Em meio à arquitetura rígida e permanente do prédio do Instituto Central de Ciências (ICC), da Universidade de Brasília (UnB), plantas tropicais e nativas do cerrado dão um toque especial ao corredor e aos canteiros laterais do prédio. A diversidade de espécies, que vão desde flores como capim estrela até plantas comestíveis, como a rúcula ou o grão de mostarda, compõem o chamado Jardim de Sequeiro, que vive seu segundo ciclo de floração. Com o cumprimento total de 730 metros e mais de 5 mil metros quadrados de área plantada sobre laje, o jardim cresce sobre uma fina camada de terra e chama a atenção dos frequentadores do vão central do prédio da UnB.
A revitalização do espaço surgiu da vontade de aproveitar a área dos canteiros do ICC, que não tinha constância no trabalho paisagístico. Sob coordenação do professor de paisagismo da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária (FAV) Júlio Barêa Pastore, em parceria com a prefeitura da UnB, a ideia virou projeto de extensão em 2020 e, atualmente, cerca de 30 pessoas, entre alunos, servidores e voluntários, trabalham para manter o espaço florido. "Esse é um jardim experimental, então, esperamos que melhore todo ano. O jardim do primeiro ano multiplicou as sementes que tínhamos. Ano passado, utilizamos seis ou sete quilos de sementes de flor. Neste ano, foram quase 50 quilos. Além disso, houve melhoria na composição, ou seja, na forma como organizamos as plantas. Isso fez o jardim ficar muito mais rico", reitera o professor.
De acordo com Júlio, há vários fatores do Jardim de Sequeiro que o torna único, dentre eles, o desenho naturalista. "Ou seja, não tem manchas (áreas com espécies de plantas definidas). Enquanto que no jardim tradicional há um canteiro, em que uma só espécie é plantada, no jardim naturalista você planta cinco, dez espécies juntas, porque tem a sensação de que ele é mais natural. Então, há espécies convivendo, e isso traz muitas vantagens, porque, no jardim com uma só espécie, gera um ciclo curto de floração, e você precisa refazer o canteiro após. Já no jardim naturalista, como há muitas espécies, você pode prolongar o tempo. Enquanto algumas terminam seu ciclo, outras iniciam", explica.
Segundo o professor, o ciclo de floração do Jardim de Sequeiro ocorre durante o período chuvoso. "O jardim é plantado na chuva. A gente semeia em novembro ou no começo de dezembro, quando a chuva está forte, e ele começa a florescer com 60, 70 dias. Neste ano, em 10 de janeiro ele já estava bonito", conta. "Ele muda as cores e vai florescendo até a chuva acabar. Como as plantas não têm condições de aprofundar as raízes, se parar de chover durante 15 dias elas ficam secas. Mas, ainda assim, pode ser admirado, porque as pessoas podem acompanhar a mudança das estações", complementa.
Agora, há uma grande expectativa: que o ICC volte a ser o ponto central da vida acadêmica da UnB e que o jardim se torne, de fato, público. "Começamos a desenhar o jardim em reuniões remotas, durante a pandemia. No primeiro ciclo, ninguém podia acessar a UnB. O jardim foi uma atividade que as pessoas conheceram pelas fotos", explica Júlio. "Neste ano, novamente trabalhamos a distância, mas nos esforçamos para que, quando as atividades voltassem, o jardim já estivesse bonito. Apesar da menor intensidade das atividades devido à variante ômicron, alunos e professores têm frequentado bastante, porque todos lembram que o jardim do ICC tinha morrido", conta.
Visitas (in)esperadas
O colorido do jardim tem chamado a atenção de várias pessoas que fazem visitas diárias ao espaço. Por isso, a organização do projeto abriu espaço para aqueles que desejam fazer visitas guiadas, abertas ao público. Elas acontecem todos os dias, das 8h às 10h (veja Serviço), com número limitado de pessoas e com a apresentação do comprovante de vacina. Além disso, a expectativa é iniciar oficinas no espaço, que vão desde pintura em aquarela, fotografia, coleta de sementes, arranjos florais e até manejo de abelhas.
