Por muitas vezes, a inclusão no cadastro de inadimplentes é uma surpresa para o consumidor quando não há inadimplência. É muito comum que a negativação indevida aconteça por diversos motivos, como o de cobrança de serviços não solicitados ou que já foram cancelados, cobranças de compras fruto de fraude, dentre outros. As razões para esse tipo de imprevisto são diversas, mas ele é inadmissível justamente porque o consumidor passa a ter certas restrições, seja para um aluguel, um financiamento, para adquirir cartão de crédito ou empréstimo.
Houve uma diminuição significativa no número de reclamações referentes ao problema, porém, os números ainda seguem altos. Segundo o Instituto de Defesa do Consumidor (Procon-DF), em 2020, foram registradas 579 queixas de negativação indevida; já em 2021 foram 283. Neste ano, entre 1º de janeiro e 22 de fevereiro, foram 61 ocorrências. Os setores que mais geram reclamações foram instituições financeiras, administradoras de cartão de crédito e bancos.
A autônoma Clausineia Mano, de 45 anos, foi uma das pessoas que passaram por esse tipo de situação. A microempreendedora planejava comprar uma casa, e toda a documentação de entrada estava pronta. Assim que foi dar continuidade ao processo, verificou que seu nome estava negativado em uma instituição financeira que ela tinha o parcelamento de um débito. Porém, Clausineia não estava devendo nenhuma parcela, todos os pagamentos estavam em dia.
"Assim que fiquei sabendo disso, fui até a instituição para saber a razão do problema. Uma atendente conferiu no sistema e também não encontrou nada sobre, e não conseguiu me esclarecer a razão da negativação do meu nome. Ela me passou um número para que eu entrasse em contato, mas o atendimento não foi muito bom, não me ajudaram. Simplesmente não consegui resolver nada. O tempo estava passando e eu não conseguia finalizar o processo de compra da casa que eu queria", relata.
Após ligar para o número indicado e não obter uma solução, a autônoma retornou à instituição financeira, mas ainda assim ninguém sabia dizer a ela o que estava acontecendo. "Como eu já não sabia mais o que fazer, eu fui no SPC-CDL para procurar a razão do problema e vi que meu nome só constava como inadimplente naquela instituição financeira. Voltei lá e expliquei para a atendente a situação para receber uma ajuda, mas ela simplesmente disse que não podia fazer nada", conta.
"Pelo descaso, eu entrei na Justiça. Expliquei a situação para um advogado, que pediu que eu apresentasse os comprovantes de pagamento do parcelamento que eu havia feito", acrescenta, com indignação. Mais uma vez, a autônoma foi até a instituição e falou que havia entrado na Justiça. "Ironicamente, quando eu falei isso, descobriram a razão da negativação. Mas, realmente, eu não tinha culpa. Não tinha sido inadimplente e dei continuidade ao processo", explica.
Clausineia ganhou a ação, e, de imediato, a negativação do seu nome deveria ser retirada. Porém, o problema da autônoma não acabou. "Limparam meu nome no Serasa, mas no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal (Cadin) não foi limpo. Só após dois meses consegui que ele fosse limpo", explica.
Garanta seus direitos
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) determina que a inscrição do consumidor em cadastro de inadimplentes, além de atitude plenamente possível, é um exercício legal do direito da empresa credora, desde que, implementado seguindo fielmente os requisitos impostos no ordenamento jurídico. Assim, de acordo com a doutrina e jurisprudência, é necessário o preenchimento dos seguintes pressupostos: existência de um débito do consumidor, que a dívida a ser inscrita esteja vencida, que o valor seja líquido e certo, e que haja aviso: esse se justifica para que seja dada a oportunidade ao devedor de quitar com o montante ou para que ele possa corrigir erros que eventualmente estejam na inscrição.
Dessa forma, a ausência de preenchimento de quaisquer dos requisitos pode ensejar em inscrições indevidas do consumidor em cadastro de inadimplentes. Consequentemente, as causas podem ser variadas, como, por exemplo, dívida já quitada, inexistente ou prescrita, fraude e inscrição não comunicada. Caso a negativação tenha ocorrido em virtude de uma cobrança que já foi paga, o nome do consumidor deverá ser retirado em até cinco dias úteis dos cadastros de restrição ao crédito. Caso não seja retirado, constata-se a negativação indevida. Por fim, ressalta-se que, com base no CDC, as dívidas superiores a cinco anos deverão ser excluídas dos cadastros de proteção ao crédito.
Segundo a advogada Isabelli Carvalho, membro da comissão de direito do consumidor da OAB/DF, assim que o consumidor se deparar com esse tipo de situação, ele deve confirmar a negativação do seu nome em consulta ao seu CPF nos sites como Serasa e SPC. Logo em seguida, salvar as telas que comprovem que o nome foi inscrito nos cadastros de restrição ao crédito. "Caso o consumidor já tenha pago a dívida, é importante salvar todos os comprovantes de pagamento. Após a verificação das informações da empresa que negativou o nome, o consumidor poderá entrar em contato com a empresa informando sobre a negativação indevida para buscar solucionar a questão", explica.
O consumidor pode recorrer ao Procon e fazer uma reclamação para que a empresa seja notificada a prestar esclarecimentos ou até mesmo instaurar processo administrativo, e a empresa ser condenada ao pagamento de multa. Além disso, poderá buscar a Defensoria Pública ou Núcleos de Práticas Jurídicas caso não tenha condições financeiras de contratar um advogado para o auxílio jurídico. Por fim, o consumidor, com toda a documentação comprovando a inscrição indevida, também poderá entrar com processo no Judiciário, por meio do Juizado Especial, uma vez que nas causas de valor até vinte salários mínimos não é obrigatória a assistência do advogado. Com a empresa concordando com a negativação indevida, ela deverá solicitar aos órgãos de proteção ao crédito a baixa da dívida do consumidor em até cinco dias. Posteriormente a baixa da negativação, é importante para a empresa que comunique o consumidor.
Danos morais
A advogada Raíssa Lopes esclarece sobre o que deve ser feito caso haja a recusa na resolução da situação e a permanência da negativação indevida. "O consumidor deverá juntar toda a documentação que comprove a negativação indevida e fazer reclamação no site Reclame aqui ou em consumidor.gov.br, e, se possível, no Procon. Se não for possível solucionar o caso extrajudicialmente, então, recomenda-se que o consumidor procure uma orientação jurídica por meio de um advogado para análise do caso concreto", esclarece.
A especialista dá dicas sobre o que pode ser feito caso haja prejuízo para o consumidor. "Já é pacificado nos tribunais que a negativação indevida do consumidor gera dano moral in repsa. Isso significa que, com essa simples inscrição, já se presume que o consumidor tenha suportado situação vexatória e/ou danosa. Dessa forma, o consumidor pode requerer que seja ressarcido pelos danos morais ou materiais que tenha sofrido devido à inscrição indevida.
*Estagiária sob a supervisão de Adson Boaventura
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