Jornal Correio Braziliense

Trama perversa

"Como professora universitária que executou muitos projetos de formação profissional na área de drogas, de dependências químicas e para a implementação da política de socioeducação — onde se encontram os jovens que se inserem na criminalidade pelo envolvimento com drogas —, sempre me impressionou a qualidade dos profissionais da rede pública do DF, bem como o desejo de aperfeiçoar seus conhecimentos nessa temática que ainda está muito pouco reconhecida na formação profissional — até na formação universitária.

Então, deixo como meu primeiro destaque: seja mantida a oportunidade para qualificação de qualidade para todos os profissionais que se dedicam ao cuidado, à assistência e à prevenção do uso de drogas nos diferentes campos de atuação. Essa formação inclui, no meu entender, oportunidades e trocas constantes entre os profissionais, mediadas pelo que chamamos de intervisão — um espaço de compartilhar novos saberes para construirmos novos fazeres.

Entramos, aqui, no campo de outras políticas essenciais tais como políticas de segurança e de promoção de direitos humanos, sem falar em políticas de redução da criminalidade que estão sendo responsáveis pelo maior contingente de encarceramentos na rede prisional brasileira. E, aqui, a triste realidade que não quer e não podemos deixar calar: o poder paralelo do tráfico de drogas que domina as prisões. E a mancha maior que nos dilacera: a mortalidade juvenil de nossa juventude usada como mão de obra fácil e barata nesse negócio que cada vez mais enriquece, sempre às custas dos mesmos que todos sabemos quem são, mas não conseguimos pautar nem nas campanhas eleitorais e, tampouco, nas políticas educacionais. A prevenção deve ser feita fortalecendo o território educativo em sua dimensão protetiva e de inserção social dos jovens.

Aprofundar o conhecimento dessa delicada interface entre drogas e violência é o grande desafio, no meu entender, para aprofundamento em todas as áreas do conhecimento. Muita gente acha que a política sobre drogas está reduzida à descriminalização, quando, na verdade, se trata de avançarmos nas políticas do controle desse comércio que traz riscos aos usuários tanto sendo drogas lícitas quanto ilícitas.

Cada um de nós tem sua parte nessa história, e não devemos esperar para atuar de forma competente e engajada no cuidado daqueles que adoecem pelo uso abusivo de drogas e daqueles que se inserem no comércio de varejo e colocam suas vidas em risco, em uma trama complexa e perversa entre ganhar e perder a vida."

Maria Fátima Olivier Sudbrack, professora titular do Departamento de Psicologia Clínica da Universidade de Brasília (UnB)