A aventura da testagem - parte 1

Se é que aventura seria o termo apropriado. Fazer o teste de covid na rede pública de saúde do Distrito Federal está mais para uma grande batalha de resistência. Horas esperando em pé, em uma fila, debaixo de sol, com vários possíveis infectados ao redor. Você sai mais doente do local do que quando chegou.

Por horas esperei a bendita testagem, ou como disse uma piauense gaiata companheira de fila: "esperando o chá de revelação da covid". Ela proporcionou alguns momentos de diversão em meio aquele caos e provação intermináveis. Com o calor e o sol quase que provocando alucinação em mentes febris, seja pela covid ou pela influenza, ela mantinha "otimismo" e bom humor. "Um solzão desses... Podia tá todo mundo na piscina, fazendo um churrasco e bebendo uma cerveja. Mas não. 'Tamo' aqui tomando o chá de revelação", reclamava, ao mesmo tempo rindo do absurdo que era tudo aquilo.

Cheguei na UBS 6, em Taguatinga, às 7h28. Perto das 8h, começaram a entregar senhas. Na quarta-feira, um dia antes, estive por lá na hora do almoço e fiquei sabendo que distribuíam apenas 50 fichas por turno (manhã e tarde). Como não consegui uma, pensei: "amanhã eu madrugo, chego na hora que abrirem a UBS e serei o primeiro da fila". Mais uma "adsagem", como eu chamo meus erros e ingenuidades.

Sim, fui o primeiro da fila, mas do turno da tarde, mesmo chegando antes das 7h30. Distribuíram as cinquenta fichas da manhã, e eu era o 51°. Um funcionário da unidade saúde deu esperanças e falou que, possivelmente, atenderiam algumas pessoas sem ficha ainda pela manhã. Além de mim, havia outras sete pessoas na "xepa da testagem", número que só foi crescendo nas primeiras horas do dia.

O tempo passava e a fila não andava. Quem estava com a ficha, podia sair e voltar depois, independentemente de fila. Já os da xepa ficavam lá, esperançosos e atentos ao primeiro sinal de alguém tentar furar a fila, mesmo que isso significasse apenas uma pessoa perdida pedindo informação.

Após duas horas em pé, finalmente consegui chegar até as primeiras cadeiras e sentar. Antes, fui fazendo colegas momentâneos de fila e ouvindo histórias alheias. Fulana que pegou covid depois de abraçar uma amiga, Sicrano que almoçou com um colega da firma que estava com covid e que não tinha avisado antes a ninguém. Mariazinha que encontrou Creidinha, que tava grávida do terceiro filho...

Quando chamaram o número 47, por volta das 10h30, rolou aquela esperança na zona da xepa. Em teoria, eles atenderiam até 12h. Logo, a turma que ficasse para a tarde poderia ser antecipada; ao menos os primeiros não teriam de esperar os médicos voltarem do almoço, às 14h.

Um rapaz que acompanhava a esposa e o bebê também tinha um ar debochado, assim como a piauiense. Ficava puxando papo com a fila e soltando frases do tipo "êhh, vai demorar, heim?", "Essa fila parece que não anda, né?", e falava sempre dando risada, com uma voz meia bobona. Grande figura.

A situação da esposa, com o bebê no colo, comovia alguns da fila, menos o médico, que após atender o paciente 50 decidiu por encerrar as atividades do turno. O rapaz foi até ao médico explicar que havia chegado cedo e que estava com uma criança, na esperança de ser atendido ainda pela manhã, mas ouviu do jovem doutor que "se fosse abrir uma exceção para eles, teria de abrir para todo mundo".