O artesanato é uma forma de expressão e um talento natural. Para muitos moradores de Brasília, esse é o ganha-pão necessário à sobrevivência, que abrange um rico leque de produtos elaborados manualmente por eles. Da cerâmica ao macramê, da Feira da Torre aos eventos dedicados a esses trabalhos em diferentes partes do Distrito Federal, o delicado ofício artístico encanta a todos. E, por trás dele, as histórias de quem elabora os artigos guarda o mesmo potencial.
Vindos da Venezuela, o casal José Miguel Veliz, 36 anos, e Rosa Henriquez, 35, vende itens de macramê na Feira da Torre há cerca de dois anos. O trabalho com artesanato entrou na vida deles há mais de 15 anos, no país vizinho, e se tornou não apenas paixão, virou forma de ganhar a vida. "Tomamos gosto pelo artesanato mesmo, não só pelo macramê. Trabalhamos com várias técnicas. Meu marido faz molduras com metais e couro, tudo à mão. Eu faço crochês. Além disso, trabalhamos com cerâmica, que é nossa área mais forte", conta Rosa.
Ela e José Miguel aprenderam a atividade em viagens e com colegas artesãos de rua. Os dois batizaram o empreendimento no Plano Piloto de Ma-Janoco, nome de origem indígena com fortes ligação com o lar.
"Acreditamos que nossa arte é nossa casa, porque vamos para todos os lugares, e ela nos dá o sustento", define o venezuelano. Companheiro de Rosa há, aproximadamente, cinco anos, ele e a mulher vieram para o Brasil um ano depois de se unirem, movidos pela vontade de conhecer o mundo, assim como para escapar dos problemas que assolavam a Venezuela à época. "Ela tinha essa vontade também e, quando chegou a crise, aproveitamos para fazer um mochilão por aí", completa José Miguel.
O casal chegou à capital federal pouco antes do início da pandemia e enfrentou dificuldades para sobreviver. "Foi horrível, muito difícil. Chegamos só com nossa mochila de roupas e artesanatos, alugamos um local, mas, com os fechamentos, nossas reservas começaram a acabar, e ficamos desesperados", relata Rosa.
"Depois das reaberturas, conseguimos voltar a vender, mas ainda não está fácil", acrescenta José. Além do DF, os dois viveram em diversas partes do país, como Amazonas, Bahia, Pará, Piauí e Roraima. "Em cada cidade na qual estávamos, conseguíamos materiais e aprendíamos algo", destaca a venezuelana.
Orgulhosos, José Miguel e Rosa exibiram à equipe de reportagem o Prêmio Brasília de Artesanato, que ganharam no ano passado. "Participamos e nos classificamos. Era um júri às cegas, e nós vencemos. Foi uma surpresa muito legal. No fim, quem ganhou foi a peça, o nosso trabalho", comemora o artesão. "O fato de sermos estrangeiros tem dificultado nossa participação em alguns eventos, o que atrapalha para mostrarmos que temos experiência. Isso conta muito na hora de acessar algum benefício ou espaço", completa.
Mesmo assim, os dois pretendem adotar Brasília como lar daqui em diante. "Felizmente, conseguimos arrumar todos os materiais e equipamentos para instalação do nosso ateliê de cerâmica. Agora, estamos à procura de um espaço para começar os trabalhos, inclusive de macramê", conta Rosa.
Saiba Mais
Transformação
Desde 1984, Maria das Graças Ribeiro, 69, dedica-se ao trabalho manual com cerâmica. Em junho, ela completará 38 anos na atividade. "Aprendi sozinha, sem curso nem nada. É minha profissão. Minha vida é o artesanato. Não marco o tempo, só vou produzindo. Mas há umas peças mais trabalhosas", diz.
Na pandemia, a artesã teve de fechar a banca na qual vendia os produtos, mas conta que não perdeu tempo. "Fiquei trabalhando e produzindo em casa. Fiz um estoque de peças. Não consigo ficar parada. Tem dias que não vendo nada, mas adianto a produção de um monte de itens", ressalta a artesã.
Nascida no interior de Minas Gerais, Maria cresceu em Itapuranga (GO) e, depois, veio para Brasília. Por meio do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), ela expôs o trabalho em diversos estados e, também, envia peças para cidades do Ceará e de Pernambuco. E, mesmo após tantos anos, o gosto pela arte ganha força com o tempo. "Até hoje, no dia da queima da cerâmica, fico emocionada ao ver a peça se transformando", relata Maria das Graças.
Benedito Paula, 62, também atua na Feira da Torre. Natural de Cristalina (GO), ele trabalha há 35 anos com pedras e capim-dourado. "Comecei no artesanato ainda em Goiás. A cultura lá era de extração de cristais, e passamos a vender (os itens produzidos) pela região. Em 1981, vim para Brasília. O artesanato representa tudo na minha vida. Eu vivo disso", comenta.
Alguns anos de trabalho no Pará permitiram ao artesão aprender novas técnicas e outras artes. "Descobri como trabalhar com sementes para fazer arte. Voltei para Brasília em 1997 e fui aperfeiçoando as habilidades com capim-dourado, pedras e sementes", detalha Benedito, que faz tudo sozinho. "Eu me virei na pandemia vendendo pelo Instagram. E tenho uma clientela boa, que sempre me apoiou e me ajudou muito nesse período", recorda-se Benedito, sobre os períodos difíceis, mas ainda com esperanças de tempos melhores.
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.