Bolsista do projeto e estudante do 7º semestre do curso de engenharia florestal, Maria Eduarda Curado Picorelli, 23 anos, é uma das responsáveis pelas visitas. Ela conta que aqueles que decidem visitar o espaço sempre se surpreendem. "Normalmente, são pessoas que acompanham o jardim pelas redes sociais e acham que as fotos foram tiradas sob algum ângulo e que não é tudo aquilo. Mas percebo que quando chegam, sempre se surpreendem com a biodiversidade dos canteiros e veem que esse espaço é real", diz.
Maria Eduarda explica que tornou-se comum a visita de inquilinos com asas no prédio do ICC. "As pessoas que frequentam aqui sempre se surpreendem com a quantidade de fauna que aparece. Vão desde abelhas a borboletas e passarinhos, e é sempre em grande quantidade", diz. A estudante conta que até a criação do Jardim de Sequeiro, não havia diversidade de fauna no espaço. "Antes era completamente diferente. O Jardim Central estava parado, então, é bem legal ver essa diferença. A UnB está voltando a ter vida, e o ICC virou um local atrativo, as pessoas param para olhar, querem tirar fotos. Eu amo vir aqui, tenho uma rotina de visitação, porque é um jardim que muda rápido. De uma semana para a outra, há novas espécies florindo", conta.
Mão na Massa
Estudante do 7º semestre de ciências ambientais da UnB, Brenda Cristina Souza Vieira, 21, também é bolsista do projeto de extensão Jardim de Sequeiro e conta que a iniciativa tem proporcionado novos aprendizados. "A gente mexe com a prática de jardinagem, então selecionamos sementes coletadas dentro do ICC, nas rotatórias da UnB, para posteriormente semearmos e darmos início a um novo ciclo", conta. Além disso, Brenda diz que os estudantes envolvidos no projeto fazem o plantio das mudas, semeadura, irrigam e fazem o monitoramento da germinação. "É um projeto bem mão na massa", pontua.
Apesar do trabalho, a estudante conta que o espaço se tornou um de seus locais favoritos dentro da universidade. "O meu curso não estava tendo aula presencial no ICC, então, eu passo para ver quais plantas floresceram. Às vezes, não tem nada para fazer, e eu vou lá para tirar fotos e apreciar a vista", conta.
Para Brenda, o local se tornou um porto seguro para os estudantes. "Como a universidade é um ambiente cansativo, acho importante ter um lugar para se refugiar dentro do câmpus. Então, quando estamos com a cabeça cheia das aulas, ao sair da sala e ver aquelas flores e o sol, o aluno consegue se refrescar. Dá a sensação de alívio, é um ambiente mais acolhedor e saudável", reitera.
Aprendizados
Em meio aos dias sombrios que a pandemia trouxe para o brasiliense, o espaço florido e refrescante tornou-se motivo de alegria para as pessoas que trabalham no local. É o que explica o estagiário da Coordenação de Parques e Jardins (CPJ) da UnB Willian Jeferson do Nascimento, 27. "Durante a pandemia, vimos a UnB mais melancólica, e quando ela vai ganhando cores, se torna algo alegre, divertida. O jardim representa aquilo que a UnB é: diversidade", complementa.
Para Willian, o jardim reforça a importância da calma durante o período pandêmico. "Começamos com aquela ideia de que as coisas devem acontecer mais rápido, e o jardim mostra que é preciso paciência. Ele está florido agora, mas existe um processo ao longo de todo o ano, e isso se assemelha à vida. Temos que esperar os bons resultados chegarem, não adianta apressar o processo", complementa. "Tem muita gente com pressa de que a pandemia acabe, mas esquece que é um momento de organizarmos nossas ideias, de aproveitar aquilo que estamos vivendo e tentar mudar o caminho", reitera.