Violência

"Tiraram meu bebê de mim", lamenta mãe de ciclista atropelado na Estrutural

Hilda Maria, mãe do ciclista Joelson — atropelado e assassinado por um criminoso em fuga — relata a dor da família. A vítima faria 39 anos na próxima sexta-feira (11/2). Uma das irmãs dele, Mônica Fernandes lembra dos planos interrompidos

Renata Nagashima
Arthur de Souza
postado em 05/02/2022 06:00
 (crédito:  Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
(crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

"Ele me chamava de 'minha velhinha guerreira', só que, agora, eu não sou mais guerreira". É assim que Hilda Maria Santos, 58 anos, mãe do vigilante Joelson Fernandes, 38, descreve o que está sentindo após a morte brutal do filho. Ele pedalava no acostamento da Via Estrutural, quando foi atropelado por um criminoso que estava em fuga da polícia, na quinta-feira (3/2). Com o impacto, o ciclista foi arremessado a cerca de quatro metros de distância.

Joelson era atleta de alta performance e treinava na pista, como fazia todos os dias. Emocionada e bastante abalada com a morte do filho, dona Hilda conta que ele era um ciclista de primeira linha. "Ele andava de bicicleta há 10 anos e gostava muito de competir. O negócio dele era treinar e treinar, para ganhar as competições", destaca. Ela lembra que não importava a posição que Joelson terminava, a felicidade era sempre a mesma. "Podia ser primeiro, segundo ou terceiro lugar, ele ficava contente da vida quando chegava com o troféu."

"Meu filho era muito alegre, muito brincalhão, era um crianção", destaca a mãe. "Ele me ajudava sempre. Eu tenho problemas de saúde e, quando precisava fazer exames, ele me levava. Me ajudava a comprar meu medicamento, em tudo. Às vezes, ele me falava: 'Oh, velhinha! Não se aperte não! Dinheiro pouco nós temos muito!' e ficava fazendo graça", emociona-se dona Hilda, entre lágrimas.

Joelson completaria 39 anos em 11 de fevereiro. "Uma pessoa ruim entrou no caminho do meu filho e atrapalhou o aniversário dele", lamenta Hilda. Ela ressalta o desejo de que a justiça seja feita. "A gente não sabe explicar, é um sentimento de abandono à população. O bandido que está preso na cadeia acaba sendo solto pelas autoridades e, aí, comete mais desastres no mundo. Se não tivessem soltado esse bandido, ele não teria matado meu filho. Tiraram meu bebê de mim", protesta.

Ao Correio, a irmã de Joelson, Mônica Fernandes, 37, conta que ficou sabendo do acidente por meio de outras pessoas. "Eles viram no jornal e ligaram para a gente", disse, bastante abalada. Ela frisa que o irmão era muito apegado à família. "Era um amor de pessoa, um menino excelente. Era trabalhador e cheio de planos e projetos", enumera Mônica. Joelson trabalhava como vigilante e tinha aberto um negócio de revisão de bicicletas, há menos de uma semana.

Joel, a mãe e as três irmãs vieram para o Distrito Federal em 1994, em busca de uma vida melhor. "Ele sempre trabalhou e ajudou em casa. Era um ótimo menino", garante Mônica. O pai do ciclista, debilitado, não processou a morte do filho. "Minha mãe está destruída. O pai não tem muita noção das coisas", explica Mônica.

Mônica Fernandes revela que a mãe está "destruída", mas que o pai não entende a situação
Mônica Fernandes revela que a mãe está "destruída", mas que o pai não entende a situação (foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

Batalhador

Em um de seus últimos posts nas redes sociais, em 23 de janeiro, Joelson contou um pouco sobre sua vida. De acordo com a postagem, ainda na Bahia, ele começou a trabalhar muito cedo, como engraxate pelas ruas de Jacobina. "As dificuldades, que não foram poucas, levaram para longe de mim o sonho de criança, que era ter uma bicicleta. Aprendi a andar já na minha pré-adolescência. Minha primeira bike não era minha, só que a sensação era de ser o dono", diz o texto. Quando trabalhava em uma vidraçaria, aos 16 anos, ele comprou a primeira bicicleta.

O corpo de Joelson Fernandes está no Instituto Médico Legal (IML) e, de acordo com os familiares da vítima, será liberado neste sábado (5/2) pela manhã. A intenção é enterrar o ciclista no Cemitério de Taguatinga.

Leis severas

Coordenadora de Comunicação da Organização Não-Governamental (ONG) Rodas da Paz, Ana Júlia Pinheiro lamenta a morte violenta do ciclista Joelson. "Se os assassinatos cometidos no trânsito fossem equiparados aos que acontecem com armas de fogo e facas, as pessoas pensariam, pelo menos, duas vezes enquanto dirigem", afirma. "O que falta é uma lei de trânsito severa. Enquanto este tipo de crime for visto como uma bobagem, os atropelamentos fatais vão continuar acontecendo no DF", defende Ana Júlia.

Em nota, a Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) informou que casos de acompanhamento policial resultando em acidentes, com ou sem vítima, são raros e, por isso, a corporação não tem o recorte específico da estatística. Sobre o procedimento utilizado pela PMDF para não deixar o suspeito escapar em fuga no trânsito e, ao mesmo tempo, preservar vidas inocentes, o texto ressalta que a informação não é divulgada por questões estratégicas e de segurança. No entanto, explica que "as ações policiais são pautadas sempre na busca pela preservação da integridade física e patrimonial de todos os envolvidos".

A delegada Jane Klebia, da 8ª Delegacia de Polícia, disse que o criminoso que atropelou e matou Joelson possui diversas passagens por roubo e homicídio e será indiciado por homicídio doloso. O homem estava no regime semiaberto.

Entenda

O homem acusado de atropelar e matar o ciclista é Genival Pereira da Silva, 47 anos, que cumpria pena em regime semiaberto no Centro de Progressão Penitenciária (CPP), no Setor de Indústria e Abastecimento (SIA). Segundo informações da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), ele recebeu R$ 500 para levar um carro roubado da Asa Sul para Ceilândia. Enquanto fazia o percurso, Genival percebeu que estava sendo perseguido e perdeu o controle do veículo, atropelando Joelson e batendo em outro carro, ferindo um casal que, de acordo com a delegada da 8ª DP, foram encaminhadas ao Hospital de Base. Eles receberam alta e estão em casa, se recuperando.

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