do vírus, conforme definido pela Organização Mundial da Saúde (OMS): supressão (isolamento seletivo), contenção (distanciamento social e uso de máscaras, por exemplo) e inação. "O modelo de inação significa deixar a infecção acontecer e, através da contaminação ou imunidade em massa, as taxas caem. À medida que as pessoas ficam doentes, o sistema de atenção hospitalar entra em ação", diz.

O especialista avalia que no DF houve falta de vigilância epidemiológica. "Nós tínhamos, todos os dias, o levantamento de casos e óbitos no DF. Os agentes das UBSs tinham que ser notificados e as equipes deveriam visitar essas pessoas contaminadas, realizar o isolamento e, dessa forma, fazer a supressão e contenção do vírus. Mas isso não foi feito", lamenta.

Para Roberto, ainda hoje colhemos a consequência das altas taxas registradas no primeiro ano de pandemia. S consequência biológica são as sequelas, mas há também o ponto de vista coletivo. "A economia não consegue se reestruturar, são ondas e ondas de contaminação que afastam as pessoas das ruas, da convivência, de uma economia que precisa se reerguer", aponta. Ele diz que é preciso que o governo aja. "Nenhuma sociedade vai se reerguer sem a participação do governo, e ele existe para isso. Para quando houver uma tragédia, providenciar uma forte ação estatal. Muitas lições ficaram, do ponto de vista individual, de política, de saúde, de estrutura hospitalar, de turbinar a atenção básica, reestruturar a vigilância epidemiológica", completa.

O Correio procurou a Secretaria de Saúde e questionou acerca das medidas adotadas durante o período de 2020. Até a publicação da reportagem, a pasta não se pronunciou.

A família da psicóloga Renata Teixeira, 38 anos, viveu de perto os rastros que a pandemia deixou. Além de ser contaminada durante o pós parto, ela conta que sofreu o luto de perder o padrinho para a doença, em maio do ano passado. "Foi um momento muito difícil porque aconteceu no auge dos casos do ano passado, não tinha mais vagas nos hospitais para UTI", diz. Ela lembra que a família se mobilizou para buscar uma vaga na unidade de tratamento intensiva, e o padrinho ficou cerca de 50 dias internado. "Ele faleceu no dia do meu aniversário. A perda foi um baque para todos nós porque ele era um homem forte, e infelizmente a vacina não chegou em tempo pra ele. Se ele tivesse se vacinado estaria aqui, com certeza", lamenta.

Renata conta que após todo o sofrimento da família, fica o sentimento de impotência, dor e raiva. "Como o governo se despreocupou em fazer a parte dele. Tudo poderia ter sido diferente para muitas famílias. Assim como para minha. Fica um vazio. 

A estudante universitária Sara Moreira Mota, 22, conta que também se contaminou com o vírus. No final de setembro do ano passado, recebeu o diagnóstico. "Amanheci num sábado cedo desconfiando da minha temperatura e vi que era febre. Tive um mal estar horrível, dores no corpo e resolvi fazer o teste", recorda. Ela diz que os sintomas foram leves. "A vacina serve como atenuante de sintomas, e, por isso, a sua importância. As pessoas se descuidam, o que acaba não ajudando em nada a situação da nova variante", completa.

Complexo Penitenciário

Já é sabido que o novo coronavírus pode se espalhar amplamente em ambientes confinados como as instituições penais. O sistema prisional do DF, por exemplo, viveu um surto de covid-19 em 2020. Segundo o epidemiologista Wildo Navegantes de Araújo, a ocorrência destes surtos se dá pelas falta de iluminação por incidência solar, umidade, falta de distanciamento e dificuldade de implementação das demais medidas de controle da pandemia.

Ele compara a transmissibilidade da covid-19 a "uma faísca em gasolina". "A doença se dissemina muito rapidamente, podendo demandar leitos clínicos e de UTI, em espaço curto de tempo. Seja para a massa prisional, seja para os profissionais que trabalham no sistema, além de familiares que os visitam", ressalta.

A reportagem procurou a Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seape). Até a publicação da reportagem, a pasta não se pronunciou.

Região e óbitos por milhão de habitantes

Sul
1º) Rio Grande do Sul - 782
2º) Santa Catarina - 730 
3º) Paraná - 695 

Sudeste
1º) Rio de Janeiro - 1.475
2º) Espírito Santo - 1.258 
3º) São Paulo - 1.011 
4º) Minas Gerais - 565

Nordeste
1º) Ceará - 1.090 
2º) Sergipe - 1.078 
3º) Pernambuco - 1.006 
4º) Paraíba - 914 
5º) Piauí - 868 
6º) Rio Grande do Norte - 847
7º) Alagoas - 747 
8º) Maranhão - 634 
9º) Bahia - 615 

Norte
1º) Amazonas - 1.266 
2º) Roraima - 1.247 
3º) Amapá - 1.076 
4º) Rondônia - 1.016 
5º) Acre - 892 
6º) Pará - 830 
7º) Tocantins - 779 

Centro-Oeste
1º) DF - 1.397 
2º) Mato Grosso - 1.269 
3º) Goiás - 957 
4º) Mato Grosso - 840 

 

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